"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 11 de março de 2014

O SUPLÍCIO DA BOLSA


O mercado de ações no Brasil vive um momento difícil, literalmente enfraquecido e plenamente desanimador. Seus ativos foram atingidos frontalmente. No atual patamar em que se encontra, jamais devemos preconizar tempos piores para ele.
 
O “amigo” urso (um símbolo de âmbito mundial que nasceu no berço de Wall Street para indicar um mercado em tendência de queda – “bear-market”) continua hostilizando os pregões da Bovespa há algum tempo. O derretimento nas cotações visto nas primeiras semanas de janeiro, em função do nível de pessimismo apresentado pelos investidores com aversão ao risco, parece-me que deu uma trégua, ao menos, por enquanto. 
 
O Ibovespa registrou um dos piores desempenhos do mundo no ano passado, ao perder 15,5% no seu índice e, neste ano, segundo algumas projeções estimadas por analistas, existem grandes chances de, no primeiro trimestre do ano em curso, acontecer uma queda superior a 10%, uma vez que, até o momento, acumula um estrago de 8,75% em 2014 e de 18% no período de doze meses.
Porém, a má fase não é de agora. De dezembro de 2010, quando o Ibovespa ficou sob o equilíbrio do zero a zero até os dias atuais, ele apresentou uma redução nominal em torno de 50%, caindo de 69.301 pontos para 46.244 pontos até a primeira semana de março.
 
É bem provável que no transcorrer de 2014 as turbulências no mercado de ações ainda continuem presentes por vários motivos que veremos à frente, embora ele não apresente no curto prazo uma tendência melhor definida, inclusive pela poderosa escalada dos juros. Sua tendência, por enquanto, ainda é baixista em boa parte das suas cotações.
 
A principal palavra divulgada no radar de renda variável é “volatilidade”; toque exclusivo, devendo continuar persistindo e bem elevada. Segundo dados da Thomson Reuters, a Bovespa tem a maior volatilidade de trinta dias entre os principais índices de ações nas Américas.
 
Talvez seja este um clima propício para que o mercado de capitais se inspire no IBGE, que apresenta estatísticas de emprego e desemprego, desenvolvendo uma metodologia aplicada com vistas a mensurar a situação de “desalento” dos investidores brasileiros.
Influências no desempenho da Bovespa passam por dois pontos de vista, para mim, determinantes.
Efeitos endógenos, eminentes responsáveis, em função da deterioração das contas públicas internas e externas, uma política fiscal errática que adota maquiagens contábeis com o intuito de mascará-la; perda de competitividade, baixa poupança doméstica, inflação persistente, incessante intervencionismo do governo na economia e a completa falta de credibilidade na equipe econômica.
 
Consequências exógenas, através da virose que acometeu os países emergentes, já que, segundo declaração de Janet Ellen, atual presidente do FED (banco central americano) – “o Brasil situa-se apenas atrás da Turquia entre mercados emergentes mais frágeis economicamente, sendo a segunda economia emergente mais vulnerável a choques externos em uma lista de quinze nações”; também é relevante o rebalanceamento econômico que o planeta está atravessando, que resulta num menor crescimento mundial, dando origem a um novo ciclo para a economia global, envolto em alguns riscos transitórios.
Atualmente, sem dúvida, existe uma confiança bem maior no cenário internacional em relação ao nosso, em função da recuperação consistente da economia americana, de vestígios instáveis do restabelecimento econômico da Europa conjuntamente com a desaceleração econômica chinesa, procurando-se minimizar suas respectivas consequências.
 
A Bolsa só reagirá quando a situação interna melhorar e com as perspectivas do PIB se elevar em 2014, pois a projeção mediana divulgada recentemente é de 1,67% para dezembro, devendo sofrer revisões periódicas. A Bolsa só cresce quando o PIB sobe, mas, até então, não sinaliza nenhuma melhora substancial do indicador na superação do ano passado e o desempenho macroeconômico do País sem dúvida, é fundamental.
 
