"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

ECONOMIA BRASILEIRA CORRE O RISCO DE FICAR ESTAGNADA POR DÉCADAS



Ricardo Paes de Barros defende renegociar a dívida


















O governo precisa liderar um corte de gastos rápido e criterioso, ou o Brasil ficará estagnado por décadas e os pobres “sairão dos trilhos de novo”, afirma o professor Ricardo Paes de Barros, do Insper. 
E esse pacto precisa ser feito apesar da crise política conflagrada pelo processo de impeachment. “Não existe ajuste prolongado. Se a crise perdurar, todos sairão perdendo.”
O matemático e economista defende que a presidente Dilma Rousseff se dirija à nação, diga claramente o quanto o país pode gastar e defina cortes que sigam dois critérios principais: proteger os mais pobres e resguardar os programas eficientes.
“É preciso apelar para uma decisão técnica e não política, porque, se partir para a negociação, a quantidade de injustiça será bem maior.”
Qual o risco, para os avanços sociais recentes, de três ou quatro anos de recessão?
Por que haverá três ou quatro anos de recessão? Não houve um grande desastre natural, uma guerra civil, uma gigantesca perda de atividade. Nossa crise foi inventada por nós mesmos. Se o Brasil se organizasse seriamente, uma recessão mais longa seria facilmente evitável.
Quem o sr. chama de “nós mesmos”? O governo federal?
O governo federal foi eleito. Nós mesmos o elegemos.
Mas a desorganização é consequência da política do atual governo ou é estrutural?
É de gastar mais dinheiro do que se tem. Da irresponsabilidade fiscal. O gasto brasileiro de hoje, como porcentagem do PIB, só se ajusta a uma curva exponencial [que tende ao infinito]. 
Com isso, a dívida passa a não valer nada, os agentes econômicos se defendem cobrando juros maiores, cortando a produção. 
Se vivo num país em que o imposto cresce exponencialmente, tenho toda a razão do mundo de reclamar. É preciso definir que a carga vai ser de, digamos, 45% do PIB, para então poder pensar em simplificar a estrutura tributária, resolver o problema da Previdência etc. 
A saída é definir o gasto, chamar o Congresso e discutir o que fazer. Colocamos na Constituição que tal benefício será conquistado progressivamente ou será preciso revogá-lo, porque é impossível pagar aquela conta.
Há condições de pacto social e político com a situação que temos hoje?
Se não houver, o país vai ficar estagnado por décadas, não por quatro ou cinco anos. Alguém vai ter que organizar financeiramente o país, isso é prioritário e envolve fazer escolhas. 
Se continuarmos achando que os direitos econômicos, sociais e culturais estão acima das questões de possibilidade orçamentária não vamos a lugar nenhum. 
Será desastre econômico na certa. Mesmo com 100% do PIB o Brasil não consegue garantir vários desses direitos.
O que impede que a presidente assuma esse papel?
A presidente é o líder máximo. Deveria se endereçar à nação e dizer “não podemos gastar mais do que temos, é preciso cortar e é justo cortar desta maneira”. Não se pode improvisar, cortando onde dá, onde é mais fácil. 
O que não entendo nessa história é que não tem alternativa. O desajuste é de uma magnitude, e crescente no tempo, que, sem acordo com os credores, não há solução. 
Não há saída que não seja aparecer com uma proposta. Vai desagradar a alguns segmentos.
Como negociar com esses segmentos?
A proposta tem que ser baseada não em negociação, mas em princípios: “Escolhi cortar tudo o que não chega na metade mais pobre do Brasil, portanto vou cortar nisto e nisto”. Quem for contra terá que reclamar do princípio, não da operacionalização.
Os gastos a ser preservados são educação, saúde e transferência de renda?
Será preciso olhar cada programa para não cortar os eficientes. Há a questão distributiva, mas também a da eficiência.
Como fazer isso se o Brasil quase não tem mecanismos de avaliação?
Esse é um problema grosseiro. Somos pegos numa crise e não sabemos se podemos cortar aqui ou ali. Mas muitos desses programas têm similares em outros países. 
Dá para fazer uma avaliação rápida — imprecisa, ruim, cometendo injustiças que seriam evitadas se tivéssemos um sistema de monitoramento melhor, mas uma avaliação possível. 
É preciso apelar para uma decisão técnica e não política, porque, se partir para a negociação, a quantidade de injustiça será bem maior. A decisão política tem que ser a dos critérios: proteger os 50% mais pobres, que têm 15% da renda.
Qual o impacto de não fazer esses cortes?
É possível dar essa marcha à ré sem que os pobres lá atrás sintam nada. Se a locomotiva volta atrás, os primeiros vagões recuam sem pressionar os últimos, porque há espaços, como numa sanfona. Mas há um limite. 
Em crise longa, perde todo mundo. Em crise curta, graças à enorme desigualdade brasileira, é possível resolver sem prejudicar os pobres. 
A desigualdade nos salários do setor público é muito maior e mais resistente que a do setor privado. É preciso conter os altos salários do setor público e fazer um corte com critérios. Mas não existe ajuste de longa duração. 
Se transformarmos uma crise de curta duração em uma de longa duração, estamos dizendo para os pobres: “Não tem jeito. Vocês vão sair dos trilhos de novo”.

18 de dezembro de 2015
Ana Estela de Sousa Pinto
Folha

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