"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 9 de agosto de 2017

DANÇANDO NA BEIRA DO ABISMO

Em 15 maio, antes da divulgação da explosiva delação de Joesley Batista, o câmbio estava em R$ 3,1. No dia 1º de agosto, a cotação era idêntica.

Parece que a situação está calma. O mercado resolveu esperar o processo eleitoral de 2018.

Tudo se passa como se a dominância política tivesse dado um refresco. Eu mesmo acredito nessa tese.

Temer, com sua quase que ilimitada capacidade de gerir o Congresso Nacional, conseguiu administrar a crise produzida por seu descuido. Temer "is back in business".

Mas, como quase tudo na vida, cobra-se um preço. O preço está escondido, pois outras forças foram na direção contrária. A dinâmica muito favorável da economia mundial no último mês escondeu os custos econômicos do escândalo envolvendo Temer.

De abril a junho, houve surpresa desinflacionária na economia americana da ordem de um ponto percentual. No índice de inflação limpo dos componentes mais voláteis, como energia e alimentos, conhecido por núcleo da inflação, houve surpresa desinflacionária de 0,5 ponto percentual.

A menor inflação sinaliza que o processo de subida das taxas de juros nos EUA será mais lento do que havia sido previsto no fim de 2016.

Uma das características mais importantes da economia brasileira é ser muito escassa em capital. Nossa ridícula taxa de poupança produz juros reais aqui dentro muito elevados. Quando juros no resto do mundo são menores, nossa vida é mais fácil.

Adicionalmente a Europa apresentou neste ano crescimento mais robusto do que o previsto, o que mudou a visão do mercado com relação à diferença de crescimento estrutural entre a Europa e os Estados Unidos.

Ao longo do primeiro semestre, a economia americana, relativamente à europeia, veio com menor inflação e menor crescimento do que se imaginava. Consequentemente, a percepção passou a ser a de um euro mais forte do que se enxergava anteriormente em comparação ao dólar americano.

O enfraquecimento do dólar costuma ser favorável ao Brasil por meio da correlação inversa entre a moeda americana e a cotação de commodities que exportamos (outros fatores também influenciam o preço das matérias-primas).

O mecanismo de transmissão de uma crise de confiança derivada da política ocorre por intermédio do risco. A subida da percepção de risco induz desvalorização do câmbio, que, por sua vez, atrapalha o combate à inflação e a queda das taxas de juros.

De 15 de maio até hoje, o risco Brasil de dez anos subiu 0,3 ponto percentual. Não parece muito em razão do tsunami político de maio.

Meu colega do Ibre Livio Ribeiro mediu a parcela dos movimentos do risco Brasil nos últimos meses que se deve às nossas querelas internas e aquela atribuída aos movimentos na economia internacional. O resultado é que, se não tivesse havido a melhora do ambiente internacional, o risco Brasil teria aumentado 0,9 ponto percentual. Essa diferença de risco significa aproximadamente R$ 0,4 a mais no câmbio,
o que é bastante substancial.

Nosso desequilíbrio fiscal avança. A cada mês que não aprovamos reformas, sancionamos aumentos de salários para a elite do funcionalismo e juízes vetam aumentos de impostos e impedem que o Tesouro sequestre legalmente renda de Estados que não pagam suas dívidas com a União, a dívida pública cresce.

O tempo corre.



09 de agosto de 2017
Samuel Pessoa, Folha de SP

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