Ex-premiê fica inelegível por seis anos e pode ser preso por outros processos a que responde
Senadores aplicam ao ex-premiê lei de 2012 que manda cassar todo parlamentar condenado a pena acima de 2 anos
Cassado ontem o mandato de senador de Silvio Berlusconi, o ex-primeiro-ministro italiano e seus seguidores reagiram de uma maneira muito semelhante à dos condenados pelo mensalão e seus apoiadores.
Antes mesmo da votação, Berlusconi declarou o dia de ontem como "de luto para a democracia", procurando, como os acusados pelo mensalão, dar à decisão do Senado o caráter de perseguição política.
Seus adeptos seguiram o tom, ao estender uma faixa nada improvisada diante do Palazzo Grazioli, sua residência romana, com os dizeres "É golpe de Estado".
Em vez de punhos estendidos no momento da prisão, como ocorreu no Brasil, as parlamentares da "Forza Italia", o partido que Berlusconi acaba de refundar, vestiram negro, para caracterizar, até nas vestes, o "luto pela democracia".
O show berlusconiano não comoveu os senadores, que foram derrubando, uma a uma, as nove emendas apresentadas ao parecer da Junta das Eleições e da Imunidade Parlamentar que propunha a cassação, com o que prevaleceu o relatório original.
"Foi uma página de aplicação ordinária da lei", desdramatizou o senador Dario Stefani, relator do processo.
De fato foi. Uma lei de 2012 aprovada com o apoio dos parlamentares do PdL (Povo da Liberdade, o partido que Berlusconi então liderava) manda cassar o mandato de qualquer parlamentar que tenha sido condenado em definitivo a uma pena de mais de dois anos.
Berlusconi foi condenado definitivamente a quatro anos de prisão, por fraude fiscal, em um dos incontáveis processos a que responde na Justiça italiana.
Cumprirá apenas um ano, no entanto, pela idade avançada (77 anos) ou em prisão domiciliar ou por meio da prestação de serviços comunitários.
O jornal "Il Messaggero" saudou a condenação como "o verdadeiro início da era pós-Berlusconi", que o diário acusa de ter sido "o principal obstáculo que gradualmente conduziu a Itália à paralisia".
Na verdade, a era pós-Berlusconi começara no dia 2 de outubro, quando boa parte de seu partido recusou-se a derrubar o governo do centro-esquerdista Enrico Letta, contrariando o chefe.
Pior, para ele: seu presumível delfim, Angelino Alfano, hoje vice-primeiro-ministro, rachou o PdL, criando um grupo batizado de "Novo Centro-Direita", para o qual levou 30 dos 54 senadores de Berlusconi e 27 dos 109 deputados.
Com isso, Berlusconi já havia perdido a possibilidade de chantagear o governo Letta com ameaças de retirar o apoio e, com isso, derrubá-lo, forçando a realização de novas eleições que muito provavelmente reproduziriam o que editorial de ontem do "Corriere della Sera" definiu como "perfeita impotência política".
De fato, a Itália rachou, nas eleições de fevereiro, em três blocos de tamanhos parecidos, em torno de 25%, o que a tornava ingovernável.
Só a aliança do centro-esquerda com seu eterno inimigo Berlusconi permitiu a montagem do governo Letta, sempre instável enquanto dependeu dos humores de Berlusconi, mais empenhado em salvar seu mandato e blindar-se contra o que considera perseguição judicial. Cassada a blindagem, fica ainda mais exposto.
A cassação tira do Parlamento, pela primeira vez em 20 anos, um líder populista que, no entanto, se mantém na política, como presidente da Forza Italia e também eventual candidato em uma futura eleição.
Pesquisas realizadas em novembro mantêm o quadro de equilíbrio entre centro-esquerda, centro-direita e o movimento antipolítica batizado "Movimento Cinco Estrelas", de Beppe Grillo.
28 de novembro de 2013
CLÓVIS ROSSI - Folha de São Paulo
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