"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

QUEM TEM MEDO DA PAZ NO AFEGANISTÃO?


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Guerra no Afeganistão é uma da mais longas dos EUA
A conferência de seis países sobre o Afeganistão, em Moscou, reunindo Rússia, China, Índia, Irã, Afeganistão e Paquistão, já está, de fato, sob a mira dos EUA. Comentário da Voz da América mostrou isso, ao afirmar: “Rússia, sempre mais interessada em minar os EUA do que em resolver os problemas regionais.” O comentário lamentava que EUA e OTAN não tenham sido convidados à conferência em Moscou. Mas mesmo assim admite que analistas regionais “observam esse desenvolvimento com mais otimismo”.
Washington está terrivelmente preocupada com o “retorno” da Rússia ao Afeganistão. Os EUA temem que a Rússia venha a fazer outra “Síria” no Afeganistão, apressando o fim definitivo da guerra e arrasando todo o Estado Islâmico, expulsando-o para fora do Hindu Kush e da Ásia Central, o que, claro, arrasaria também a “raison d’etre” (razão de existir) da presença militar sem fim, que se vai eternizando, dos EUA no Afeganistão.
Essa questão está também conectada ao futuro do “Euro-Atlanticismo” e à importância da OTAN como organização de segurança. Evidentemente, guerras criam interesses empresariais, e a guerra afegã, em seus já quinze anos, a mais longa da história dos EUA, criou fluxo suculento que envolve dezenas de bilhões de dólares (grande parte dos quais absolutamente clandestinos).
À TRIPA FORRA – Os fornecedores de guerra norte-americanos e os políticos que trabalham para eles estão vivendo à forra. Agora transpira que o Pentágono tem consumido bilhões de dólares em salários para “soldados fantasmas” afegãos, que só existem no papel!
E há também a questão maior das relações EUA-Rússia. A inteligência dos EUA e o Pentágono não estão a favor da ideia do presidente Donald Trump, de melhorar as relações do país com a Rússia. Também rejeitam a noção de Trump, de que a OTAN seja “obsoleta”. A guerra afegã é a vitrine indispensável para mostrar a todos o quanto a OTAN continua(ria) indispensável.
O mais lógico será os EUA aceitarem a já antiga oferta que lhe fez a Rússia, para que os dois países cooperem para levar a guerra do Afeganistão a uma conclusão bem-sucedida. Mas os norte-americanos não querem saber de russos. Preferem continuar a combater uma guerra sem fim, seguindo o próprio doce balanço. Claro, a geopolítica tem muito a ver com isso, dada a localização estratégica do Afeganistão.
EM WASHINGTON – Enquanto isso, a guerra civil que ruge nas esquinas da Avenida Beltway em Washington, entre o governo Trump e os Guerreiros da Guerra Fria – da qual a saída do conselheiro de Segurança Nacional Michael Flynn é o episódio mais recente –, também é bastante necessária para inflar a imagem da Rússia como “inimiga”.
De olho em tudo isso, o senador John McCain realizou uma audiência na Comissão das Forças Armadas do Senado (presidida por ele) na quinta-feira passada, para discutir o “impasse” na guerra afegã. A agenda real foi, claramente, repetir que a Rússia está(ria) “legitimando” os Talibã e “minando” EUA e OTAN.
GRITARIA ENCOMENDADA – O principal comandante militar dos EUA no Afeganistão General John Nicholson fez o que foi mandado fazer, e produziu a gritaria encomendada. Nicholson só fez repetir que a presença militar dos EUA no Afeganistão é crucial para a defesa dos interesses da “segurança nacional dos EUA”, argumento que tem a ver com o que diz Trump.
McCain representa o Arizona, estado onde está instalada a indústria de armas dos EUA, e Nicholson é defensor da guerra afegã. Nasceram um para o outro. O tiroteio saído das duas horas de audiência especial da comissão do Senado foi do mesmo calibre do que levou Barack Obama a trair sua promessa de campanha eleitoral, em 2008, de que poria fim à guerra; em vez do fim, veio aquela catastrófica “avançada” no Afeganistão. Agora as coisas parecem repetir-se.
EUA X RÚSSIA – O Pentágono está genuinamente muito incomodado por a Rússia movimentar-se tão à vontade, sobre o tabuleiro de xadrez, sempre com a iniciativa. Uma ‘trilateral’ com China e Paquistão em dezembro em Moscou serviu de base para a criação do atual novo formato de seis países. E Moscou também trabalhou duro por trás das cortinas para trazer Cabul para a mesa de negociações. A visita que fez a Moscou o ministro das Relações Exteriores do Afeganistão, Salahuddin Rabbani, semana passada, ajudou os dois países a compreender melhor as intenções do outro lado e a harmonizar o modo de pensar (aqui e aqui).
Como se sabe como trabalha a diplomacia russa nesses tempos difíceis, o próximo movimento de Moscou será dar uma mão para promover relações mais cordiais entre Cabul e Islamabad. De fato, nessa empreitada altamente sensível, é muito útil o “degelo” nas relações russo-paquistanesas, e o projeto de gasoduto Norte-Sul ampliará a influência russa.
SINAIS DE ALARME – De fato, as conversas de Rabbani com o ministro de Relações Exteriores da Rússia Sergey Lavrov dispararam sinais de alarme no Pentágono. Menos de 48 horas depois de Rabbani conversar em Moscou com Lavrov, Trump telefonou ao presidente afegão Ashraf Ghani para enfatizar “a crescente importância da Parceria Estratégica EUA-Afeganistão” e o apoio dos EUA à liderança em Cabul.
PÔR FIM Á GUERRA – Há uma imperiosa necessidade, para a opinião pública regional, de pôr fim àquela guerra, que só faz produzir e espalhar mais e mais grupos terroristas como o Estado Islâmico. A posição da Índia na conferência de Moscou bate nessa corda certa. O porta-voz do Ministério de Assuntos Exteriores da Índia, disse que o governo indiano é o grande parceiro em desenvolvimento do Afeganistão e está ao lado dos afegãos na luta contra seus importantes desafios, principalmente contra o terrorismo.
“A Índia sempre acreditou em cooperação próxima e construtiva com vistas à paz, à estabilidade, à segurança e ao desenvolvimento no Afeganistão. Com esse objetivo participamos ativamente de várias consultas bilaterais e multilaterais. Nesse contexto, aceitamos com muito gosto o convite dos russos, para consultas”, acrescentou.
A conferência de Moscou tornou-se oportunidade excepcionalmente adequada e bem-vinda, para afirmar a opinião regional. McCain, Nicholson & Co. que migrem para o Iêmen ou para a Líbia, ou para onde bem entendam, e arrastem com eles o seu lucrativo envenenado trem da morte.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG 
– Mais um importante artigo do diplomata e cientista político MK Bhadrakumar, enviado pelo jornalista Sergio Caldieri. É preciso estar sempre de olho no que acontece no mundo. (C.N)

17 de fevereiro de 2017
MK Bhadrakumar,
Indian Punchline

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