CARTA QUE MICHEL TEMER ENVIOU A JANOT É UMA OBRA-PRIMA DE CINISMO POLÍTICO

Charge do Kacio (kacio.art.br)

O presidente Michel Temer, chegando aos 76 anos, é um homem conservador e antiquado. Em plena era do whatsapp e da comunicação instantânea, ele ainda se dá ao trabalho de escrever cartas. Em 7 de dezembro de 2015, quando começou a articular o rompimento do PMDB com o governo e o apoio ao impeachment, Temer comunicou essa mudança de rumos em correspondência pessoal enviada à então presidente DiIma Rousseff. E agora, exatamente um ano depois, também é através de carta que o atual locatário do Planalto pede ao procurador-geral Rodrigo Janot que imprima celeridade nas investigações, para que as delações premiadas sejam finalizadas o quanto antes, remetidas ao Juízo competente para eventual homologação e divulgação por completo.

Sob pretexto de exigir que a responsabilidade criminal dos investigados seja logo aferida, Temer assina a missiva junto com a advogada-geral da União, Grace Mendonça, sem que haja a menor explicação acerca dessa participação ostensiva da AGU, que foi altamente negativa para a Procuradoria-Geral da República, pois ficou evidente que o Ministério Público Federal está retardando as investigações e não cumpre à risca seu dever funcional.

ANULAR A DELAÇÃO – O mais incrível é que o verdadeiro objetivo do governo é questionar a legalidade das denúncias da Odebrecht. Alega-se que o vazamento das denúncias do ex-diretor Cláudio Melo Filho seria motivo de nulidade da delação premiada dos executivos da empreiteira, como já aconteceu com o ex-presidente da OAS, cujo depoimento vazou e a delação dele foi suspensa pelo ministro-relator Teori Zavascki.

O senador Romero Jucá (PMDB-RR) estava escalado para fazer o ataque ao vazamento, mas de repente o presidente Temer decidiu tomar a iniciativa e assinar a carta junto com Grace Mendonça, fazendo uma parceria que até prejudica a seriedade da iniciativa.

UM PRIMOR DE CINISMO – A carta a Janot é um primor de cinismo, pois não passa de uma peça de marketing político da pior qualidade. Temer diz que é necessário acelerar as investigações devido “a sérias crises econômica e política” que o país atravessa. “A condução dessas e de outras políticas públicas a cargo da União vem sofrendo interferência pela ilegítima divulgação de supostas colaborações premiadas e investigações criminais conduzidas pelo Ministério Público Federal, quando ainda não completado e homologado e homologado o procedimento de delação”, escreve a dupla Temer/Grace.

Temer diz ainda que o vazamento das delações gera um clima de “desconfiança, incerteza” obstruindo ações do governo. Destaca que o “fracionado” e lento desenrolar dos procedimentos pré-processuais envolvendo “múltiplos agentes políticos, funciona como elemento perturbador de uma série de áreas de interesse da União”. E por aí vai em frente.

“ESQUECIDINHO DO PLANALTO” – Como se vê, ao assinar a correspondência junto conhecida como a famosa “esquecidinha da AGU”, Temer demonstra estar se tornando o “esquecidinho do Planalto”. Reclama do vazamento, mas esquece que em 2015 sua carta a Dilma, enviada em “caráter pessoal”, teve vazamento imediato, promovido pelo assessor de Imprensa da Vice-Presidência, Márcio de Freitas Gomes, que hoje está promovido a secretário de Comunicação Social da Presidência.

Temer esquece também que na Era da Informática não há mais sigilo em nada, até os computadores do Pentágono já foram invadidos. Aliás, todos os sistemas do mundo já vazaram, conforme ficou demonstrado pelas revelações do Wikileaks.

FALTA DE CARÁTER – É ridículo pretender culpar a Lava Jato e seus vazamentos pelo fracasso das reformas grotescas que o governo apenas ensaia, ao mesmo tempo em que protege desavergonhadamente o sistema financeiro, sem jamais emitir uma só palavra acerca do maior problema do país, que é a dívida pública. Tudo isso demonstra uma impressionante falta de caráter.

A situação do país é tão sinistra que as pessoas de bem insistem em apoiar esse governo. Julgava-se que Temer pudesse se portar como Itamar Franco, um vice que realmente deu certo. Mas como apoiar um governo que tenta dividir o país entre civis e militares na Previdência Social? Como o presidente pode continuar dando força a um chefe da Casa Civil que mostra ser um político desonrado, grileiro de terras públicas, acusado não somente de devastar 1,3 mil hectares de uma importante reserva ecológica, mas também de manter trabalhadores em regime de semiescravidão, e tudo isso foi filmado, está nos autos, é público e notório?  Como comparar o atual presidente a Itamar Franco?

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PS – Em Brasília, a boataria é horrível. Diz-se que o governo Temer não se sustenta e já se especula sobre a eleição indireta a ser feita pelo Congresso no caso de vacância. É muito triste isso. Por que Temer não assume logo esse governo? Afinal, ele está pedindo para acelerarem as investigações e processos da Lava Jato etc. Por óbvio, isso é sinal de que Temer não estaria envolvido. Então, por que o presidente não se liberta e governa de verdade, para todos os brasileiros, sem dividir a nação entre civis e militares? (C.N.)

13 de dezembro de 2016

Carlos Newton