"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 31 de dezembro de 2013

2014, INEVITAVELMENTE!

Último dia de um ano que não deixará saudades... Igual aos anteriores, que pavimentaram com a lama da desonestidade os caminhos  do ano 13 que se encerra.
Escândalos, corrupções declaradas e impunes, abuso de poder, e as figurinhas eternas que através do engodo eleitoral, continuam com mandatos, praticando toda ordem de falcatruas, desfigurando uma nação, desacreditando valores éticos e políticos, denegrindo a imagem do país e desacreditando o futuro.
Tudo desembocando na grande conspiração que apropriadamente tomou o nome de mensalão, ícone do maior caso de corrupção jamais registrado na história do Brasil da Silva.
Exaustivamente o blog denunciou o crime praticado, levantado por cronistas, comentaristas e analistas políticos, desvelando os bastidores onde atuam as máfias, corrompendo as instituições, envenenando gerações fazendo-as crer na 'dolce vita' do dinheiro fácil, do enriquecimento sem trabalho, na esperteza do jeitinho brasileiro do "gosto de levar vantagem em tudo". E sobretudo o exemplo da impunidade de tantos crimes...
Explodem rojões, e o futuro parece sorridente, enterrando o lixo do ano que melancolicamente nos enterrou na desesperança.
Abençoados os que trabalharem pela mudança no ano eleitoral de 2014!
Abençoados os que aprenderam o valor do seu voto, e não o trocam por discursos mentirosos de palanqueiros a serviço da miséria, da falta de segurança, de saneamento, de educação, saúde...
Com seus carrões blindados, seus guarda-costas, com o Sírio Libanês à sua disposição... Suas mansões, suas mordomias pagas com a violenta extorsão dos impostos de quem produz e trabalha... No Brasil maravilha, de uma vergonhosa classe política que transformou o bem púbico em privado, o mandato em um grande negócio, no qual se pratica o enriquecimento ilícito, que tipo de consciência pode sobreviver num país sem lei nem rei?
O que importa a violência, as malditas filas do SUS, a inflação que corrompe e corrói o direito de viver?
Abençoados os que não se deixam mistificar por 'bolsismos' e outros salamaleques!
Desmascaremos a hipocrisia, a bandalheira, a corrupção!
Por um Brasil que não seja da Silva!
Venha 2014 transbordando de consciência política para mudar o destino da nação, recolocando-a no caminho da democracia e da liberdade!
m.americo
 

INOPERÂNCIA TOTAL

Maranhão: Roseana dá show de incompetência no caso dos presídios, enquanto Sarney fala besteiras


roseana_sarney_27A governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PMDB), tem até o próximo dia 7 de janeiro para dar uma explicação sobre a onda de terror que tomou conta dos presídios do mais miserável estado brasileiro, principalmente no Complexo Penitenciário de Pedrinhas, na capital São Luís.

Ou seja, a filha do caudilho José Sarney ganhou um tempo para maquiar a própria incompetência, marca registrada do clã que instalou no Maranhão o modelo verde-louro do Apartheid.

Com mais de sessenta mortes registradas nos presídios maranhenses, onde as mulheres dos presos são estupradas por líderes de facções criminosas que atuam nas cadeias, Roseana não tem como explicar o inexplicável.
O máximo que a governadora conseguiu fazer, e de maneira vergonhosa, foi reconhecer tardiamente que a Polícia Militar precisa atuar dentro das unidades prisionais como forma de inibir a ação dos presidiários que continuam a cometer crimes intramuros e a dar ordens aos marginais que estão em liberdade.

Fosse uma governante responsável e de pulso, Roseana já teria demitido todos os responsáveis pela administração penitenciária no estado. Só não o faz porque é conhecida por mesclar covardia com incompetência.
anonovo_2014_01
O ápice da depravação em que se transformou a atuação do clã da Praia do Calhau ficou por conta do senador e líder do grupo político maranhense, José Sarney, que em entrevista à Rádio Mirante, de propriedade da família, comemorou o fato de a violência nos presídios não ter alcançado as ruas de São Luís.

Ex-presidente da República e senador pelo Amapá, José Sarney é um irresponsável que não mede as próprias palavras. Na verdade, Sarney está precisando passar uma temporada em algum presídio maranhense para ter tempo suficiente para refletir e colocar as ideias na rota da concatenação.

A declaração do caudilho maranhense aconteceu horas depois de os líderes das facções criminosas terem ordenado, a partir dos presídios, que estupros fossem cometidos nas ruas de São Luís, como represália à falta de ação do governo de Roseana Sarney, que ao longo dos anos se especializou em promessas e ações inócuas.

Adversários políticos da “famiglia” Sarney protestaram duramente contra as declarações do ex-presidente da República, com direito a especulações sobre a sanidade do chefe do clã que transformou o Maranhão em capitania hereditária.
O deputado federal Domingos Dutra (SDD) fez severas críticas a José Sarney por causa da irresponsável declaração. Já o deputado federal Waldir Maranhão solicitou ao Ministério da Justiça e à Secretaria de Direitos Humanos providências imediatas para conter a barbárie que se instalou nos presídios maranhenses, sem que a governadora tivesse tomado alguma medida para evitar a carnificina que levou o Maranhão ao noticiário dos últimos dias.

31 de dezembro de 2013
ucho.info

O HUMOR DO DUKE


Charge O Tempo 31/12
 
 
31 de dezembro de 2013


BECOS DO TEMPO

 
Na tradição judaica, o Ano Novo tem espaço peculiar no calendário. Começa que seus significados estão desatrelados de eventos naturais ou históricos. Depois, não se celebra em apenas um dia ou uma noite. Prolonga-se por dez dias, os chamados Iamim Noraim, traduzidos como Dias Intensos ou Temíveis.
Neles, mesmo os judeus não praticantes, que é o meu caso, são convidados a uma reflexão sobre a vida, interrompendo a rotina e quebrando o ritmo, muitas vezes alucinante, dos afazeres e que fazeres.
 
É uma proposta forte, marcada por canções de impacto, introspectivas, e por um diálogo muito difícil com nossa finitude. O som do shofar, antiquíssimo instrumento musical produzido normalmente com chifre de carneiro, ritualiza o final do balanço.
 
A passagem do tempo está presente em todas as culturas, pontuando a volatilidade humana e registrando a dolorosa relação que temos com a morte. Estamos às vésperas de um novo ano do calendário cristão. Tomando emprestada a velha mania judaica de perguntar e duvidar, vou dar uma olhada no que me sensibilizou em 2013 e, por que não ?, projetar meus desejos para 2014.
 
Em 2013, Edward Snowden revelou um segredo de Polichinelo: os Estados Unidos espionam o mundo inteiro, incluídos no pacote desde inimigos históricos até aliados leais e milhões de cidadãos comuns.
Quem, honestamente, ficou surpreso ? Na melhor das hipóteses, pode ter havido alguma perplexidade com a dimensão dos tentáculos. Que em 2014, venha um ardiloso contra-ataque.
Flagrado ao fazer a feira pela internet, Obama terá o número de seu celular revelado. A partir daí, será infernizado por infindáveis ligações de telemarketing, que “estarão vendendo” todo tipo de tralha. Com direito a musiquinhas. Mandinga da boa.
O robô chinês que desceu na Lua em 2013 mapeará, em 2014, a primavera das nossas esperanças ?
 
NOVO ESPORTE
Proponho a criação de um novo esporte, cuja jornada inaugural será no ano da Copa. Antes, porém, tenho uma dúvida: pancadaria é esporte ? Se for, estou no caminho certo. Seguinte: que tal colocar num octógono monumental todos os lutadores de UFC e MMA e os marginais que transformam as arquibancadas das “arenas” de futebol em picadeiros sangrentos ? Todos são especialistas em socos e pontapés nas cabeças alheias.
Traumatófilos fanáticos. Que se empenhem numa batalha final, num único round, sem regras e sem direito a recurso no STJD (senão, algum advogado do Fluminense acaba descobrindo uma irregularidade e suspendendo o espetáculo). Que deem vazão entre si a seus baixos instintos e nos livrem das carnificinas que, regularmente, protagonizam. Amém.
 
