"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 2 de abril de 2016

NAVIO FANTASMA

Nem uma estratégia de sobrevivência a presidente Dilma parece capaz de adotar; Por ora, dedica-se a repetir a seus devotos que “não vai ter golpe”

Com o desembarque do PMDB, o governo Dilma se transforma em navio fantasma. Sem timoneiro, sem mastros, sem lanterna de popa, transforma-se em massa informe e passiva, ao sabor do vento e das ondas.

Nem uma estratégia de sobrevivência a presidente Dilma parece capaz de adotar. Por ora, dedica-se a repetir a seus devotos que “não vai ter golpe”, como se o que está por acontecer seja realmente um golpe e como se bastasse recitar esse mantra para afastar o pior.

Os ataques indiscriminados à Justiça e ao Ministério Público sugerem que a presidente Dilma tem uma concepção confusa do que seja a independência dos Três Poderes e dos valores republicanos. Começou por dizer, em junho de 2015, que não respeita delator, esquecida de que foi ela própria quem promulgou a lei da delação premiada. Continuou por afirmar que a Operação Lava Jato trabalha com alvos seletivos, sem dar-se conta de que ela esteve entre os que pretendiam que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, fosse alvo prioritário - e, portanto, também seletivo - do juiz Sérgio Moro.

Para arrancar os 172 votos de que precisa na Câmara, Dilma se dedica agora a garimpar políticos dispostos a aceitar cargos no governo em troca de apoio contra o impeachment, que recompusesse, assim, parte da base perdida com a defecção desta terça-feira, tendo em conta que nem todos os políticos do PMDB pularam fora.

Se conseguir safar-se, o que parece improvável, o que seria seu governo nos dois anos e pico que lhe sobrariam do atual mandato? Com que munição política conseguiria governar? E, mais importante, até que ponto o PT seguiria disposto a apoiar sua presidenta que refuga tão veementemente suas propostas de política econômica?

As posturas contraditórias complicam tudo. A presidente Dilma mostra-se, às vezes, interessada em negociar, mas, ao mesmo tempo, ataca quem poderia ajudá-la. E, entre os políticos, passou a ser conhecida como quem é incapaz de respeitar acordos.

As coisas ainda poderiam ser mais fáceis se a presidente Dilma admitisse seus erros, tanto na condução da política econômica quanto na condução das operações políticas. Mas ela não se mostra nunca disposta a pedir desculpas e a recomeçar em novas bases.

A hipótese de troca de governo, cada vez mais provável, não clareia o entorno. A primeira reação poderia ser de entusiasmo do mercado financeiro e dos agentes econômicos, mas há uma enorme e dolorosa conta a apresentar à população. O governo já admite que a queda do PIB deste ano será de 3,1%. É inevitável que a renda per capita caia em torno de 10% no biênio 2015 -16. O desemprego vai para mais de 10% da força de trabalho. As contas públicas estão em frangalhos, como se viu nesta terça-feira com a divulgação do relatório fiscal. A dívida bruta avança para os 80% da renda média do brasileiro. A indústria está em processo de desmanche. A Petrobrás, à beira do colapso.

As semanas seguintes à provável substituição de comando no governo, qualquer que seja ele, tenderiam a continuar fortemente conturbadas. E, além do mais, continuariam sob a influência de antigas e novas revelações da Operação Lava Jato.



02 de abril de 2016
Celso Ming , Estadão

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