"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 29 de setembro de 2020

DÍVIDA PÚBLICA SOB PRESSÃO

 A crise sanitária e econômica gerada com a pandemia do coronavírus vem afugentando ainda mais a presença dos investidores estrangeiros no financiamento da dívida pública brasileira. 

Antes de tudo, é bom lembrar que em 2015 perdemos o prestigiado “selo de bom pagador”, conferido pelas maiores agências internacionais de classificação de risco. Sua participação com relação ao nosso estoque chegou a representar em torno de 21% e acabou despencando para 9% no mês passado o que, de alguma forma, vem impedindo o Tesouro Nacional de voltar a dilatar seus prazos de vencimento.

Atualmente, o investidor externo ocupa a quarta posição entre os demais possuidores de títulos da nossa dívida, depois dos fundos de previdência, dos fundos de investimentos e das instituições financeiras. 
Normalmente, eles preferem os títulos de prazos mais longos, desde que o país comprove um equilíbrio macroeconômico consistente. 
Essa fuga se deve à visão atual que muitos estão tendo lá de fora de um Brasil envolto em um cenário de incertezas, ligado à piora do risco fiscal e ao crescimento de ruídos políticos.

O Tesouro, recentemente, realizou o maior leilão da sua história no que diz respeito à quantidade de títulos de curto prazo. 
Essa dívida contraída tem seu vencimento previsto para 12 meses e deve fechar esse ano no maior patamar do PIB (Produto Interno Bruto) desde 2005. De acordo com o relatório do Banco Central (BC) de janeiro a julho de 2020, as saídas de investidores internacionais de suas posições no País superaram US$ 30 bilhões. Um terço desse total, aproximadamente US$ 11 bilhões, foi em renda fixa, cuja emissão é chancelada pelo Tesouro Nacional. 

O restante do montante, basicamente, resulta da venda de ações realizadas através da B3 (Bolsa de Valores oficial do Brasil). Quando perdemos o “grau de investimento”, os títulos da dívida pública brasileira já não integravam boa parte da carteira de vários fundos internacionais, porém com as incertezas trazidas pela covid-19, acabamos perdendo outra parcela significativa dos não residentes. 

O mercado, em função dessa crise de âmbito global, passou a dar uma certa preferência à liquidez. No fundo, hoje, o investidor quer ter dinheiro na mão, desapegando-se um pouco dos ativos com prazos mais longos, ainda mais quando são do mercado internacional. 

Com a revoada de estrangeiros do mercado nacional, eles estão se aproveitando da situação e passando a pressionar a taxa junto ao Tesouro para esse tipo de aplicação que é importante para o País, pois se destina a financiar a nossa dívida e a cobrir o rombo fiscal. 
Sempre estão pleiteando um “algo mais” quanto à remuneração, geralmente exigindo acima do que o governo pode oferecer, sendo que os prazos desses títulos, no momento, estão bem menores. 

Hoje, entre 2,5 a 2,8 anos enquanto que, há um ano atrás, situavam-se em 4,06 anos. A estratégia adotada pelo Tesouro Nacional, aumentando as emissões de títulos prefixados com prazos de vencimentos menores na verdade tem fôlego curto e pode se converter em uma perigosa armadilha, caso o governo não consiga o equilíbrio em suas contas. 
O problema fiscal do País se materializa na inclinação da curva de juros de longo prazo e na volatilidade excessiva do real em relação a outras moedas de países emergentes. 
É obrigação do Tesouro tentar reduzir o custo da sua dívida e, por isso, existe a necessidade de se colocar somente papel de prazo curto, oferecendo ao investidor uma taxa de juros menos atrativa. Entretanto, se ele apenas vender esse tipo de papel, provavelmente, daqui a um ou dois anos, terá que fazer diariamente sua rolagem, como ocorreu no mercado financeiro nas décadas de 70/80. 
O colchão de liquidez que representa a reserva prudencial no balanço do Banco Central ainda está sendo suficiente, todavia desafios podem emergir no médiolongo prazo. 
Por enquanto, o que tem sustentado a demanda por títulos públicos, facilitando a gestão da dívida pública federal, é a inflação brasileira que ainda está muito baixa, com os analistas estimando-a em 2,10% para o final de 2020 e 3,00% no final do exercício de 2021. 

A grande questão é se a expectativa de inflação começar a subir rapidamente diante da perspectiva de uma bomba fiscal mais adiante, a remuneração (juros) terá que aumentar substancialmente. E, mesmo assim, a procura por títulos públicos poderá não estar garantida.

29 de setembro de 2020
Arthur Jorge Costa Pinto é Administrador, com MBA em Finanças pela UNIFACS (Universidade Salvador).

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