Não seria mau que as eleições gerais de 2014 mostrassem menos preocupação com as qualidades gerenciais dos candidatos e recuperassem o tom político de outros carnavais. Que se saia do desfile monótono de números e gráficos, não raro maceteados e ininteligíveis, e se caia nos debates ideológicos, com claras demarcações do que se pretende para o país.
Que a memória do povo filtre sem perdão os que, por oportunismo e marquetagem, se juntam com aqueles que, até ontem, eram seus inimigos mortais. Que o povo não substitua a mobilização nas ruas pelo atalho enganoso das urnas. Tá bom, tá bom, sei que Papai Noel não existe, mas tenho direito a um pouquinho de esperança.
 
MANDELA E GIAP
Em 2013, morreram dois grandes personagens do século vinte. Nelson Mandela, importante liderança do Congresso Nacional Africano, teve papel destacado na superação do apartheid sul-africano.
Não foi, entretanto, como fizeram supor as marotas interpretações da grande mídia internacional, responsável solitário pela derrota do regime abominável dos africaners. Sem a organização, a elaboração teórica e a construção estratégica do CNA, Mandela não teria existido.
A vitória foi coletiva, tem muitos nomes e sobrenomes, muitos tombados pela mesma causa. O enterro de Mandela foi acompanhado por dezenas de autoridades mundiais.
 
Quanta hipocrisia ! Muitas dessas autoridades representavam governos que apoiaram, aberta ou camufladamente, o supremacismo branco. Montou-se uma comoção que estranhei, na medida em que o projeto do CNA nada tem a ver com os interesses do capital financeiro e da reprodução do grande capital. Remédio veneno ? Excesso de imagens, anestesia da razão.
 
Enquanto Mandela recebia justas e amplas homenagens, outro imenso personagem mereceu pouco mais do que pé de página. Ao morrer, aos 102 anos, o general Vo Nguyen Giap, o camarada Van, deixou uma biografia libertária poucas vezes igualada. Sua estratégia político-militar derrotou o exército imperial japonês, o exército colonial francês e as forças armadas imperialistas norte-americanas. Ajudou a consolidar a independência do Vietnã, despertando enorme entusiasmo nas forças democráticas e progressistas de todo o mundo.
 
Viveu e morreu modestamente, afirmando sempre que o verdadeiro general era o povo vietnamita. A imprensa não gastou muita tinta, nem muitos bytes, para registrar a morte deste pequeno gigante. Não se formaram filas de mandatários de outros países em frente ao seu caixão. Sintomaticamente, as homenagens ficaram por conta do vietnamita comum, consciente da grandeza de um de seus filhos mais dedicados e obstinados.
 
BOM SENSO F. C.
Gostaria que, em 2014, o Bom Senso F. C. nascesse de verdade. Que o batismo coincidisse com a Copa do Mundo, que desencadeará o velho provincianismo, as patriotadas midiáticas, o oportunismo político dos que surfarão na trajetória da seleção brasileira. Bem que o Bom Senso poderia mostrar o lado B de todo o previsível ufanismo. Ganhos bilionários dos meios de comunicação (sem qualquer vantagem esportiva), gastos públicos duvidosos em “arenas” destinadas ao nada, privatização do direito de torcer (quem poderá pagar os preços astronômicos dos ingressos ?).
 
Que surjam lideranças sólidas no movimento, preocupadas em educar as categorias de base, criar canais de comunicação com as massas, aprender formas de luta com outras categorias de trabalhadores, interagir com elas. Que floresçam mil Obdúlios Varelas !
 
Que nos preparemos para construir bunkers e abrigos de todos os tipos ! As astrólogas Maria Eugênia Castro e Maína Mello preveem um 2014 tenso. Mercúrio vai andar para trás três vezes (?), e, pelo que leio, isso não é nada bom. Vamos ter problemas de comunicação, trânsito e até de vendas de ingressos para a Copa. Nada a ver com o caos das grandes cidades brasileiras, a incompetência para organizar eventos de grande porte.
A questão tem a ver com um planetinha que está a uma distância média de 100 milhões de quilômetros da Terra. Dona Maria Eugênia garante que a presidente Dilma terá um ano de intenso stress. Por causa das eleições ? Nada disso. Júpiter e Marte estarão numa posição desfavorável.
Os crentes em anjinhos, duendes, gnomos, feiticeiras e almas penadas estão em estado de alerta. Ponhamos, pois, nossas barbas de molho.
 
HOMOFOBIA
Que a homofobia regrida sem precisar da blitzkrieg midiática da Daniela Mercury, séria candidata a Mala do Ano no hilário concurso do Artur Xexeo. Nessa questão, há um equilibro delicado entre o público e o privado, que a cantora baiana faz questão de ignorar.
 
Que dona Marta Suplicy encontre, finalmente, um lugar para chamar de seu. Um dia é ministra “relaxa e goza” do Turismo, no outro, da Cultura (confundindo alta costura com alta cultura), hoje se especula que vai para a Educação. Deve ser dura essa vida peregrina. Boa sorte e feliz aterrissagem, onde quer que ela aconteça. Tanto faz. Fique tranquila, somos nós que pagamos o voo.
 
De resto, um feliz 2014, com mais Beethoven e menos Fiuk, mais Antônio Nóbrega e menos duplas sertanejas, mais encontros e menos Rivotril, mais silêncio e menos pressa, mais livros e menos Google, mais contemplação e menos aflição.
 
(artigo enviado por Mário Assis)
 
31 de dezembro de 2013
Jacques Gruman

QUANDO O HUMOR DESENHA A REALIDADE


 
 
31 de dezembro de 2013


DESDE O FUNDO DO POÇO A UMA VIDA PLENA DE GRAÇA

Senhor pastor:

Houve época em que cri em um deus onipotente e salvador e muitas vezes a ele orei por minha salvação, pela salvação de meus próximos e mesmo da humanidade. Foram meus dias de adolescência, pastor. Justo naqueles dias, fui assaltado pelo clamor, não dos povos – como fala o Livro – mas pelo clamor da carne, clamor tirano, imperioso e impossível de ser domado. Por melhores propósitos que fizesse, acabava dominado pelos ditos prazeres da carne. Dizem que a carne é fraca, pastor. Nada disso, a carne é forte. Fraco é o espírito, que sempre acaba cedendo à carne.

Entrava em pânico, via à minha frente as chamas eternas do Hades, onde tudo é choro e ranger de dentes. Me sentia condenado ao convívio com demônios. Arrependia-me, fazia atos de contrição, confessava meus pecados a sacerdotes e recebia a absolvição. Por um dia ou dois, conseguia viver sem pavores. Mas não mais que um dia ou dois. No terceiro, eu já estava pecando de novo. As noites de tempestade eram noites de pavor. Talvez fosse megalomania. Mas cada raio que caía, eu sentia que era dirigido a mim.

Eu era pobre, pastor. Filho de camponeses, nunca tive facilidades em minha infância. Muito menos na adolescência. Fiz minhas universidades mal tendo dinheiro para o restaurante universitário. Vivi em repúblicas abomináveis, pequenos apartamentos, sem grana suficiente para tomar um vinho decente. A bebida mais ao alcance de minha boca era a mais barata, a cachaça. Ainda adolescente, tomei grandes porres de cachaça. Naqueles dias de pouca grana, bebia muito e bebia mal. Em minha juventude, pastor, eu estava no fundo do poço. O senhor Jesuis era um encosto em minha vida, despacho de catimbó feito a Exu, praga rogada por urubu para infernar meus dias.