A queda das ações nos últimos meses desviou a atenção de muitos investidores da Bolsa de Valores brasileira, transferindo um significativo valor para outros ativos mais atraentes, inclusive deslocando-se para outros mercados em busca de uma margem de segurança maior. Só para se ter uma impressão, a Bovespa, ao longo de 2013, negociou R$ 1,83 trilhão.
O baixo apetite de investidores internacionais pela nossa Bolsa sinalizou um possível sinal da carência de perspectivas, já que são eles os principais compradores de ações brasileiras. Este segmento representa em média 43% de todo o volume negociado e o saldo acumulado pelos estrangeiros na Bovespa nos primeiros dois meses deste ano passou de negativo para positivo em R$ 434 milhões.
Portanto, trata-se de um grupo imprescindível na sustentabilidade dos negócios; influencia os destinos do mercado, demonstrando como ficamos vulneráveis a seus humores e movimenta-se com mais harmonia do que os aplicadores residentes no Brasil.
 
Considero que as ações brasileiras, de modo geral, estão relativamente descontadas, pois existem preços em empresas sendo cotadas em índice inferior ao seu valor patrimonial; muitas delas não apresentam endividamento em dólar e outras, não apresentam necessidade momentânea de recorrer ao mercado de capitais. Diante do fato, o número de empresas recomprando seus papeis no mercado disparou, pois só elas conhecem bem a sua realidade.
Não se pode negar que existem oportunidades de investimentos após uma queda do índice em torno de 34% em dólar nos últimos doze meses. Chegará um momento em que a Bolsa poderá ficar ainda mais acessível diante das chances da desvalorização do real ocasionada pelo macroambiente externo, tornando-a mais convidativa para os investidores internacionais. Obviamente, isso estimulará uma retomada pontual.
Alguns analistas do nosso mercado atestam que existem “pechinchas” na Bolsa brasileira, mas o fato é que esta condição não está sendo tecnicamente aproveitada durante este longo ciclo de baixa. Na verdade, falta credibilidade para ir às compras, em grande parte, pela atmosfera econômica desfavorável em ampliar os ativos de risco neste exemplar momento. Até as ofertas públicas de ações, neste ano, encontram-se nos menores níveis em dez anos.
Temos convivido com um ambiente singular, dentro da percepção de que as ações estão efetivamente baratas. Determinados pregões ficam ainda mais baratos, em seguida se elevam, denotando sinal de fôlego, no subsequente caem novamente, deixando uma dúvida íntima no observador em como aplicar.
 
Nesta incômoda mutação, ele acaba não tolerando este comportamento de bipolaridade e busca temporariamente investimentos na renda fixa ou outros produtos financeiros que o protejam da escalada inflacionária.
Na realidade, o desafio é descobrir o ponto ideal para uma boa compra dentro da visão sistêmica de longo prazo, algumas vezes tendo que lidar com as traições de análises técnicas.
O investidor não é “Jó“ e sua notável paciência tem limites. Faz algum tempo que as notícias não são promissoras para quem aplica na Bolsa. Nos últimos quatro anos, a cada instante, surgiram inúmeros protagonistas para responsabilizar seu mau desempenho.
Temos um mercado de ações pouco desenvolvido, bastante convergente para o setor de commodities, que não manifesta a relativa vitalidade do nosso mercado interno.
Outra questão importante pela qual podemos responsabilizar o péssimo desempenho da Bovespa nos últimos anos, foi o monumental estardalhaço populista que o governo petista fez, criando uma exagerada expectativa nas descobertas das reservas de petróleo. Insinuou que o pré-sal poderia ser a única solução às mazelas e desequilíbrios sociais que humilham o nosso País.
A situação atual, com certeza, seria um pouco melhor sem a total possibilidade de rebaixamento da nota do Brasil pelas agências de classificação de risco, sendo que o mercado já colocou no preço essa expectativa negativa; esse evento, porém, tem relativas chances de não acontecer. É importante lembrar a aventura inconsequente do Grupo EBX ao dar o maior “calote” empresarial já visto na América Latina, com sua petroleira OGX agonizando no processo de recuperação judicial e lesando seus acionistas minoritários; o expressivo montante de capital levantado pela Petrobras (que já foi uma das maiores petrolíferas do mundo), divulgando no seu último balanço patrimonial um endividamento extraordinário, emplacando 39% com relação ao seu patrimônio líquido.
O potencial de barris há muito tempo está na fronteira da ineficiência e da plena desconfiança. Há necessidade de impulso para edificar as bases de produção, mas também há uma força fenomenal para destruí-la, do ponto de vista político. Divulgam-se indícios do recebimento de vultosas propinas pelos funcionários da estatal, corrompidos pela holandesa SBM Offshore para fechar “promíscuos” negócios. Usam-se subsídios irresponsáveis no controle de preços dos combustíveis como se isso fosse um instrumento de política econômica na perseguição da meta de inflação.
Lembremo-nos de inesquecível oferta pública de ações através de uma mega subscrição realizada em 2010, objetivando apoiar seu desenvolvimento, mas comprometendo-se com os mirabolantes e confusos Planos de Negócios em permanente revisão. O valor de mercado (cotações em bolsa) da Petrobras corresponde hoje a apenas 60% do valor patrimonial no exercício 2013 (vide gráficos).



