"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018

SEM JUÍZO

Apego de magistrados a penduricalhos dá ideia de como será a batalha para reformar o Orçamento


Entre a desfaçatez e o ridículo, magistrados federais tentam fazer avançar a ideia de uma paralisação da categoria —movimento cujo propósito, embalado em retórica jurídica e sindical, limita-se à defesa do indefensável.

O alvoroço decorre da decisão do Supremo Tribunal Federal, já tardia, de marcar para 22 de março o julgamento que pode acabar com a concessão generalizada de auxílio-moradia a juízes, incluídos os que residem em imóvel próprio na cidade onde trabalham.

Essa benesse, de R$ 4.377,73 mensais, está amparada em decisão provisória de 2014 do ministro Luiz Fux, e apenas afinidades corporativas parecem explicar a delonga do STF em deliberar de modo definitivo sobre o assunto.

Basta o bom senso mais elementar, afinal, para entender que tal modalidade de remuneração extra só faz sentido nos casos de profissionais deslocados para regiões distantes de sua residência habitual.

Entretanto a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) faz o que pode para desafiar a lógica. Em nota pública, a entidade reclama que outras vantagens, a exemplo das pagas na Justiça estadual, não serão examinadas —como se um privilégio justificasse outro.

Já em mensagem aos associados, a Ajufe repete a cantilena de que o Judiciário não tem recebido reajustes salariais —e o auxílio-moradia, presume-se, seria uma forma tortuosa de compensação.

É espantoso que o argumento venha de uma categoria instalada no 1% mais bem pago da população nacional, além de protegida do elevado desemprego que aflige os brasileiros há três anos.

Em média, cada um dos 18 mil magistrados do país custa R$ 47,7 mil mensais aos cofres públicos. O montante, bem superior ao teto do funcionalismo (R$ 33,8 mil), evidencia que o auxílio-moradia é apenas um de muitos mimos custeados pelo contribuinte.

O apego mesquinho de uma corporação de elite a penduricalhos desse tipo dá ideia de como serão árduas as batalhas para reformar o Orçamento público. Privilegiados pelas garantias do Estado, no mais das vezes, refugiam-se às lamúrias no papel de vítimas para manter seus ganhos ou reivindicar novos.
Uma eventual paralisação dos juízes, por sinal, acrescentará mais um período de folga aos dois meses de férias a que eles têm direito.


23 de fevereiro de 2018
Editorial Folha de SP

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