Foi quando então, pastor, durante três dias e três noites, li atentamente a Bíblia. Foram dias em que quase não comi. À noite, pegava um cavalo em pêlo, sem freio nem buçal, e saía a galopar nas madrugadas, olhando o céu estrelado e esperando ouvir daquele universo magnífico alguma resposta. Não ouvi nada, pastor. Foram três dias e três noites decisivas em minha vida. A partir da leitura do Livro, tornei-me ateu. Aquele deus proposto pelas Escrituras, que se pretendia criador daquele firmamento esplêndido e cravejado de estrelas, que só vemos na pampa ou no deserto, sempre longe das cidades, não me convencia. Aquele deus matava e exterminava, mandava matar e exterminar. Não me servia.

Disse então a mim mesmo: sai de mim, Coisa Ruim! Me larga, ó Espírito Castrador, sai de minha vida, ó Supremo Estraga-prazeres! Desapareçam de minha vida vocês três, o Pai, o Filho e o Paráclito. E a Mãe também, antes que me esqueça. E todos os santos do céu e todos os padres de todas as igrejas. Xô, Espírito Imundo, xô, Assassino de Povos. Ouste, Pai das Doenças e Exterminador de Nações. Rua de minha alma, ó velho Deus castrado!

Então, pastor, tudo mudou em minha vida. Saí do fundo do poço, rumo à luz do bocal. Mulheres começaram a cair-me dos céus, justo daqueles céus mudos aos quais eu pedia perdão por meus pecados. Como perdera a noção de pecado, nunca mais pequei. Tornei-me um santo homem e procurei imitar os bíblicos patriarcas. Curti plenamente os prazeres que tanto apraziam ao rei Davi, ao rei Salomão, à Sulamita. Verdade que nunca consegui sustentar setecentas mulheres e trezentas concubinas. Mas fiz o que estava a meu modesto alcance.

Por mais de quarenta anos, as mulheres me caíram nos braços como o maná caiu do alto por quarenta anos para saciar a fome do Povo Eleito. Comecei minha vida afetiva com duas, às quais muito amei. Por circunstâncias dos dias, perdi uma. Vivi quatro décadas de muito carinho e cumplicidades com a segunda. Fui feliz em meu casamento. Divórcios, separações, o espírito do ciúmes, amargura, traições, nunca rondaram minha existência.

Quando minha amada partiu, não acusei deus algum, afinal não acreditava em nenhum. Estas duas primeiras amadas logo se multiplicaram por dois, cinco, dez, vinte, cinqüenta. Não saberia dizer quantas, nunca contei. Mas digamos que a metade da “listina” de Leporello. Corri atrás delas com a hybris de um fauno grego, para compensar os dias de vacas magras e sem leite de minha juventude. Após deixar de crer no tal de deus, minha vida foi uma profusão de prazeres. Corri nu atrás de valquírias nuas pelos bosques de Estocolmo, em plena luz da meia-noite. Isto, pastor, teu deus não confere aos mortais, exceto se forem majestades apaniguadas pelo Senhor. Isto é ventura só concedida pelos deuses lúbricos do Valhala. Tack tack, Odin!

Uma vez descrente, apesar de pobre consegui educar-me. Fiz duas faculdades, três pós-graduações no Exterior, viajei por todos os países da Europa, por mais alguns do Leste europeu, pela África, Estados Unidos, Canadá e América Latina. Nasci nos peraus do Upamaruty, em um rancho de pau-a-pique e fiz doutorado em Paris. Consegui escapar de meu pequeno mundinho e sai a navegar pela vastidão do anecúmeno. Au bord’elle, la Seine, conheci uma peoniana adorável, a quem dediquei minha tese. Havia também Úrsula, uma polonesa, que me sussurrava: “mon ours tropical”. Música para meus ouvidos.

Não cheguei a amar a filha de Faraó, muito menos moabitas, amonitas, edomitas, sidônias e hetéias, como o sábio rei Salomão. Mas tive namoradas lindas em várias cidades do mundo. Desde suecas a francesas. Desde macedônias até mesmo a turcomenas e usbeques, passando por polonesas e russas. Adorei a turcomena. Era de Achkhabad, palavra que soava deliciosamente à minha fome de exotismo. Uma vez ateu, fascinou-me a idéia de ouvir mulheres gemendo em línguas que desconheço. E as ouvi. Paris sempre foi pródiga em estrangeiras de todos azimutes e não recusei o que a cidade generosamente me oferecia. Tive do bom e do melhor, como dizem suas ovelhas, senhor pastor. Mas só depois que deixei de crer.

Ateu, fui abençoado com dinheiro e vida confortável. De camponês tosco, tive acesso a línguas, à filosofia, à literatura, à música erudita, a óperas, em suma, ao dito mundo da cultura. De Teixeirinha passei a Mozart, de Luiz Gonzaga a Bizet. Abandonei a cachaça e passei a cultivar bons vinhos e bons uísques. Do mondongo fui promovido ao foie gras, do arroz com feijão às andouilletes. Curti a boa gastronomia da Espanha, França, Itália, Alemanha, Portugal. Percorri as cidades mais esplendorosas do Ocidente. Vivi em três prestigiosas capitais da Europa e em quatro grandes capitais de meu país.

Perambulei por paisagens magníficas, que me fizeram chorar. A beleza extrema sempre me provoca lágrimas. Andei pelo deserto, por oueds, montanhas, dunas, fjords, rias e ventisqueros. Chorei nos Andes, chorei nos Alpes, chorei no Saara, chorei nas costas da Noruega, chorei no Estreito de Magalhães. Chorei também em Santorini. De Madri, saí chorando. Eu estava em uma bodega, tudo era cores, dança, música, canções, madriles lindas, muito vinho, odores de assado bom, os sons rascantes de uma língua que adoro.

Quando me dei conta que, dali a duas horas, estaria voltando ao Brasil, chorei como um terneiro desmamado. Fui chorando até o aeroporto. Não porque estivesse voltando ao Brasil. Mas porque estava abandonando a festa. Dentro de pouco eu estaria voando, espremido num assento apertado, rumo a um país sin flamenco ni cante hondo, sin bailaoras ni cantaores, sin cochinillos ni lechales. Na bodega, continuariam todos cantando e dançando, comendo e bebendo. Muito chorei em minha vida, pastor. Raras vezes de tristeza. O mais das vezes, foi por deslumbramento, perplexidade ante a beleza. Felicidade também nos faz chorar. Choro também com certas árias de Nabucco, Carmen, Don Giovanni, Norma.

Depois que abandonei o tal de Deus, senhor pastor, passei a viajar quase todos os anos à Europa. (Quando nele acreditava, só conseguia ir de Dom Pedrito a Ponche Verde). Fiz pelo menos cinco travessias divinas do Atlântico – com perdão pelo trocadilho – de navio. Sabe, pastor? Aqueles navios cheios de Emmas Bovarys sedentas para conhecer o mundo e experimentar emoções outras que não as medíocres emoções proporcionadas pelo Charles. Vivi grandes momentos, “ao quente arfar das vibrações marinhas”, como canta o poeta. Fiz cruzeiros também divinos pelo Mediterrâneo, pelo Báltico, pelo mar do Norte e pelo mar Negro, pelo Egeu, pelo Adriático e pelos Canales Fueguinos.

Durante pelo menos uns trinta anos, sempre celebrei a bona-chira nos mais antigos e acolhedores restaurantes da Europa, com minha Baixinha adorada. Agora que ela partiu, ora a celebro com minha filha, ora com alguma namorada. E com meus amigos. Bastou-me abandonar Deus, pastor, e minha vida se tornou repleta de bênçãos, que me caíam dos céus em catadupas.

Fui salvo por minha descrença, pastor. Quando cria em Deus, era um adolescente fodido e sem nenhum vintém. Não tinha nem como convidar uma amiga para um bom jantar. Bastou-me deixar de crer e a vida se tornou linda. Cheguei aos sessenta jovem e cultivando minhas antigas amadas. Não tenho carro, nem nacional nem importado, como ostentam vossos crentes, é verdade. Mas isto é opção minha. Com carro não se vai longe. Ora, eu gosto de ir longe.

