"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 22 de março de 2014

NOVO MINISTRO DAS CIDADES ESTÁ ENVOLVIDO EM CASO DE CONDENAÇÃO DA CAIXA

Banco foi condenado por tentar empurrar "venda casada" a cliente; processo cita agressão verbal de Gilberto Occhi, que foi até o local de trabalho de correntista para constrangê-la a aceitar pacote

 Novo ministro das Cidades está envolvido em caso de condenação da Caixa
 
Reportagem da revista Época:
Na noite de segunda-feira da semana passada, a maquiadora Sheila Góis, moradora de Aracaju, em Sergipe, repetia maquinalmente, como tantos brasileiros, seu ritual diário de lavar a louça após o jantar. O hábito envolve deixar a TV ligada no Jornal Nacional, de modo a se distrair com as notícias do dia.  
Quando Sheila ainda acabava de retirar a louça da sala, ouviu, a caminho da cozinha, que a presidente Dilma Rousseff dera posse a seis ministros naquele dia, em mais uma daquelas tediosas cerimônias no Palácio do Planalto.  
Escutou que um deles, Gilberto Occhi, assumiria o Ministério das Cidades. Sheila estacou, perplexa. Largou o prato que segurava e correu para a frente da televisão.  
“Não é possível que esse homem tenha virado ministro. Estou decepcionada com a presidente e com nojo da política”, disse ao marido. A 280 quilômetros dali, em Maceió, Alagoas, o empresário Márcio Coelho também assistia ao Jornal Nacional. Ao saber da mesma notícia, tomou um susto. E se revoltou. “Entregaram o ouro para os bandidos”, pensou, segundo disse a ÉPOCA. 
Tanto Sheila quanto Márcio conheceram Occhi quando ele era apenas um burocrata da Caixa Econômica Federal no Nordeste. Ambos acusam Occhi – que ingressou na Caixa no início dos anos 1980 – de obrigá-los a contratar serviços bancários para que pudessem conseguir um financiamento.  
O nome dessa prática condenável é “venda casada”. Até dois anos atrás, ela era crime. Na semana passada, ÉPOCA conversou com os dois e teve acesso a documentos do Ministério Público, da Justiça Federal e de uma representação feita na Polícia Federal em Alagoas em junho de 2010. Eles apontam irregularidades cometidas por Occhi em sua passagem nos cargos de superintendente da Caixa em Sergipe e Alagoas. 
Apesar de ser documentos públicos, os órgãos de inteligência do governo federal, como a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), não puseram freio à indicação de Occhi para comandar um ministério com orçamento anual de R$ 15 bilhões.  
Occhi faz parte de uma leva de ministros desconhecidos, nomeados por Dilma para desarticular o Blocão, a aliança formada por congressistas rebelados contra o governo.  
Na terça-feira passada, durante a solenidade de transmissão do cargo, Occhi resolveu elogiar o presidente do PP, padrinho de sua ascensão ao ministério, o senador Ciro Nogueira (PI). “Acredito na seriedade com que ele conduz a presidência do PP e vejo seu espírito de liderança”, disse. “Nosso objetivo é nobre: é fazer com que as políticas cheguem àquelas pessoas que mais precisam.” 
Não foi o que aconteceu com a maquiadora Sheila. Segundo ela, na tarde do dia 28 de dezembro de 2005, Occhi, então superintendente da Caixa Econômica Federal em Sergipe, e sua mulher, Cristina Piedade, então gerente de uma agência da Caixa em Aracaju, foram ao local de trabalho de Sheila, uma loja num shopping. Lá chegando, se apresentaram e disseram a ela, em tom ríspido, na frente de outros empregados e clientes, que o financiamento imobiliário que Sheila contraíra menos de dois meses antes seria cancelado e ela perderia seu apartamento se suspendesse o cheque especial, o cartão de crédito e um seguro.  
A visita inesperada aconteceu após Sheila ter feito uma queixa à ouvidoria do banco de que um gerente a obrigara a contratar outros serviços quando, na verdade, ela queria apenas o financiamento de R$ 20.317,70, no prazo de 15 anos.  
“Fiquei espantada com a presença do sujeito mais importante da Caixa em Sergipe bem ali no meu trabalho. Achei que tinha ido lá resolver meu problema. Nada disso. Ele e a mulher foram me insultar e ameaçar”, disse a ÉPOCA. Sheila afirma ter sido despejada do apartamento em 2009. No momento do despejo, carregava, no colo, Levi, seu único filho. “Occhi disse que eu perderia o apartamento, e perdi mesmo”, afirma. 
Inconformada com o tratamento que recebera de Occhi e Cristina, Sheila processou a Caixa em 2007 por danos e por ter sido vítima da venda casada. Em 2011, o Tribunal Regional Federal da 5ª região lhe deu razão.  
O desembargador Francisco Dias condenou a Caixa a pagar uma indenização de R$ 10 mil a ela. A Caixa acatou a decisão da Justiça e depositou a quantia na conta de Sheila. Dois meses depois, um procurador da República em Sergipe, Ruy Mello, denunciou criminalmente Occhi e Cristina. A Justiça Federal transformou-os em réus.  
Por uma daquelas situações que ocorrem aos montes no Brasil, o processo foi arquivado em abril do ano passado. É que uma lei de 2012 deixou de tratar a venda casada como crime. “Quando fiz a denúncia, a venda casada era crime. Depois deixou de ser”, afirmou Mello a ÉPOCA. Pela legislação antiga, se Occhi tivesse sido condenado, poderia ter recebido pena de até cinco anos de prisão ou pagamento de multa. 
Ao ver as cenas da posse de Occhi, o empresário Márcio, do ramo de hotelaria, lembrou-se de uma tarde do começo de 2010, quando Occhi, então superintendente da Caixa em Alagoas, e Cristina Piedade, então gerente de uma agência bancária em Maceió, foram a seu hotel.  
De acordo com Márcio, o casal esteve lá para condicionar a aprovação de um financiamento imobiliário à contratação de um plano de previdência privada de R$ 100 mil.  
Na ocasião, Márcio concedeu uma entrevista ao jornal Gazeta de Alagoas, em que afirmou: “Sinto-me extorquido, estou muito chateado e resolvi tirar da Caixa as minhas contas e dos meus funcionários”.  
Em junho de 2010, Márcio entrou com uma representação criminal contra Occhi na Polícia Federal. Seus advogados não sabem se a PF abriu uma investigação após a denúncia. Márcio disse ter sofrido represálias depois do processo, mas não as especificou.
Por meio da assessoria de imprensa, a Caixa disse que não recorreu da decisão do TRF por uma impossibilidade legal e porque houve uma redução “substancial” no valor da indenização. Informou também que Cristina, mulher de Occhi, não está mais no banco – ela se aposentou em abril de 2010.  
Por meio de sua assessoria de imprensa, o ministro Occhi negou ter ido ao local de trabalho de Sheila Góis. Disse que ele e sua mulher foram abordados por Sheila quando estavam no shopping. Afirmou que a Justiça arquivou a ação do Ministério Público por considerá-la “atípica”.  
Disse que a retomada do imóvel de qualquer cliente da Caixa decorre exclusivamente por inadimplência ou descumprimento formal. Quanto à acusação de Márcio, Occhi disse que não é verdadeira, tanto que o MPF concluiu não haver provas para sustentar a denúncia. Afirmou, ainda, ser da rotina bancária do superintendente visitar clientes.
22 de março de 2014
in implicante 

Nenhum comentário:

Postar um comentário