"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 19 de setembro de 2015

A PRESIDENTE NÃO MANDA MAIS NADA


 (Trecho Reportagem de Época) Existem, na política, líderes egovernantes comuns. Os líderes se diferenciam dos governantes comuns pela maneira com que enfrentam crises. Eles veem, nos momentos difíceis, oportunidades para unir o país em torno de reformas amplas, necessárias, estruturais. Ou seja, têm a coragem de fazer o que tem de ser feito. Os casos de Bill Clinton e Margaret Thatcher, que enfrentaram crises econômicas e recolocaram seus países no rumo, são inspiradores. 

Quando o Brasil perdeu o selo de bom pagador, segundo a classificação da agência Standard & Poor’s, configurou-se no país uma situação parecida. Como se dizia nos tempos em que havia orelhão, caiu a ficha de que havia uma crise grave – e o fato deixou sem discurso mesmo os que, por miopia ou conveniência política, teimavam em negá-la. Há a crise, e há a consciência clara do que tem de ser feito. 

Economistas de diversos matizes, incluindo Bernard Appy, que trabalhou sete anos em governos petistas, concordam no básico: é hora de cortar gastos no curto prazo, fazer uma reforma estrutural no longo prazo e evitar aumentos de impostos que possam piorar ainda mais a situação. Dilma Rousseff, no entanto, não foi a líder que os brasileiros esperavam, ou precisavam. Sabendo o que precisava ser feito – cortar despesas –, não o fez. Sabendo o que não deveria ter feito – aumentar impostos –, apresentou um pacote que se assenta sobre um tributo cuja implantação trará, entre outros efeitos, a alta nos preços e o aumento do desemprego.

Dez minutos antes de o pacote fiscal ser anunciado no salão Oeste do Palácio do Planalto na segunda-feira, dia 14, Dilma ligou para o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Seguiu-se um diálogo protocolar, sem rapapés. “Presidente, eu sei que o senhor é contra o aumento de impostos com a recriação da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira), mas eu gostaria de avisar que isso vai estar no pacote”, disse Dilma. Cunha respondeu com um seco “tudo bem”. Dilma não se limitou a procurar Cunha. A presidente, que é frequentemente acusada de não gostar de articulações, reuniu-se duas vezes com um grupo de parlamentares, líderes e vice-líderes da base aliada. 

Ela própria fez o convite, e todos riram juntos de algumas piadas. Ao final do primeiro encontro, quando a presidente disse que ligaria para marcar um café da manhã, alguns ironizaram: “Ué, mas a senhora tem o número do nosso celular?”. “Fique tranquilo, a nossa telefonista te acha de um jeito ou de outro”, disse Dilma.

Por trás da encenação política, havia uma tensão indisfarçável. Dilma precisa convencer os parlamentares a aprovar as medidas de ajustes nas contas públicas.  E a maior parte do ajuste proposto virá do aumento de impostos. Seu governo vive um momento que a clínica médica chama de “efeito lazaroide”: até se movimenta politicamente, mas são espasmos descoordenados, involuntários, sem um comando nervoso central. Por mais que tenha se esforçado, mais uma vez Dilma não convenceu.

A chance de o Planalto conseguir aprovar o retorno da CPMF na Câmara é mínima. O corte na própria carne – com a provável fusão de ministérios – foi considerado uma cortina de fumaça para fazer passar o aumento de impostos. “Esse é um pacote de ‘faz de conta’ que, na prática, não corta nada. De tudo o que o governo anunciou, só vai cortar R$ 2 bilhões da própria carne”, diz Eduardo Cunha. 

Tão logo divulgou os cortes de gastos, o Planalto recebeu sinais de que teria dificuldades para sair vitorioso no Congresso. Dilma escalou então sete governadores que entraram em campo para pressionar pela aprovação do imposto, cujo impacto na arrecadação é de pelo menos R$ 32 bilhões por ano. A comitiva, encabeçada pelo governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, tentou convencer os parlamentares a aumentar a alíquota de 0,20%, conforme sugerido por Dilma, para 0,38%. A diferença de 0,18% seria embolsada pelos Estados. 

A pressão, aparentemente, não deu certo na Câmara, tampouco no Senado. Uma categoria mitológica da política nacional é o poder dos governadores sobre as bancadas estaduais de deputados e senadores. Esse poder é residual. Produz foto, declarações, mas não muda voto no Congresso. O governo diz que a CPMF vai ajudar a tapar o buraco da Previdência e os governadores afirmam que ajudará os Estados, mas, na verdade, esse imposto cria um problema: as empresas vão repassar o custo para o produto final. E quem vai pagar a conta? "O povo brasileiro, claro”, diz o senador Paulo Paim (PT).

19 de setembro de 2015
in coroneLeaks

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