Sem ser rico, vivo bem. Não tenho contas em vermelho, nem nome sujo na praça, nem problemas na justiça. Jamais fiz empréstimos. Não sei o que seja um cheque sem fundo. Muito menos problemas familiares. Hoje, minhas únicas dívidas são luz, água e condomínio. Vivo em bairro bom, prédio ótimo, apartamento confortável. Ano passado, regalei uma antiga namorada com uma viagem a Paris, Barcelona e Madri. Com uma noite em Bruxelas, só para curtir um café que adoro.

À minha filha – doravante designada Primeira Namorada – dei de presente os fjords noruegueses, o sol da meia-noite, Estocolmo e o arquipélago de Estocolmo e de novo Paris. Na próxima primavera européia, estou combinando um giro pela Itália com uma amiga da Finlândia. No outono, penso partir com a Primeira Namorada rumo a Madri e às ilhas Canárias. Madri porque não concebo ir a Espanha sem visitar Madri. Ilhas Canárias, porque quero passear entre os vulcões de Lanzarote e comer carnes assadas no calor das lavas.

Por vários anos vivi soterrado no fundo do poço. O senhor Jesuis sempre foi um atraso em minha vida. Tudo só se tornou lindo, divino e maravilhoso quando o abandonei. Sei que o senhor pastor, por questões de fé, neste ano que começa, não poderá gozar dos prazeres que gozei e gozarei ainda.

Seja como for, bom 2009, senhor pastor.


31 de dezembro de 2013
janer cristaldo

O DISCURSO OFICIAL E FALACIOSO


O Brasil caminha para uma crise na área econômica com graves reflexos sociais, atingindo principalmente a população que se situa na base da pirâmide. Inflação alta, baixo crescimento em diversos setores da produção industrial e câmbio sem controle, são indicadores de que o quadro pode se agravar sim, com poucas possibilidades de recuperação a curto prazo.
O discurso otimista da presidente Dilma Rousseff pode ser lido mais como um ato pré-eleitoral do que propriamente uma análise sensata das condições adversas que o país atravessa. Observa-se que alguns setores da economia sinalizam com a exigência de um enxugamento dos seus quadros de colaboradores, mediante a utilização de programas de demissões voluntárias. 
 
O ramo automotivo dá sinais claros de que a crise está chegando para valer. O crédito fácil e o incentivo governamental ao consumo gerou uma população endividada, com dificuldades para cumprir compromissos da época da fartura do consumismo exagerado.
 
A alta no custo dos alimentos e dos serviços aceleram o agravamento da crise que se anunciava há três anos. Medidas paliativas não cabem mais nesse processo inflacionário com o fraco desempenho da produção.
 
A fuga de dólares demonstra que os investidores não confiam na política econômica do governo brasileiro. Para se ter uma vaga ideia das atuais condições financeiras da população, o nível de endividamento atingiu 63% das famílias.
Convém salientar que nesses índices não se encontram os endividados informais, aqueles espertos que dão um bordejo no bolso dos pais, apostando que lá na frente serão perdoados da dívida, ou aquele outro tipinho, inescrupuloso, que costuma dar o calote no cunhado endinheirado.
 
E tem mais: as atas do  Banco Central informam que as taxas dos juros continuarão a subir se não houver uma desaceleração do surto inflacionário. Como os números não mentem, a inflação está mais propensa a dar um salto para cima do que desacelerar no próximo ano, período de eleições gerais e de gastos governamentais.
 
Diversos estados da federação estão com problemas seríssimos de caixa, o que leva, nesses casos, os governantes buscarem dinheiro no exterior com taxas de juros desconfortáveis.
 
Nada indica que aqueles que buscam a reeleição puxarão o freio de mão na gastança pública. Ao contrário, a tradição na política brasileira é de que ano eleitoral é ano de abrir os cofres do erário e de endividamento  público. Afinal, a cada ano aumentam os custos de uma eleição. Mas e daí? Não é o contribuinte quem paga?
 
 
31' de dezembro de 2013
Nilson Borges é doutor em Direito e articulista colaborador deste blog.
 

A FALÊNCIA DO CAPIMUNISMO PETRALHA


 
 
A bolsa de valores brasileira com o segundo pior desempenho do ano de 2013, com perdas de US$ 220 bilhões, dá uma contribuição para acabar com o discurso de fim-de-ano ufanista, eleitoreiro e mentiroso da Presidenta da República Capimunista e Sindicalista do Brazil.
Só falta agora a Dilma Rousseff tirar onda porque a Bovespa, pelo menos, ficou à frente da bolsa do Peru, em um universo de 94 bolsas avaliadas no mundo...
 
O que se pode esperar de um País sem governança corporativa em que os corruptos desviam R$ 200 bilhões por ano – segundo dados do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento? O valor jogado fora pelo sistema do Crime Politicamente Organizado superou os R$ 140 milhões gastos em Educação e Saúde. Só falta agora a Dilma, cinicamente, reclamar que a ONU é a promotora da guerra psicológica contra nossa economia...
 
Outro número que confirma a falência conceitual do sistema econômico brasileiro, que pode ser mais bem definido como um Capimunismo (combinação de capitalismo de Estado com pretensas práticas socialistas-comunistas).
Além de praticar uma carga tributária superior a 40% contra a maioria dos contribuintes, via Super Receita Federal, em 2013, o governo petralha concedeu R$ 274 bilhões em desonerações tributárias e subsídios aos empresários aliados – que, geralmente, devolvem parte da grana na campanha eleitoral ou no formato de mensalões por debaixo dos panos.
 
Em 2014, segundo cálculos do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas, o governo deixará de arrecadar R$ 323,17 bilhões com os favores aos parceiros... Assim, para bater os seguidos recordes de arrecadação, o dinheiro que concede com uma mão precisará ser tungado, da sociedade, pela outra mão grande que cobra impostos... Por isso, a tão falada reforma tributária nunca entra na agenda do governo que gasta, desperdiça e rouba cada vez mais.
 
O valor torrado pela corrupção e pelas benesses capimunistas (cuja soma chega a absurdos R$ 500 bilhões) pelo menos é bem superior a um outro número hipoteticamente calculado. Se o governo fosse obrigado a pagar a tabela publicitária comercial pelos sete pronunciamentos em cadeia de rádio e televisão deste ano que se vai, a conta seria de R$ 175 milhões. Desde o início do governo – segundo contas do site Coturno Noturno -, Dilma já fez 17 aparições chapa-branca em RTV, o que consumiria R$ 425 milhões. Pelo menos, tal valor não saiu dos cofres públicos...
 
Mas quem quiser ficar PT da vida com dinheiro jogado fora em propaganda, basta ver quanto o governo torrou na mídia, em 2011, via agências de publicidade, segundo dados oficiais da própria Secretaria de Comunicação da Presidência da República: nada menos que R$ 1.647.952.575,64. O relatório pode ser conferido pelo link:  http://pt.slideshare.net/arykara7002/dados-iap-2011
Existem muitos outros números para demonstrar a incomPTência do governo Dilma-Lula. Mas ano está acabando... Logo mais, todo mundo vai celebrar mera mudança no calendário gregoriano... Enquanto isso, muitos nem vão lembrar que o desgoverno do PT já acabou com o Brasil...
 
Por isso, a única mudança concreta para 2014 é a ironizada na foto abaixo...


Liberdade Total


Digitando...


Vida que segue... Ave atque Vale! Fiquem com Deus.

31 de dezembro de 2013
Jorge Serrão é Jornalista, Radialista, Publicitário e Professor.

LUTADORES E PROSTITUTAS

SÃO PAULO - O que lutadores de MMA e prostitutas têm em comum? Ambas as categorias se tornaram alvo de gente que acha que sabe melhor do que os próprios envolvidos como eles devem viver suas vidas.

