"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

segunda-feira, 11 de junho de 2018

QUEM AVISA, AMIGO É...

No início do ano, tínhamos a impressão de que a economia brasileira voltaria a deslanchar em função de termos uma inflação dominada, juros declinantes, nível elevado de reservas internacionais e a retomada da nossa atividade econômica em curso. Embora o desemprego ainda permanecesse elevadíssimo, ainda assim permanecíamos esperançosos de que as coisas iriam melhorar com o decorrer do tempo.

Todavia já predominava um gigantesco rombo estrutural em nossas contas públicas, enquanto o mercado externo ainda permanecia soprando ventos favoráveis na direção dos países emergentes. Naquele momento, pensava-se também, que havia tempo suficiente para surgir um candidato de centro, moderado, experiente, reformista, o qual, a partir do próximo ano, após sair vitorioso das eleições de outubro, viesse a combater definitivamente este crucial problema.

Há pelo menos um ano que o Banco Central (BC) vinha alertando que existiam dois sérios riscos para a economia e o maior deles é que, ambos, poderiam acontecer simultaneamente. O primeiro, se o país não conseguisse realizar as reformas indispensáveis para combater o perigosíssimo déficit estrutural.

Se não me engano, logo após o escândalo emblemático das fitas em meados do ano passado, uma Ata do Copom (Comitê de Política Monetária) divulgada pelo BC sinalizava que a incerteza causada pela falta de celeridade no processo das reformas e ajustes na economia, especialmente as fiscais e creditícias, continuava persistindo como o principal fator de risco.

Outro risco, comentado pelo BC, era de que em função do ambiente externo encontrar-se líquido e generoso, ele viesse a retroceder. Na Ata de fevereiro deste ano, o BC foi bastante incisivo com relação ao risco da combinação dos dois fatores. Nas entrelinhas, dizia que as frustrações relacionadas com a descontinuidade das reformas e os ajustes inevitáveis que a nossa economia exigia poderiam afetar os prêmios de risco e fazer ascender a trajetória da inflação no horizonte relevante para a política monetária. Esse perigo se intensificaria à medida que houvesse uma reversão no corrente cenário internacional favorável para as economias emergentes.

Foi exatamente o que veio a acontecer. Após o tumulto causado pelo efeito explosivo com a divulgação das fitas, o governo perdeu totalmente a sua credibilidade, tendo que abandonar o compromisso assumido de realizar o ajuste fiscal estrutural. Nos últimos meses, o ambiente externo passou a piorar continuamente. Podemos até considerar um terceiro fato, que o BC, por ser uma autarquia federal eminentemente técnica não aborda diretamente na sua comunicação - o risco político que podemos enfrentar na próxima eleição presidencial. De certa maneira, ele está indiretamente relacionado com a interrupção das reformas.

Se, por acaso, um candidato populista menos preocupado com o controle dos gastos públicos apresentar reais possibilidades de vencer o próximo pleito, com certeza, a insegurança quanto à retomada das reformas aumentará consideravelmente e, em consequência, cairemos adiante no despenhadeiro, com poucas possibilidades de emergir.

Nesses últimos dias, passamos momentos de alta tensão em que os mercados brasileiros estiveram bem próximos de um pânico generalizado. Os ganhos que a Bolsa proporcionou aos investidores nos primeiros meses deste exercício já se evadiram pelo ralo, passando, até então, a apontar resultado negativo no ano. O dólar, diante do real, enlouqueceu temporariamente e apresenta uma valorização desde o início de janeiro bem próximo de 20%, com projeções crescentes feitas pelos analistas. O pior de tudo isso é que os juros de mercado dispararam punitivamente e devem causar um suntuoso estrago numa economia em recuperação, que se arrasta, prejudicando significativamente o emprego, a renda e a vida de milhões de brasileiros.

Recentemente, em maio, aconteceu uma surpresa que também contribuiu com a piora. Inesperadamente, o Copom (Comitê de Política Monetária) colocou-se de forma inoportuna, assustando o mercado por manter a Selic (taxa básica da economia) em 6,5%, após admitir publicamente que seria cortada para 6,25%. Tenho a impressão de que a inusitada greve dos caminhoneiros deixou inúmeros recados positivos para sociedade, dentre eles, convenceu definitivamente o mercado financeiro de que o grande risco da vitória de um candidato populista poderá levar a Nação a um colapso.

A grande verdade é que quando não se consegue fazer a coisa certa principal, prevalece um impulso equivocado de se imputar as más consequências a desacertos de essência mais operacional, tática.

Com isso tudo, é até provável que alguns imaginem que o lapso estratégico do BC, no mês passado, imediatamente reconhecido por ele ou, até mesmo, a greve dos caminhoneiros, sejam os principais “protagonistas” da atual crise. Outros poderão criticar ou responsabilizar o BC pelo timing, a forma e a intensidade das suas intervenções nos mercados cambial e de títulos. Particularmente, considero tudo isso puro engano.

Logicamente, isso tudo interessa, mas as verdadeiras causas da atual crise já estavam previstas nas atas do Copom que foram amplamente divulgadas. Aconteceu que o sistema político e a sociedade resolveram assumir um grande risco, deixando para o futuro a solução do improrrogável rombo fiscal, contando, possivelmente, com a infinita proteção de Deus e com uma conjuntura externa permanentemente amigável.

A realidade, mais uma vez, foi extremamente rigorosa, deixando outra conta para os brasileiros pagarem pelos seus inconsequentes erros de omissão; por tudo isso podemos, daqui para a frente, reviver momentos de excepcional turbulência, a depender, em grande parte, do resultado das urnas.

11 de junho de 2018
Arthur Jorge Costa Pinto é Administrador, com MBA em Finanças pela UNIFACS

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