"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 17 de agosto de 2016

OS FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS DO DINHEIRO



Boa resenha sobre excelente livro escrito por um brasileiro, Leonidas Zelmanovitz, editado agora em inglês: "Os fundamentos filosóficos do dinheiro". Para quem pensa que o dinheiro, assim o como o mercado, é invenção dos "capitalistas", uma boa lição. Aliás, tanto o mercado quanto o dinheiro são de "ordem espontânea", como dizia Hayek. Em miúdos: não são criação racional, projetada por alguém, mas produto da interação humana:

A editora norte-americana Lexington Books lançou recentemente o livro The Ontology and Function of Money – The Philosophical Fundamentals of Monetary Institutions, de Leonidas Zelmanovitz. O autor é brasileiro, com graduação em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFGS), em Porto Alegre, e doutorado em Economia Aplicada pela Universidade Rey Juan Carlos, em Madrid.

A obra não apenas versa sobre os fundamentos filosóficos das instituições financeiras e do dinheiro, como aborda inúmeros temas correlatos que têm atraído a atenção dos especialistas nos últimos tempos. E surge numa época em que, assolados por um cortejo de novidades ensejadas pelos avanços da tecnologia, os economistas, entre blackchains e bitcoins, a cada dia são levados a discutir mais intensamente algo tão instigante e intrigante como o fim do dinheiro. Não do dinheiro em sua acepção mais genérica, mas do dinheiro com suas funções clássicas, como hoje o conhecemos. Mais especificamente, do meio circulante fiduciário, ou seja, do papel pintado sem valor intrínseco, com legitimidade e aceitação baseadas tão somente na confiança.

O livro compõe um volume alentado, de quase 450 páginas, e trata de uma variedade considerável de questões teóricas com desdobramentos práticos, constituindo, assim, além de valioso roteiro de consulta, preciosa fonte de significativo valor instrumental. Relevante, portanto, sob inúmeros aspectos. No âmbito limitado de um simples artigo-resenha, é possível destacar apenas três deles.

O primeiro é a inegável contribuição da obra no mundo acadêmico, pois, como adiantado, ela aborda várias questões teóricas relevantes de inequívoco interesse para a formação e o treinamento das novas gerações de economistas.

Como o autor discute conceitos importantes na busca do aprimoramento da gestão pública nas esferas fiscal e monetária, o segundo ponto a ressaltar é a valia do livro como suporte teórico na formulação de políticas públicas eficazes. O que pode contribuir para melhorar as condições de inserção das economias emergentes no sistema financeiro global, que está a cada dia mais ágil e integrado.

O terceiro aspecto situa-se na esfera dos valores políticos e decorre da explicitação que o autor faz dos fundamentos filosóficos da moeda e das instituições financeiras. Como se sabe, a moeda, os negócios e os banqueiros não são invenções do capitalismo. Todavia o fato de que hoje o mundo se volta cada vez mais para a economia de mercado faz com que as idealizações do sistema financeiro, da moeda e dos negócios estejam, no imaginário popular, associadas ao modo de produção capitalista.

E em se tratando de capitalismo, o que se verifica no mundo real é que a vulgata panfletária do marxismo propaga, com eficácia, a ideia de que os empresários – em especial os banqueiros, ícones desse sistema – são a expressão maior do mal na Terra. A imagem difundida é a de que a atividade empresarial, notadamente no setor financeiro, é exclusivamente motivada pela cupidez humana. Como se todo empreendedor, por definição, fosse intrinsecamente aético e desonesto.

É inegável que existem empresários e banqueiros aéticos e desonestos. Como há, por exemplo, políticos e burocratas aéticos e desonestos. Mas daí à generalização vai uma grande distância. Ainda que a alguns soe estranho, o fato é que existe um ethos empresarial, um ethos capitalista. Negar isso é negar a própria realidade. Nesse sentido, a obra explicita à exaustão, sobretudo no campo da ética, a importância dos fundamentos filosóficos da atividade empresarial em geral e da financeira em particular.

A propósito, cabem duas menções. A primeira, a de que Adam Smith, um dos principais formuladores do liberalismo econômico, era professor de Ética em Glasgow. Na época, e para ele, a Ética e a Economia constituíam uma mesma e indissociável disciplina.

A outra menção se liga a uma das causas que levaram Max Weber a se interessar pela ética protestante e o espírito do capitalismo. Ainda jovem, ao pesquisar a atividade rural nas províncias a leste do Elba, Weber impressionou-se com a postura ética dos negociadores de produtos agrícolas. Para sua surpresa, ele constatou que os preços acertados de boca com os agricultores meses antes da colheita eram, depois, rigorosamente honrados, mesmo quando circunstâncias supervenientes, como as de ordem climática, alteravam de forma significativa o valor da produção, gerando lucro inesperado para uns e prejuízo para outros.

Compete, ainda, registrar que, dirigida principalmente aos economistas, a obra inclui algumas passagens aparentemente menos acessíveis aos não iniciados. Como, por exemplo, quando, ao projetar o futuro da moeda, indaga “(...) se pode o dinheiro tornar-se apenas uma unidade de conta sem existência material e não mais um meio de pagamento”. Ou “(...) se o dinheiro será sempre um meio de pagamento e não mais uma unidade de conta”. Ou, ainda, (...) se caminharemos para “um sistema monetário com base zero e a divisão do dinheiro em uma unidade de conta, e um ou mais meios de pagamento”.

Não obstante tais passagens menos abertas ao grande público, a obra em comento pode, ainda assim, contemplar o interesse de leitores não especializados, sobretudo os afeitos à filosofia, à História e à política.

Escrito e lançado em inglês, espera-se que o livro seja editado também em espanhol e em português. Isso porque sua maior difusão, sobretudo na América Latina (AL), viria a constituir importante ferramenta para auxílio à formulação de políticas públicas fiscais e monetárias nos países da região. Além de estender seus ensinamentos às universidades destas longitudes. (Marcos Poggi, Estadão).


17 de agosto de 2016
orlando tambosi

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