"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 31 de dezembro de 2013

OS DOIS BRASIS, ROSA E NEGRO

Dilma descreve um país que não tem parentesco com o dos executivos, mas ambos podem ter certa razão
 
O Brasil são dois, conforme quem dele fala é a presidente Dilma Rousseff ou os executivos das grandes companhias globais e nacionais.
 
Para Dilma, em sua mensagem de domingo, 2013 termina "melhor do que começou". Na visão dos executivos, ocorre o contrário.
 
Ajuda-memória: pesquisa feita pela PricewaterhouseCoopers e divulgada em Davos, em janeiro, mostrava os executivos brasileiros entre os mais otimistas do planeta. Eram 44% os que confiavam muito no crescimento das receitas de suas companhias, porcentagem de otimistas que só ficava atrás dos executivos russos (66% de otimistas), indianos (63%) e mexicanos (62%).
 
Mas outra pesquisa, a ser divulgada nos próximos dias, vai mostrar que os executivos brasileiros estão batendo recorde de pessimismo com o estado da economia.
 
As pesquisas podem ter sido feitas com públicos nominalmente diferentes, mas ambas estão restritas a um mesmo universo, o das grandes corporações. Compará-las, portanto, não é uma licença poética.
 
Na cabeça da presidente, certamente ficará reforçada a tese de que o governo é vítima de "guerra psicológica". Como sou inimigo número 1 de teorias conspiratórias, prefiro acreditar que os dois Brasis existem de fato, conforme a cor dos óculos que cada um usa para enxergá-lo.
 
Para os executivos, o que ressalta de 2013 é o fim da euforia com os emergentes, percepção baseada em números concretos e não em sensações puramente psicológicas.
 
De fato, acabou o que Sandra Moati, analista do mensário francês "Alternatives Économiques", chamou no número que está nas bancas de "crescimento insolente" dos emergentes. É importante ressaltar que não deixou de haver crescimento; só não é mais "insolente".
 
Números: a China, cuja velocidade de crescimento parecia inoxidável, passou de uma média de 12,1% no período 2004/07, auge do ciclo dos emergentes, para pouco mais da metade (7,3%), na previsão do FMI (Fundo Monetário Internacional) para 2014.
 
O caso do Brasil é parecido, embora com números muito menos "insolentes": os 4,7% de 2004/07 viraram 2,5% para 2014, sempre segundo o FMI (menos ainda, apenas 2,3%, na expectativa do ano que Dilma acha que "terminou melhor do que começou").
 
Volto a Sandra Moati: desde 2011, "o crescimento das economias emergentes não para de se desacelerar, [o que] diz respeito a todas as regiões do mundo, da Ásia em desenvolvimento à América Latina, passando pela Europa Central e Oriental e pelo Oriente Médio, poupando apenas a África".
 
Se há uma "guerra psicológica", ela afeta boa parte do mundo, portanto. Para sorte de Dilma, o que ela não afeta, ao menos por enquanto, é o emprego e o crescimento da renda. O caso do Natal é ilustrativo: as vendas cresceram menos do que nos 11 anos anteriores, mas, de todo modo, cresceram.
 
Se as pessoas compraram mais neste Natal do que no anterior, Dilma também tem razão ao dizer que o ano termina melhor que começou. A ver como será 2014, para o qual desejo ao leitor que seja melhor que 2013 e pior que 2015.
 
31 de dezembro de 2013
Clóvis Rossi, Folha de S. Paulo

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