Governo não deve subestimar a gravidade da crise e faz bem ao não deixar para remeter a reforma da Previdência ao Congresso depois das eleições
É provável que o relaxamento das tensões com a aprovação do impeachment de Dilma Rousseff tenha feito o governo Temer perder em certa medida o sentido de urgência da crise econômica. Alguns poucos sinais positivos na economia — ilusórios, porque não se sustentam — podem ter ajudado este clima, agravado pela posição de alguns dos novos inquilinos do Planalto de que é preferível deixar passarem as eleições de outubro para enviar ao Congresso temas mais sensíveis, como a reforma da Previdência.
Erro crasso, causado pela falsa sensação de que se “bateu no fundo do poço”. Ora, a economia não se recuperará de forma sustentada por qualquer efeito mágico de uma lei da gravidade às avessas. Ainda bem que o presidente foi sensível aos alertas e determinou o envio da reforma independentemente do calendário eleitoral.
É certo que a emenda do teto para os gastos públicos já tramita na Câmara, mas, sem que se neutralizem causas da elevação autônoma dos gastos — a Previdência, uma das principais delas —, o teto será mais uma daquelas medidas que não pegam.
A sociedade brasileira deixou passar muito tempo para colocar a Previdência nos trilhos, com a fixação de idade mínima como requisito para a reivindicação do benefício. Há, ainda, um fator de propulsão dessa despesa, que tem sido a política de aumentos reais do salário mínimo, indexador desses gastos.
Dados esclarecedores de artigo do economista Raul Velloso, em “O Estado de S.Paulo”: de pouco antes de 1988, quando a Constituição foi promulgada — sob a ideia de o Estado resolver todos os problemas sociais —, até 2015, o peso dos benefícios previdenciários de um salário mínimo nos gastos federais passou de 3% para 25%. Por isso, se nada for feito não demorará muito para 100% das receitas da União serem usadas só para os gastos com o INSS. É certo que antes disso uma crise ainda mais grave eclodirá.
O tempo corre contra o Brasil. Quanto mais demorar o ajuste, pior. Estudo de Rubens Pena Cysne, professor da Escola Brasileira de Economia e Finanças da FGV-Rio, e de Carlos Thadeu de Freitas, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), estima este custo. Revelado pelo GLOBO, o trabalho considera que, se nada for feito ainda este ano, mas apenas a partir do primeiro trimestre de 2017, a conta do ajuste aumentará em R$ 21 bilhões, 0,35% do PIB. Será particularmente desastroso se o Planalto, devido a atrasos, for tentado a lançar mão de mais impostos. Com isso, retardará a retomada do crescimento. Aumentará custos das empresas, prejudicará o combate à inflação.
Também quanto mais rápido o ajuste começar, mais cedo o Banco Central poderá seguir um calendário para a redução dos juros, importante fator de desequilíbrio das próprias contas públicas.
O Copom não pode é se antecipar à ordem natural das coisas: baixar juros na “vontade política”, sem ajuste, porque será repetir o que fez a dupla Dilma/Alexandre Tombini, jogando a inflação para um patamar mais elevado, na fronteira do teto superior da meta (6,5%). O crescimento da crise fiscal fez o resto: derrubou o PIB e colocou a inflação nos dois dígitos.
12 de setembro de 2016
Editorial O Globo
É provável que o relaxamento das tensões com a aprovação do impeachment de Dilma Rousseff tenha feito o governo Temer perder em certa medida o sentido de urgência da crise econômica. Alguns poucos sinais positivos na economia — ilusórios, porque não se sustentam — podem ter ajudado este clima, agravado pela posição de alguns dos novos inquilinos do Planalto de que é preferível deixar passarem as eleições de outubro para enviar ao Congresso temas mais sensíveis, como a reforma da Previdência.
Erro crasso, causado pela falsa sensação de que se “bateu no fundo do poço”. Ora, a economia não se recuperará de forma sustentada por qualquer efeito mágico de uma lei da gravidade às avessas. Ainda bem que o presidente foi sensível aos alertas e determinou o envio da reforma independentemente do calendário eleitoral.
É certo que a emenda do teto para os gastos públicos já tramita na Câmara, mas, sem que se neutralizem causas da elevação autônoma dos gastos — a Previdência, uma das principais delas —, o teto será mais uma daquelas medidas que não pegam.
A sociedade brasileira deixou passar muito tempo para colocar a Previdência nos trilhos, com a fixação de idade mínima como requisito para a reivindicação do benefício. Há, ainda, um fator de propulsão dessa despesa, que tem sido a política de aumentos reais do salário mínimo, indexador desses gastos.
Dados esclarecedores de artigo do economista Raul Velloso, em “O Estado de S.Paulo”: de pouco antes de 1988, quando a Constituição foi promulgada — sob a ideia de o Estado resolver todos os problemas sociais —, até 2015, o peso dos benefícios previdenciários de um salário mínimo nos gastos federais passou de 3% para 25%. Por isso, se nada for feito não demorará muito para 100% das receitas da União serem usadas só para os gastos com o INSS. É certo que antes disso uma crise ainda mais grave eclodirá.
O tempo corre contra o Brasil. Quanto mais demorar o ajuste, pior. Estudo de Rubens Pena Cysne, professor da Escola Brasileira de Economia e Finanças da FGV-Rio, e de Carlos Thadeu de Freitas, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), estima este custo. Revelado pelo GLOBO, o trabalho considera que, se nada for feito ainda este ano, mas apenas a partir do primeiro trimestre de 2017, a conta do ajuste aumentará em R$ 21 bilhões, 0,35% do PIB. Será particularmente desastroso se o Planalto, devido a atrasos, for tentado a lançar mão de mais impostos. Com isso, retardará a retomada do crescimento. Aumentará custos das empresas, prejudicará o combate à inflação.
Também quanto mais rápido o ajuste começar, mais cedo o Banco Central poderá seguir um calendário para a redução dos juros, importante fator de desequilíbrio das próprias contas públicas.
O Copom não pode é se antecipar à ordem natural das coisas: baixar juros na “vontade política”, sem ajuste, porque será repetir o que fez a dupla Dilma/Alexandre Tombini, jogando a inflação para um patamar mais elevado, na fronteira do teto superior da meta (6,5%). O crescimento da crise fiscal fez o resto: derrubou o PIB e colocou a inflação nos dois dígitos.
12 de setembro de 2016
Editorial O Globo
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