"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

"PRESO (IN) COMUM"

O ideal seria que José Dirceu não tivesse cortado relações com a lei e por isso sido condenado e preso. Mas, já que escolheu esse caminho e o Supremo Tribunal Federal decidiu lhe dar pena de prisão, desde o último dia 15 ele está sob a tutela do sistema prisional onde regra é regra.
 
Dirceu, contudo, teima em negar essa realidade. A ficha, como se diz, ainda não caiu. São várias as evidências. A última, o pedido feito à Justiça para que possa continuar atualizando seu blog mesmo na penitenciária.
 
Note-se: a solicitação não se relaciona com a ainda aguardada autorização do juiz da Vara de Execuções Penais do Distrito Federal para Dirceu trabalhar fora durante o dia, como lhe assegura o regime semiaberto até que seja julgado o embargo infringente pelo crime de formação de quadrilha.
 
O advogado dele pede, com base na lei que confere ao preso direito de comunicação com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, que Dirceu faça o blog e dê entrevistas de dentro do presídio da Papuda.
 
Essa lei (7.210) diz que o detento pode exercer suas atividades anteriores "desde que" sejam compatíveis com a execução da pena. Aqui parece que se resolve a questão e se evidencia o despropósito da regalia pretendida.
 
A menos que o faça por meio de cartas, para DE Dabastecer o blog Dirceu precisa de um computador. A lei não fala nessa hipótese, até porque data de 1984, pré-internet. Mas não fala também sobre o uso de telefones celulares e eles são proibidos nas penitenciárias por obviamente incompatíveis com a execução da pena.
 
Os celulares, sabemos, entram clandestinamente, mas não é isso que Dirceu pretende, claro. Concedido seu pedido, estaria criado o precedente para que os demais presos reivindicassem o mesmo ou pior. Ninguém imagina que aceitariam passivamente o privilégio.
 
Por muito menos, houve revolta das famílias dos presos na Papuda com a romaria de visitas que entravam e saíam quando bem entendiam até o Ministério Público pedir isonomia de tratamento a fim de não criar instabilidade no ambiente já instável e deteriorado de uma cadeia.
 
Dirceu deseja também dar entrevistas como sempre fez, inclusive durante o julgamento como alega seu advogado para embasar o pedido, propositadamente ignorando um detalhe: lá não estava condenado, era presumidamente inocente. Deixou de sê-lo quando o STF provou o contrário.
 
Por muito menos, uma só entrevista à revista IstoÉ, José Genoino foi proibido de falar à imprensa pelo juiz da execução. E isso porque estava fora da prisão, no hospital. Continua proibido mesmo tendo recebido o benefício da prisão domiciliar temporária. Se Genoino não pode dar entrevistas por que Dirceu poderia?
 
Os pedidos são tão audaciosos que chegam a levantar a suspeita de que só os faça para se manter em destaque no noticiário.
 
José Dirceu exigiu ser tratado como preso político; quis ganhar R$ 20 mil passando o dia num hotel exercendo profissão que não se enquadrava no quesito "atividades anteriores"; pretendeu receber visitas ao arrepio das normas impostas aos demais; tentou furar a fila dos colegas com mais de 60 anos de idade que aguardam o exame de suas propostas de emprego para usufruírem o direito dado pelo regime semiaberto.
 
Agora quer se comunicar online com o chamado mundo exterior. Ou seja, quer vida normal. Por mais duro que pareça, isso não é possível. Houve um processo, um julgamento, uma condenação e há pena a ser cumprida (por corrupção ativa, em caráter definitivo). Embora se ache uma pessoa incomum, José Dirceu é, desde o dia 15 de novembro, um preso comum.
 
Tanto quanto seus ex-colegas de Parlamento cujos mandados de prisão foram expedidos ontem.

06 de dezembro de 2013
Dora Kramer, O Estado de São Paulo

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