No Brasil, o terrível acidente com Anderson Silva inflou o coro dos que querem negar ao MMA o estatuto de esporte e até o dos que pretendem proibir a transmissão de lutas pela TV. Enquanto isso, na França, berço das liberdades individuais, o governo flerta com a ideia de tornar ilegal comprar os serviços de uma prostituta, mas não vendê-los. Segue os passos dos suecos, que adotaram medida semelhante. Não chega a ser a proibição da profissão mais antiga do mundo --a única sociedade industrializada que foi tão longe são os EUA--, mas configura um forte golpe contra as profissionais do sexo.

A lógica que alimenta esses raciocínios é a mesma: tanto os lutadores como as meretrizes são vítimas da sociedade. Trata-se, afinal, de pessoas oriundas de classes desfavorecidas que, por não ter como resistir às pressões econômicas, acabam concordando em fazer aquilo que não fariam se tivessem escolha.

Em muitos casos, mulheres caem na vida por falta de opção, não por entusiasmo com a carreira. Creio que isso é mais raro no MMA, mas admitamos que isso possa ocorrer. O problema com esse argumento é que ele é forte demais. Se generalizarmos o raciocínio, teríamos de proibir outras profissões pouco nobres, como a de limpa-fossas, que só existem porque algumas pessoas têm poucas escolhas. Ao fim e ao cabo, teríamos de, como Karl Marx, condenar todo trabalho assalariado não criativo.

No mais, não estou tão certo de que não haja lutadores e prostitutas que gostem do que fazem ou, ao menos, achem que a relação custo-benefício lhes é favorável. Para afirmar o contrário, seria necessário impor a todos um conjunto de valores morais inegociáveis, o que seria algo bem estúpido de fazer.

SEGURANÇA E PRIVACIDADE


As pessoas que nascem hoje viverão em um mundo com muito pouca privacidade, alertou Edward Snowden. Norte-americano com asilo provisório na Rússia, ele gravou uma mensagem em vídeo televisionada pelo Channel Four, da Inglaterra, na mesma hora em que a rainha Elizabeth aparecia na BBC desejando aos súditos um feliz Natal.
Snowden sabe do que fala. Ajudou a monitorar o mundo todo como funcionário terceirizado a serviço da espionagem norte-americana. Depois denunciou o esquema e escondeu-se. Agora, sentindo-se cansado e inseguro na Rússia de Vladimir Putin, quer vir para o Brasil.

O monitoramento é realmente preocupante. Mas também é poderoso instrumento de segurança. Como toda arma, pode ser usado para o bem e para o mal. Certamente precisamos estar vigilantes e limitar o poder do Estado, além de coibir as ações de bisbilhoteiros privados. Mas não se deve fazer isso deixando de lado o que deve ser observado. Do contrário, corremos o risco de sofrer as desvantagens da tecnologia sem aproveitar o que ela tem de bom.

Isso não envolve apenas a internet e as ligações telefônicas. Tome-se o caso das câmeras de segurança. Um grupo de moradores da Asa Sul tentou colocá-las na quadra, mas foi impedido exatamente sob a alegação do prejuízo à privacidade. A preocupação é razoável. Então por que o próprio governo não instala os aparelhos?

Mas não basta a tecnologia. É preciso também gente qualificada por trás dela. O episódio da pichação da estátua de Drummond no Rio, na noite de Natal, deixou isso claro. Se a imagem estava disponível às autoridades, era de esperar que a polícia chegasse correndo para pegar os criminosos. Com monitoramento eletrônico e agilidade, não é preciso um policial em cada esquina.

Podemos sonhar, por exemplo, com segurança permanente nas passagens sob o Eixão. Liberdade de ir e vir a qualquer hora e o fim dos atropelamentos. Seria possível também, entre outras coisas, coibir o estacionamento irregular nas ruas de Brasília, que tanto risco traz ao fazer com que os motoristas tenham pouca visibilidade nos cruzamentos, ou tenham de trafegar pela contramão.

Por ora, porém, as câmeras registram só quem dirige em alta velocidade ou passa no sinal vermelho. Algo necessário, mas insuficiente. E que, ainda por cima, desmoraliza o Estado ao sugerir que só lhe interessa o que lhe proporciona boa arrecadação com multas - sem dar muito trabalho.
31 de dezembro de 2013
Paulo Silva Pinto, Correio Braziliense

PARTIDOS POLÍTICOS E ESTADO


 
Em dezembro de 2012 anotei aqui mesmo, neste espaço de O Estado de S. Paulo, que qualquer insurgência contra a face do Estado que o Supremo Tribunal Federal é afrontaria a ordem e a paz sociais, prenunciaria vocação de autoritarismo, questionaria a democracia. Pretenderia golpeá-la. Por isso - escrevi - é necessário afirmarmos, em alto e bom som, o quanto de respeito e acatamento devemos ao Poder Judiciário e em especial, hoje e sempre, ao Supremo Tribunal Federal. Quem o agride investe contra as instituições democráticas, afronta a Constituição (O STF e a República, 8/12, A2).

Diz a Constituição, em seu artigo 17, ser livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos. Desde que resguardados, contudo, a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo, os direitos fundamentais da pessoa humana.

Observar o regime democrático, um dos traços que alinham horizontes no dinamismo dos partidos políticos, reclama a observância, entre outros parâmetros, do quanto os romanos prescreviam ao afirmar a regra do honeste vivere.

Viver honestamente, mandamento que alguns não observaram. Aqueles referidos como "companheiros injustiçados" em congresso do Partido dos Trabalhadores, aos quais se hipotecou solidariedade.

Quem concluiu que alguns descumpriram o dever de viver honestamente - e concluiu na e pela sua voz enquanto uma de suas porções, o Supremo Tribunal Federal - foi o Estado. Quem o afirmou, no processo judicial conhecido como "mensalão", foi o Estado brasileiro. Pois a autoridade do Estado é uma totalidade indivisível, sua organização em funções - legislativa, executiva e jurisdicional - prestando-se unicamente a aprimorar seu funcionamento.

Não há ideias novas em matéria de política e direito. Qualquer uma delas, podemos descontraidamente sustentar, já há de ter sido enunciada, in illo tempore, por um grego ou um romano. A afirmação da existência de três partes nos governos vem de Aristóteles, na Política. Quando essas partes estiverem em bom estado, a Constituição estará, também, em bom estado. E as Constituições distinguem-se umas das outras, prossegue Aristóteles, segundo a forma de organização e composição dessas partes. A terceira delas faz justiça. Bom estado significa, no contexto da exposição aristotélica, bem ordenadas. O sentido do estarem em bom estado essas três partes pode ser encontrado, na Ética a Nicômaco, na ideia de composição, justa medida, virtude no valor médio. Aristóteles está imediatamente atento, hoje diremos, às funções legislativa, executiva e jurisdicional do Estado.

Por isso causa espanto e estupor, horroriza mesmo o fato de um partido político, reunido em congresso nacional, desagravar "companheiros injustiçados", inusitada e desabridamente afrontando o Estado. O que vimos foi um partido político investindo não contra outro partido político (por isso são "partidos"), porém contra o próprio Estado. Contra o bom funcionamento do Estado, em benefício do qual deveriam concorrer.

Pois a auctoritas do Estado, digo-o outra vez, é uma totalidade indivisível. Isso desejo repetir, visto que os amigos do alheio, os que descumprem a regra do honeste vivere, pretendem ocultá-lo, supondo-se capazes de tapar o sol com peneira.

O mais grave está em que essa agressão ao Estado - insista-se neste ponto: o Judiciário é uma face do Estado -, isto é, o mais grave é a circunstância de tal agressão ter sido perpetrada em presença do anterior presidente da República e de quem lhe sucedeu, sem que, ao que consta, nenhum deles se tenha oposto a essa desmedida afronta à própria soberania e ao regime democrático.

