Ainda há quem acredite que, antes da última badalada, a Argentina possa fazer um acordo com os credores que recusaram os termos da renegociação da dívida e, assim, escapar de novo default (calote), que, desta vez, pode ser mais desastroso; Mas essa hipótese é difícil de acontecer, pela camisa de força que o próprio governo argentino se impôs
Ainda há quem acredite que, antes da última badalada, a Argentina possa fazer um acordo com os credores que recusaram os termos da renegociação da dívida e, assim, escapar de novo default (calote), que, desta vez, pode ser mais desastroso. Mas essa hipótese é difícil de acontecer, pela camisa de força que o próprio governo argentino se impôs.
Apenas para quem está chegando agora, nesta quarta-feira, 30 de julho, vence o prazo imposto pelo juiz Thomas Griesa, de Nova York, para que a Argentina pague US$ 1,6 bilhão aos holdouts, os credores que recusaram as condições das renegociações da dívida que começaram em 2005. Correspondem a menos de 7% dos credores. Os demais aceitaram a troca de títulos que impôs perdas de 63% sobre o total devido.
Esses holdouts, que o governo Argentino chama de fundos abutres, recorreram à Justiça para serem pagos pela totalidade da dívida.
A presidente Cristina Kirchner avisou que não há concessão a fazer aos abutres e, nesta segunda-feira, uma nova delegação argentina viajou para Nova York com o recado de que só vai conversar com o mediador, Daniel Pollack, nomeado pelo juiz, e não com os credores.
A restrição original é a de que toda emissão de títulos de dívida deve definir um tribunal para dirimir eventuais conflitos de interesse. Nesse caso, foi acertado que o foro para isso é o de Nova York. Poderia ser outro, como o de Londres, Frankfurt ou de outra capital financeira.
Argumentar que o juiz Griesa, designado para presidir esse processo, violou a soberania do Estado Argentino ou tomou decisões inaceitáveis, implica exigir que a Justiça americana só profira sentenças favoráveis à Argentina e, nesse caso, não seria necessário juiz.
Não há, para casos de dívidas soberanas, nenhum acordo internacional que preveja procedimentos judiciais e critérios de prioridade de pagamento para casos de incapacidade de resgate de títulos, como acontece em casos de falência ou de recuperação judicial de empresas.
O próprio contrato dos títulos da Argentina inclui a cláusula Rufo (Right Upon Future Offers) com validade até 31 de dezembro de 2014. Ela determina que qualquer benefício acertado com uma parcela de devedores deve ser estendido para os demais. Os próprios advogados da Argentina vêm garantindo que não cabe flexibilidade na aplicação dessa cláusula.
Se concordasse em pagar mais aos abutres, como determinou o juiz, a Argentina estaria sujeita a um dilúvio de processos judiciais dos outros credores, que exigiriam igualdade de tratamento. Nesse caso, os termos da renegociação da dívida perderiam validade. Além de problemas com a nova quebra (default), a Argentina teria de enfrentar outro processo de renegociação.
As trancas a um acordo com os abutres não terminam aí. A Lei Ferrolho (Ley Cerrojo), aprovada pelo Congresso argentino, tratou de fechar todas as portas para um entendimento. Impede pagamentos a credores que não aceitassem a reestruturação da dívida. Além disso, o governo argentino está proibido, também por lei, de oferecer quaisquer benefícios não previstos na renegociação anterior.
Essas razões sugerem que não há nem saídas fáceis nem saídas rápidas. Mas ainda não soou a última badalada.
31 de julho de 2014
Celso Ming, O Estadão
Ainda há quem acredite que, antes da última badalada, a Argentina possa fazer um acordo com os credores que recusaram os termos da renegociação da dívida e, assim, escapar de novo default (calote), que, desta vez, pode ser mais desastroso. Mas essa hipótese é difícil de acontecer, pela camisa de força que o próprio governo argentino se impôs.
Apenas para quem está chegando agora, nesta quarta-feira, 30 de julho, vence o prazo imposto pelo juiz Thomas Griesa, de Nova York, para que a Argentina pague US$ 1,6 bilhão aos holdouts, os credores que recusaram as condições das renegociações da dívida que começaram em 2005. Correspondem a menos de 7% dos credores. Os demais aceitaram a troca de títulos que impôs perdas de 63% sobre o total devido.
Esses holdouts, que o governo Argentino chama de fundos abutres, recorreram à Justiça para serem pagos pela totalidade da dívida.
A presidente Cristina Kirchner avisou que não há concessão a fazer aos abutres e, nesta segunda-feira, uma nova delegação argentina viajou para Nova York com o recado de que só vai conversar com o mediador, Daniel Pollack, nomeado pelo juiz, e não com os credores.
A restrição original é a de que toda emissão de títulos de dívida deve definir um tribunal para dirimir eventuais conflitos de interesse. Nesse caso, foi acertado que o foro para isso é o de Nova York. Poderia ser outro, como o de Londres, Frankfurt ou de outra capital financeira.
Argumentar que o juiz Griesa, designado para presidir esse processo, violou a soberania do Estado Argentino ou tomou decisões inaceitáveis, implica exigir que a Justiça americana só profira sentenças favoráveis à Argentina e, nesse caso, não seria necessário juiz.
Não há, para casos de dívidas soberanas, nenhum acordo internacional que preveja procedimentos judiciais e critérios de prioridade de pagamento para casos de incapacidade de resgate de títulos, como acontece em casos de falência ou de recuperação judicial de empresas.
O próprio contrato dos títulos da Argentina inclui a cláusula Rufo (Right Upon Future Offers) com validade até 31 de dezembro de 2014. Ela determina que qualquer benefício acertado com uma parcela de devedores deve ser estendido para os demais. Os próprios advogados da Argentina vêm garantindo que não cabe flexibilidade na aplicação dessa cláusula.
Se concordasse em pagar mais aos abutres, como determinou o juiz, a Argentina estaria sujeita a um dilúvio de processos judiciais dos outros credores, que exigiriam igualdade de tratamento. Nesse caso, os termos da renegociação da dívida perderiam validade. Além de problemas com a nova quebra (default), a Argentina teria de enfrentar outro processo de renegociação.
As trancas a um acordo com os abutres não terminam aí. A Lei Ferrolho (Ley Cerrojo), aprovada pelo Congresso argentino, tratou de fechar todas as portas para um entendimento. Impede pagamentos a credores que não aceitassem a reestruturação da dívida. Além disso, o governo argentino está proibido, também por lei, de oferecer quaisquer benefícios não previstos na renegociação anterior.
Essas razões sugerem que não há nem saídas fáceis nem saídas rápidas. Mas ainda não soou a última badalada.
31 de julho de 2014
Celso Ming, O Estadão
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