"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 14 de maio de 2014

BRASIL TEM OBRIGAÇÃO DE PASSAR AOS EUA INFORMAÇÕES SOBRE O CARTEL DO METRÔ DE SÃO PAULO


 

 
Antes de tudo, cumpre informar que cópia deste artigo será formalmente encaminhada ao Procurador Geral da República Rodrigo Janot e ao presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Marcus Vinicius Coelho. Tal encaminhamento se faz necessário em decorrência do fato de o artigo conter graves críticas ao desempenho de determinados integrantes das entidades comandadas por citadas autoridades.
 
O desempenho criticado aconteceu pela atuação de tais integrantes na apuração da denúncia segundo a qual o Brasil estava, deliberadamente, descumprindo o chamado Acordo Brasil-EUA para combater cartéis. Conforme a denúncia, o Brasil estava descumprindo o compromisso de notificar os Estados Unidos da América sobre investigações aqui realizadas contra o Cartel do Oxigênio.
 
O mesmo assunto, “compromisso de notificar”, volta à berlinda agora, ao se discutir a necessidade de o Brasil notificar os EUA sobre as investigações que estão sendo realizadas contra o Cartel do Metrô de São Paulo.
 
O fato é que o Acordo é categórico: uma parte se obriga a notificar a outra sobre investigações que estiver realizando contra cartéis cujos integrantes atuem nos dois países, como é o caso dos integrantes do Cartel do Metrô de São Paulo.
Em seu Artigo II, o Acordo estipula que as atividades a serem notificadas “são aquelas que: (a) forem relevantes para as atividades da outra Parte na aplicação de suas leis”. No mesmo Artigo, encontram-se elencadas diversas outras hipóteses de notificação, mesmo que os fatos investigados não sejam considerados “relevantes”.
 
Diante de tais termos, depreende-se que, de um modo geral, qualquer investigação de fatos que “forem relevantes” para a outra Parte deve ser notificada.
 
Assim sendo, pela incontestável relevância das investigações relativas ao Cartel do Metrô de São Paulo, é absolutamente inadmissível que nossas autoridades se omitam diante da seguinte pergunta: estará, o Brasil, descumprindo deliberadamente o Acordo, caso não notifique os EUA sobre as investigações aqui realizadas?
Para subsidiar as discussões, será apresentado a seguir um breve histórico do acontecido no caso do Cartel do Oxigênio, que, assim como o Cartel do Metrô, é integrado por diversas transnacionais que atuam tanto no Brasil como nos Estados Unidos.
O caso do “Cartel do Oxigênio”
 
A farta documentação coletada – um autêntico Estatuto do Cartel – em uma operação de busca e apreensão realizada em fevereiro de 2004 nas dependências das quatro transnacionais acusadas de integrarem o Cartel do Oxigênio originou um processo na Secretaria de Direito Econômico (SDE).
 
Apesar da exitosa operação de busca e apreensão nas dependências das quatro empresas que dominam o mercado brasileiro de gases medicinais e industriais ter possibilitado conhecer detalhadamente as entranhas do cartel, como era de se esperar, não foram coletados indícios da atuação cartelizada dessas empresas em nenhum outro país do mundo, apesar de as integrantes do Cartel do Oxigênio já terem sido condenadas em diversos países.
 
Devido ao fato de tais transnacionais atuarem, também, no mercado norte-americano, a Procuradoria Geral da República recebeu denúncia de que o Brasil estava descumprindo o Acordo por não notificar os EUA sobre as investigações aqui realizadas.
 
A interpretação da PGR
No final de 2004, a PGR instaurou o Processo n° 1.16.000.002028/2004-06 para apurar denúncia segundo a qual – por não notificar as autoridades norte-americanas a respeito das investigações aqui realizadas sobre o “Cartel do Oxigênio” – o Brasil estava descumprindo o Acordo, que havia sido promulgado pelo Decreto nº 4702, de 21 de maio de 2003.
Passados quatro anos, em 8 de setembro de 2008, o Relator de citado processo, Procurador Pedro Nicolau Moura Sacco, decidiu arquivá-lo, afirmando que, segundo o Acordo, a notificação era incabível.
 
O Procurador Pedro Nicolau decidiu pela não notificação aos Estados Unidos, interpretando da seguinte maneira os termos do Acordo: “O tratado apenas obriga as partes soberanas a notificarem uma à outra a respeito de investigações que coletem indícios de que os cartéis apurados também atuam no território da contraparte”.
 