O que se pretende? Viver honestamente, dever do cidadão, é regra que vincula não apenas cada um, individualmente, mas também os que institucionalmente representam grupos em que se compõem. Ou acaso supõem, os que falam por esse ou aquele partido, não ser vinculados pelas regras que prescrevem a honestidade? Que loucura é essa que autoriza aos partidários dos condenados pelo Estado enquanto Poder Judiciário investir contra quem os condenou, o próprio Estado?

O homem, disse Paulo Mendes Campos, um dos nossos poetas de verdade, é um gesto que se faz - ou não se faz. A liberdade consiste em afirmarmos o que os do nosso tempo denominam Estado de Direito. Defendê-lo, eis o gesto que incumbe aos homens corretos. O Estado de Direito, ainda que apenas formal, em sua expressão possível no modo de produção social que praticamos, será mera ficção se não nos curvarmos ao quanto o chamado Poder Judiciário decide em sua derradeira instância, soberanamente. Qual decidiu o Estado brasileiro em sua face judicial, na expressão do Supremo Tribunal Federal. Negá-lo, isso é inconcebível se não pretender, quem o negue, subverter a ordem e apropriar-se da res publica. Em termos bem claros, recorrer a uma ditadura excludente da moralidade.

O que na ponta da linha aterroriza, além de horrorizar, é o fato de o pretexto da defesa dos interesses dos humildes prestar-se à apropriação mensaleira. Quem diz que é assim é o Estado brasileiro, por quem representa um dos seus três Poderes, o Judiciário. Tristes tempos. Tempos que prenunciam, no silêncio incontido dos que consentem com afrontas à soberania e ao regime democrático, a volta ao passado.

Há 50 anos, o pretexto da defesa da democracia justificou violência em nome da defesa das liberdades. Temo, de repente - não mais que de repente, qual diria Vinicius -, que a História se repita não como tragédia, mas como farsa. Desta feita a pretexto, desgraçadamente - embora justificável -, da defesa da moralidade. É inconcebível que um partido político pregue escancaradamente, em benefício de condenados pelo Supremo Tribunal Federal, a desobediência ao Estado.
 
31 de dezembro de 2013
Eros Roberto Grau, Estado de São Paulo

RASCUNHO PARA 2014

O ano de 2013 foi muito bom. Muito didático. Aprendemos a ver as coisas pelo lado torto. Ótimo, pois nossa verdade está no avesso. Aprendemos que corrupção no Brasil não é apenas endêmica; é eterna. Ela está encravada na alma de nossos políticos. Corrupção é vida. Foi através dela que construímos esse país, no adultério entre o público e o privado ou entre o "púbico e a privada". Daí nasceu nosso mundo: estradas rotas, a espantosa construção de Brasília, onde já gastamos trilhões de dólares com passagens aéreas para homens irem ao Planalto implantar perucas ou visitar as amantes e casas de mães joanas.

Aprendemos que apenas 30% da população é realmente alfabetizada. O resto é analfabeto funcional que assina o nome, mas não sabe mais nada. E isso é bom para eleições, pois um povo ignorante é ótimo para eleger canalhas.

No entanto, tudo tem um lado bom, nossa estupidez estimula uma criatividade cultural de axés e garrafinhas, aumenta a fé com milhões de novos evangélicos dando dinheiro para pregadores traficantes, estimula a boçalidade combativa, como as emocionantes batalhas entre torcidas, shows de MMA espontâneos nas arquibancadas. Estupidez é entretenimento. O País já virou novela de suspense. É uma escola. Com a prisão dos mensaleiros, enxergamos que nosso sistema penitenciário é o inferno vivo. Estupradores, chacinadores protestam contra o conforto dos petistas. Finalmente, Zé Dirceu conheceu a luta de classes e foi-nos útil: iluminou-nos sobre o sistema carcerário.

Vimos como a escrotidão e o idealismo são primos. Neste ano aprendemos, por exemplo, que não existe primavera, nem árabe nem brasileira. E isso é mais realista. Chefes de Estado preferem secretamente que o Assad ganhe a guerra contra a Al-Qaeda que já tomou conta. Menos esperança, mais sabedoria. O mundo ganhou um pessimismo iluminado. Graças ao bravo 'nerd' Snowden, que revitalizou o Putin da Rússia, o líder da moda que protege a destruição da Síria, prejudicou o Obama e abriu portas para novos ataques do terror. Ou seja, aprendemos que tudo se ramifica em contradições inesperadas, que um bem pode virar um mal e um 'hacker' babaca pode mudar o mundo.

Já sabemos que milagres acontecem, mas são logo destruídos. Milhões se ergueram em junho numa aurora política aparente, mais uma 'primavera'; no entanto, os black blocs, espécie de Al-Qaeda punk de imbecis, vieram nos lembrar da realidade: estupidez e mediocridade política são a clássica realidade brasileira. Enquanto Sarney reina, Agnello Queiroz se agarra no Lula e Jacques Wagner destrói a Bahia, já sabemos que os horrorizados cariocas, chocados com o grande "crime" do helicóptero do Cabral vão eleger a nova catástrofe: nosso Estado governado ou pelo Garotinho, Crivella ou Lindinho. Será o fim do Estado do Rio, durante a olimpíada. Vivam os cariocas, as bestas quadradas do apocalipse! Pedem para ser mortos duas vezes.

Já sabemos também que "a infraestrutura sórdida do País foi culpa dos governos anteriores". Ao menos foi o que disse a Dilma diante de FHC e do Clinton (que vexame...) depois de 11 anos do PT no poder. Só não sabemos o que o PT fez em 11 anos, mas isso é curiosidade de neoliberais canalhas, o que será corrigido com a reeleição de Dilma, quando teremos uma regulamentação bolivariana nessa mídia conservadora que teima em estragar os prazeres da mentira. Finalmente entendemos que quem fez o Plano Real não foi o FHC, como afirma a mídia de direita; foi o Lula, com preciosa ajuda de Mantega.

Já entendemos que a Dilma é brizolista. Também já sabemos que o Brasil anda na contramão dos próprios velhos países socialistas como China e Vietnã. Como escreveu Baudrillard: "O comunismo hoje desintegrado tornou-se viral, capaz de contaminar o mundo inteiro, não através da ideologia nem do seu modelo de funcionamento, mas através do seu modelo de desfuncionamento e da desestruturação brutal", vide o novo eixo do mal da A.Latina. Nós somos um bom exemplo desconstrutivo do que era o comunismo.

Já sabemos que privatização se chama hoje concessão, que lucro ainda é crime e que aos poucos os empreendedores que fizeram o País, antes do PT existir, são aceitos ainda com relutância pelos donos do poder.

Já sabemos que nosso ministro da economia é a própria Dilma, pois o Mantega só está lá porque ela manda nele. Por que não bota o Delfim, ou o Palocci que já salvou o Brasil uma vez? Ele é um dos petistas respeitáveis. O outro morreu há pouco - Marcelo Déda, raridade, inteligente, com senso de humor e do bem.

Neste ano, aprendemos: a justiça não anda sozinha. Se não fossem dois grandes homens, Ayres Brito e Joaquim Barbosa, nada teria acontecido. Aprendemos que o Mercosul tem de acabar. Aprendemos que o legislativo só funciona no tranco de ameaças do povo. Agora já perderam o medo de novo.

Já sabemos que a política tem sido um espetáculo, como um balé. No Brasil, a política já é um país dentro de outro, com leis próprias, ética própria a que assistimos, impotentes. Os fatos perderam a solidez - só temos expectativas. E tudo continuará. Saberemos no ano que vem quantos campos de futebol de floresta foram destruídos por mês nas queimadas da Amazônia, enquanto ecochatos correm nus na Europa, fazendo ridículos protestos contra o efeito estufa; saberemos quantos foram assassinados por dia, com secretários de segurança falando em "forças-tarefa" diante de presídios que nem conseguem bloquear celulares, continuaremos a ouvir vagabundos inúteis falando em "utopias", bispos dizendo bobagens sobre economia, acadêmicos decepcionados com os 'cumpanheiros' sindicalistas, enquanto a República continuará a ser tratada no passado, com as nostalgias masoquistas de tortura, ressurreição de Jango e JK, heranças malditas, ossadas do Araguaia e nenhuma reforma no Estado paralítico e patrimonialista. Não vivemos diante de "acontecimentos", mas só de "não acontecimentos".