Depois das petrolíferas, as ações do setor das elétricas, consideradas como sendo os papéis mais defensivos que engordam as carteiras de dividendos, deixaram de ser as mais “paqueradas” do mercado. Elas são tradicionalmente tidas como grandes provedoras de robustos dividendos (dividend yield), pois transferem boa parte dos seus lucros aos acionistas, já que não carecem de grandes investimentos e têm receitas estáveis. Em épocas mais difíceis para a Bolsa, essas ações costumam se sobressair, pois os proventos distribuídos equilibram eventuais perdas.

Este segmento encontra-se bastante problemático, em virtude da acentuada queda do preço da energia elétrica desde fevereiro de 2013. As empresas prejudicadas perdem milhões em lucros e deverão ser destaque por muito tempo com o custo que as distribuidoras terão de absorver pelo uso das termelétricas para compensar a seca nos reservatórios das hidrelétricas.

Para o investidor, ainda não está clarificado como e se o governo vai repassar esse impacto ao consumidor em pleno ano de eleições. As contas de luz teriam que subir no mínimo 10% neste ano, caso o governo decida cobrir apenas metade do rombo no caixa das distribuidoras por causa do uso intensivo das térmicas.

O desânimo nos mercados financeiro e de capitais cresce em função da eleição presidencial, pois qualquer intenção para um grande ajuste, provavelmente se for feito, só terá lugar no próximo ano, uma vez que representa um elevado custo político.
Assim, a situação do Brasil parece que estará mais agravada em 2015, deixando-nos um rastro saudoso de 2014 - certamente haverá elevação dos juros, cessando boa parte dos gastos públicos que incitam a demanda e, consequentemente, dificultando o crescimento do País e tornando o desemprego fatal. Por enquanto, a meu ver, este cenário é o mais plausível.

Se o governo não fizer o mínimo necessário, o rombo vai crescer. Investimentos que poderão ser feitos não apresentarão um crescimento satisfatório. Problemas de infraestrutura alinhados ao de capacidade de produção continuarão turbinando a inflação.

A evidente insuficiência de investimentos e a inescrupulosa gestão governamental nesses últimos quatro anos motivaram prejuízos às concessões públicas e inviabilizaram os imprescindíveis avanços na infraestrutura. Qualquer crescimento mais amplo na economia, consequentemente, alimentará a impiedosa inflação.

O horizonte é de plena incerteza para muitos investimentos, independentemente da sua natureza; o pesadelo que predomina resume-se, no meu entender, ao falso paradigma introduzido no Brasil de baixo crescimento e inflação elevada, que podemos ousar interpretar como de uma tempestade “imperfeita”.
 
11 de março de 2014
Arthur Jorge Costa Pinto é Administrador com MBA em Finanças pela UNIFACS (Universidade Salvador).

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