Diante de referida decisão, em outubro de 2008, foi interposto Recurso à PGR. Tal Recurso foi indeferido em abril de 2010, homologando-se o arquivamento, conforme proposto no Voto do Subprocurador-Geral da República Paulo de Tarso Braz Lucas, que entendeu que “não merece reparo o despacho de arquivamento”. Acompanhando o voto do relator, a Câmara de Revisão da PGR referendou o entendimento do Procurador Pedro Nicolau.
Assim, conforme a interpretação do Acordo feita pela PGR, as investigações realizadas no Brasil sobre um determinado cartel só têm que ser notificadas às autoridades norte-americanas se – dentro da própria investigação do cartel – forem coletados indícios que seus integrantes também praticam o mesmo crime nos Estados Unidos.
 
Referida interpretação nos remete à seguinte hipotética situação: caso, nos dias atuais, as autoridades norte-americanas estejam investigando a empresa Alstom por formação de cartel em seu território, e descubram a maneira como ela distribui propina a seus contratantes, ainda assim, nosso parceiro no Acordo não passará a informação ao Brasil – se nas investigações que lá estejam sendo realizadas, não forem coletados indícios que a Alstom pratica o mesmo crime aqui.
Ninguém há de negar que, das duas uma: ou a interpretação da PGR é absolutamente errada, ou o Acordo em questão é um autêntico “Acordo de Patetas”.
 
A atuação da OAB
 
Em abril de 2011, o entendimento da PGR foi submetido à apreciação da OAB, dando origem aoprocesso OAB 2011.18.03263-01.
O Relator do processo Welber Oliveira Barral, em seu voto, partiu de uma falsa premissa: considerou que a denúncia havia sido baseada em um caso ocorrido em “licitações realizadas por dois hospitais localizados em Brasília” – caso, incontestavelmente, irrelevante. E tal falsa premissa levou à falsa conclusão segundo a qual as investigações não eram relevantes para as autoridades norte-americanas.
Em seu Voto – depois de afirmar corretamente que a denúncia só seria enquadrável nas hipóteses (a) ou (b) das diversas hipóteses previstas no Acordo para a notificação – o Relator Welber Oliveira Barral, afirmou:“caberia às autoridades brasileiras averiguarem se as hipóteses (a) e (b) tampouco restariam preenchidas. Após determinarem que as aplicações acima mencionadas não eram relevantes para as atividades da outra Parte na aplicação de suas leis (hipótese (a)), as autoridades brasileiras se voltaram à verificação da hipótese (b).”
 
É de se destacar que, para justificar a não notificação aos EUA, teve que aparecer uma falsa história de “licitações realizadas por dois hospitais localizados em Brasília”.
 
Porém, para efeito do objetivo do presente artigo – que é a notificação aos EUA das investigações relativas ao Cartel do Metrô de São Paulo – basta o seguinte reconhecimento, que foi feito pela OAB: se as investigações aqui realizadas forem relevantes, o Brasil tem a obrigação moral de notificar seu parceiro no Acordo.
 
Para uso da OAB, cabe, ainda, informar: O Voto do Relator Welber Oliveira Barral, bem como o Voto do Relator do recurso correspondente, Cezar Britto, foram categoricamente criticados em dezembro de 2013 por meio do vídeo intitulado “O cartel do metrô de São Paulo e o Acordo Brasil-EUA para combater cartéis”. Tal vídeo foi dividido em duas partes, e tem seus links apresentados ao final.
 
Conclusão
 
Todos concordam que um país que não zela pelo fiel cumprimento daquilo que se comprometeu a fazer fica com sua credibilidade moral arrasada.
 
No caso em questão, o descumprimento do Acordo Brasil-EUA para combater cartéis, além de ter o potencial de provocar marcas indeléveis na reputação de nosso país no cenário internacional, faz com que seja perdida a melhor oportunidade de se aplicar um duro golpe nos cartéis formados por transnacionais que exploram o consumidor brasileiro.
 
Finalizando seguem os links do vídeo “O cartel do metrô de São Paulo e o Acordo Brasil-EUA para combater cartéis”
 
 
 
14 de maio de 2014
João Vinhosa é Engenheiro

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