Repito a piada: não sou pessimista; sou um otimista bem informado.

Continuaremos a não acontecer em 2014.

 
31 de dezembro de 2013
Arnaldo Jabor, O Estado de S. Paulo

CONTANDO COM A SORTE

Aí vamos nós, de novo sozinhos, para atravessar mais um ano. Em 2014, como em 2013 e nos anos anteriores, contaremos apenas com nossa própria capacidade de resolver os problemas que nos aparecerem; mais uma vez, será perfeitamente inútil esperar qualquer colaboração da máquina pública, que todos pagam justamente para isto — colaborar, por pouco que seja, para dar à população um grau a mais de conforto nesta vida já tão complicada pela própria natureza.
Muita gente, como sempre, veio prometer ao longo do ano soluções para nossos problemas do presente e anunciar planos para resolver nossos problemas do futuro. Falaram muito; disseram pouco.
Depois, também como sempre, foram sumindo, cada um em seu canto, atrás do que realmente lhes interessa: segurar a fatia do Brasil que já têm.
Não vão mudar de vida só porque 2014 será ano de eleição presidencial e de Copa do Mundo no Brasil; talvez tenham de se esforçar um tanto a mais para manter em cartaz a sua comédia, mas para tudo há um jeito.
Vão encontrar o seu, como sempre, e acabarão deixando os brasileiros tão abandonados em dezembro de 2014 como estão agora.

Sobram, para qualquer lado que se olhe, avisos claríssimos de que o ano novo promete ser igual ao ano velho — já nem se tenta disfarçar o pouco-caso com que os donos do país tratam o brasileiro comum e que aumenta a cada pesquisa de opinião garantindo que a presidente da República está a caminho dos 101% de popularidade.

Há o caso do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, que encerrou 2013 com um espetáculo realmente esquisito: foi brigar na Justiça com os cidadãos da própria cidade que dirige (e que lhe pagam o salário), para socar um aumento de até 35% em 85% dos contribuintes de um dos impostos municipais.
Houve, nas alturas extremas onde vivem a presidente Dilma Rousseff, seu ministro da Fazenda e outras imensas autoridades federais, um surto de decisões desconexas sobre a possibilidade de retirar os airbags e freios ABS dos novos modelos de carro a ser fabricados, numa tentativa desesperada de impedir que subam de preço.
Tira, põe, deixa ficar — a impressão que sobrou é que os decisores não sabiam realmente do que estavam falando, e acabaram perdidos de novo no nevoeiro mental em que vivem. Há ainda outros tumultos saídos da mesma pipa, mas parece que o mais instrutivo deles é a compra de 36 aviões-caça da Suécia, os Saab Gripen NG, que estaremos pagando ao longo dos próximos anos para defender o nosso espaço aéreo de seus possíveis inimigos.

Tudo indica que em nenhum momento uma autoridade do governo pensou que a população deste país tivesse alguma coisa a ver com isso. Para começar, nenhum brasileiro jamais sentiu a falta de 36 caças suecos para resolver algum problema real em sua vida, ou na defesa do seu país.

O cidadão poderia achar estranho, também, que o modelo escolhido tenha o inconveniente de ainda não existir; é o mais barato, mas só a partir de agora começará a ser desenvolvido, para entrega final até 2023.
Até lá, esperemos continuar com a sorte, que nos acompanha desde Santos Dumont, de não sofrer nenhum ataque aéreo contra o nosso território. Além disso, o governo levou doze anos inteiros para decidir qual modelo compraria — basicamente, o americano F-18, o francês Rafale e esse sueco. Doze anos?

Como o Brasil jamais foi acusado de ser um país que pensa demais, ou tem a reputação de só decidir alguma coisa depois de ter 100% de certeza na correção do que está fazendo (não consegue se entender nem sobre os tais equipamentos de segurança), o motivo da demora só pode ser do mal. Pois ou a compra é necessária, e aí o cidadão brasileiro não pode ficar esperando doze anos por uma decisão, ou não é — e aí o mesmo cidadão não tem nada de pôr a mão no bolso para pagar a conta.
Mas ninguém no governo sequer se lembrou de que ele existe. Toda essa história teve a ver apenas com uma questão pessoal do ex-presidente Lula, primeiro, e da presidente Dilma Rousseff, depois.
Lula queria o modelo francês de todo jeito; jurava que era o melhor, embora fosse o mais caro. Mas a França não deu apoio a um disparate qualquer que ele propôs na diplomacia mundial; o homem emburrou e nunca mais quis ouvir falar dos Rafale, que até então achava o máximo.
Dilma se inclinou para o F-18 dos Estados Unidos, mas ele subitamente deixou de ser o melhor quando a presidente se ofendeu com o delírio americano de espionar tudo o que existe sobre a face da Terra. Qual é o critério da escolha? Qualidade ou birra? Sorte dos suecos.

O TAMPINHA E O PAU-BRASIL


O MEU 2013


 
31 de dezembro de 2013
João Pereira Coutinho, Folha de SP

ECONOMISTAS CRITICAM DISCURSO DA "RAINHA DA SUÉCIA"


 
Aécio Neves (PSDB-MG) foi o primeiro a criticar o discurso de autoelogio de Dilma Rousseff, no momento em que o país passa por dramas como as cheias e sérios problemas econômicos. Os economistas fizeram coro e dizem que faltou auto-crítica no discurso da presidente. Veja abaixo matéria de O Globo.
 
Economistas viram o pronunciamento da presidente Dilma Rousseff com ceticismo e pouco efeito prático sobre a retomada do investimento. As críticas giraram em torno da fala de Dilma sobre a razão para a falta de confiança de empresários, atribuída pela presidente a uma "guerra psicológica".
 
Para o economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central (BC), o governo mostra resistência em perceber que é o causador da falta de confiança por empresários, fruto, segundo ele, da piora do desempenho fiscal, da manutenção da inflação em patamar alto e das frequentes mudanças de regras.  - Se há uma guerra psicológica, foi o governo quem a começou - diz Schwartsman.
 
O economista e professor da UFRJ Luiz Carlos Prado adota um tom mais moderado, mas também enxerga problemas:  - Existe um debate em relação às estratégias econômicas do governo, que deve se acirrar em 2014, que é um ano eleitoral. A gestão da economia do governo nos últimos dois anos teve problemas, como ocorreu na ênfase dada ao consumo e que foi criticada por pessoas de diversos vieses econômicos.
 
Segundo o diretor de pesquisa econômica para América Latina do banco americano Goldman Sachs, Alberto Ramos, a maior crítica dos agentes econômicos se dá em relação ao modelo econômico adotado ao governo e a uma tolerância grande com a inflação. - Com crescimento baixo, inflação alta, câmbio desalinhado e ativismos cambial e fiscal, esse é um quadro que não inspira a confiança do empresário. De onde vem esse negativismo? Dessa realidade. A economia brasileira perdeu competitividade externa e os custos trabalhistas aumentaram. É preciso credibilidade. É preciso um ajuste da política macroeconômica. Um discurso demasiadamente otimista não ajuda a destravar os investimentos. O que ajuda é mostrar isso de maneira crível - afirma.

O economista Silvio Campos Neto, da Tendências Consultoria, vê no discurso de Dilma um recado a economistas que projetam um crescimento baixo para a economia brasileira em 2014, em torno de 2%.
- Não é uma guerra psicológica, mas reação a um ambiente adverso. O que define o interesse da empresa é um horizonte de médio e longo prazo. Quanto maior a imprevisibilidade, maior a tendência de os empresários continuarem contraídos.

A falta de autocrítica também mereceu críticas do professor da UFRJ Reinaldo Gonçalves: - Quando (Dilma) diz que o problema é dos outros e não assume a responsabilidade sobre a piora nas contas externas, as intervenções no câmbio, ela faz um discurso alegórico, que só piora a confiança.

GOVERNO DO PT TRIPLICA PROPAGANDA DAS CASAS DILMA


O Programa Minha Casa, Minha Vida é uma das principais apostas eleitorais da presidente Dilma Rousseff para 2014, dada a escassez de grandes realizações que possam cativar o eleitor e garantir um segundo mandato à petista. O governo aposta tanto na divulgação do programa que, em 2013, despejou uma quantidade desproporcional de recursos apenas para fazer propaganda dele.

 Dados cedidos pela Caixa Econômica Federal a pedido do líder da minoria na Câmara, Nilson Leitão (PSDB-MT), mostram a repentina elevação de gastos com publicidade: em 2011, foram 261 000 reais. No ano seguinte, 1,7 milhão. Em 2013, até o fim de julho, a Caixa já havia destinado 15,7 milhões de reais para divulgar o programa. Mesmo que o banco público não gaste mais um real até o fim do ano para propagandear o programa habitacional, o valor significará um aumento de 823% na comparação com todos os gastos de 2012 – e de 5.900% em relação a 2011.

A Caixa não apresenta uma explicação clara sobre a elevação de gastos. Diz que, no montante, estão ações de esclarecimento aos participantes do programa. "A campanha teve como objetivo de prestar, de forma transparente, orientações aos beneficiários que estavam recebendo as chaves de imóveis do MCMV – tais como a conservação e manutenção da moradia, condições de instalação do sistema elétrico e hidráulico, economia de água e energia, dentre outros pontos importantes", informa nota emitida pela assessoria de imprensa da Caixa Econômica Federal ao site de VEJA.
 
Mas o que se viu nos últimos meses foi uma profusão de peças de publicidade para atrair novos participantes para o programa, estreladas pela atriz Camila Pitanga e a apresentadora Regina Casé. A Caixa, aliás, não revela o preço pago a elas: diz que o cachê é uma informação "estratégica". Somando os governos Lula e Dilma, 1,3 milhão de pessoas obtiveram a casa própria por meio do programa, de um total de 2,9 milhões de adesões. A meta é atingir 3,4 milhões de contratos no fim de 2014.
 
O deputado Nilson Leitão agora vai pedir à Caixa que esclareça se o aumento nos gastos com publicidade foi acompanhado de um crescimento proporcional nos empreendimentos do programa.
A pergunta é meramente retórica, já que a resposta será evidentemente negativa. "É um gasto apenas promocional para o governo; não muda em nada a vida do cidadão", queixa-se o parlamentar.
 
 
A elevação dos gastos com publicidade do Minha Casa, Minha Vida ocorre no momento em que a inadimplência disparou: como mostrou VEJA há um mês, entre as famílias com renda mensal de até 1 600 reais, o índice chega a 20% – número dez vezes maior que a média dos financiamentos imobiliários no país.
 
Cifras – Os gastos gerais do governo com publicidade também subiram. Levantamento feito pela ONG Contas Abertas a pedido do site de VEJA mostra que os valores empenhados chegaram a 177,7 milhões de reais neste ano, comparados com 173 milhões de reais no ano passado inteiro. O cálculo leva em conta dados do Orçamento e exclui as estatais, como a própria Caixa.
 
O aumento ocorre acompanhado de uma nítida mudança na estratégia de comunicação da presidente Dilma Rousseff, já de olho nas eleições de 2014. Dilma abriu uma página no Facebook e passou a usar o Twitter diariamente, além de priorizar eventos que possam garantir exposição positiva nos meios de comunicação.
 
José Matias-Pereira, professor de administração pública da Universidade de Brasília, diz que somente a cobrança da sociedade pode impedir abusos com o uso de verbas públicas para promoção eleitoral. "Nós temos que assumir uma postura mais proativa e agressiva, no bom sentido, para cobrar resultados dos governantes, e não publicidade. Quanto pior o desempenho de um governante, maior a tendência dele de gastar o dinheiro com publicidade", diz. Ele também critica a mistura entre público e privado: "O eleitor está sendo chamado para pagar uma conta que, na verdade, tem por trás dela interesses políticos, de grupo e pessoais".
 
Há outra explicação relevante para a elevação dos gastos já em 2013: pela lei, o governo só pode gastar com publicidade em ano eleitoral aquilo que já havia gasto no ano anterior. Esticar a corda já em 2013 é garantir a possibilidade de gastos maiores no ano que vem.
 
(VEJA)
 
31 de dezembro de 2013
in coroneLeaks

OS DOIS BRASIS, ROSA E NEGRO

Dilma descreve um país que não tem parentesco com o dos executivos, mas ambos podem ter certa razão
 
O Brasil são dois, conforme quem dele fala é a presidente Dilma Rousseff ou os executivos das grandes companhias globais e nacionais.
 
Para Dilma, em sua mensagem de domingo, 2013 termina "melhor do que começou". Na visão dos executivos, ocorre o contrário.
 
Ajuda-memória: pesquisa feita pela PricewaterhouseCoopers e divulgada em Davos, em janeiro, mostrava os executivos brasileiros entre os mais otimistas do planeta. Eram 44% os que confiavam muito no crescimento das receitas de suas companhias, porcentagem de otimistas que só ficava atrás dos executivos russos (66% de otimistas), indianos (63%) e mexicanos (62%).
 
Mas outra pesquisa, a ser divulgada nos próximos dias, vai mostrar que os executivos brasileiros estão batendo recorde de pessimismo com o estado da economia.
 
As pesquisas podem ter sido feitas com públicos nominalmente diferentes, mas ambas estão restritas a um mesmo universo, o das grandes corporações. Compará-las, portanto, não é uma licença poética.
 
Na cabeça da presidente, certamente ficará reforçada a tese de que o governo é vítima de "guerra psicológica". Como sou inimigo número 1 de teorias conspiratórias, prefiro acreditar que os dois Brasis existem de fato, conforme a cor dos óculos que cada um usa para enxergá-lo.
 
Para os executivos, o que ressalta de 2013 é o fim da euforia com os emergentes, percepção baseada em números concretos e não em sensações puramente psicológicas.
 
De fato, acabou o que Sandra Moati, analista do mensário francês "Alternatives Économiques", chamou no número que está nas bancas de "crescimento insolente" dos emergentes. É importante ressaltar que não deixou de haver crescimento; só não é mais "insolente".
 
Números: a China, cuja velocidade de crescimento parecia inoxidável, passou de uma média de 12,1% no período 2004/07, auge do ciclo dos emergentes, para pouco mais da metade (7,3%), na previsão do FMI (Fundo Monetário Internacional) para 2014.
 
O caso do Brasil é parecido, embora com números muito menos "insolentes": os 4,7% de 2004/07 viraram 2,5% para 2014, sempre segundo o FMI (menos ainda, apenas 2,3%, na expectativa do ano que Dilma acha que "terminou melhor do que começou").
 
Volto a Sandra Moati: desde 2011, "o crescimento das economias emergentes não para de se desacelerar, [o que] diz respeito a todas as regiões do mundo, da Ásia em desenvolvimento à América Latina, passando pela Europa Central e Oriental e pelo Oriente Médio, poupando apenas a África".
 
Se há uma "guerra psicológica", ela afeta boa parte do mundo, portanto. Para sorte de Dilma, o que ela não afeta, ao menos por enquanto, é o emprego e o crescimento da renda. O caso do Natal é ilustrativo: as vendas cresceram menos do que nos 11 anos anteriores, mas, de todo modo, cresceram.
 
Se as pessoas compraram mais neste Natal do que no anterior, Dilma também tem razão ao dizer que o ano termina melhor que começou. A ver como será 2014, para o qual desejo ao leitor que seja melhor que 2013 e pior que 2015.
 
31 de dezembro de 2013
Clóvis Rossi, Folha de S. Paulo