Em menos de um mês, o Brasil realizará as primeiras eleições gerais sob a vigência da Lei da Ficha Limpa. Mas a questão é: até que ponto o eleitor está tranquilo de que esse será um pleito limpo, à parte a lisura do processo em si, com a votação e a apuração dos votos há anos conduzidas sob extremo controle pela Justiça Eleitoral do país?
As dúvidas já começam pela articulação das alianças, com os tantos interesses em jogo, incluindo a distribuição do tempo de propaganda no rádio e na tevê. Seguem com a arrecadação de verbas e a prestação de contas das campanhas, portas de entrada da corrupção, de controle praticamente fictício. Basta ver a quantidade de casos de desvios apurados em operações anticorrupção executadas pela Polícia Federal.
Conhecido o resultado das urnas, a montagem dos governos, com a livre nomeação de cargos comissionados, é outro problema histórico. E por aí vai, numa escalada sem fim, enquanto o Brasil galga vergonhosos degraus no ranking da ONG Transparência Internacional, que mede a percepção da corrupção em 177 países. Ali figuramos no 72º lugar entre as nações menos corruptas.
Essa triste história tem outros capítulos igualmente vexaminosos. Um exemplo é o fato de a Câmara dos Deputados dar as costas à questão. Segundo o coordenador da Frente Parlamentar de Combate à Corrupção, deputado Francisco Praciano (PT-AM), há seis anos o plenário da Casa não vota um só projeto ligado ao tema. E nada menos do que 141 proposições estão em tramitação, 20 delas há mais de uma década - uma desde 1990.
Ressalve-se que lei anticorrupção sancionada um ano atrás pela presidente Dilma Rousseff, prevendo pena para pessoas jurídicas envolvidas em ilícitos com a administração pública, foi iniciativa não do Legislativo, mas do próprio Executivo, proposta pela Controladoria-Geral da União. Mais: continua pendente de regulamentação. E também a Lei da Ficha Limpa nasceu fora do Congresso Nacional, como proposição da sociedade civil, elaborada por um grupo de juristas e apresentada com a assinatura de 1,6 milhão de eleitores.
Não se tem a ingenuidade de imaginar que eficiente arcabouço legal bastará para acabar com a corrupção no Brasil. Há que ter condições também para que as instituições funcionem na direção de assegurar o pleno atendimento ao anseio de limpeza ética reclamado nos quatro cantos do país, ou seja, é preciso fazer valer a lei, fechando as brechas a desmoralizantes recursos judiciais que costumam torná-la letra morta.
A praga da corrupção faz mais do que tirar dinheiro da saúde, da educação, da segurança e dos transportes, para citar quatro áreas essenciais da administração pública, que mais de perto afligem os direitos do cidadão. Ela também violenta a iniciativa privada. Ao encarecer o investimento, com a propina acrescentada ao orçamento das obras, rouba a competitividade do empresariado, desestimula os negócios, reduz a oferta de empregos. O eleitor precisa, pois, estar muito consciente do voto que depositará nas urnas - do presidente da República ao deputado estadual ou distrital.
11 de setembro de 2014
Editorial Correio Braziliense
As dúvidas já começam pela articulação das alianças, com os tantos interesses em jogo, incluindo a distribuição do tempo de propaganda no rádio e na tevê. Seguem com a arrecadação de verbas e a prestação de contas das campanhas, portas de entrada da corrupção, de controle praticamente fictício. Basta ver a quantidade de casos de desvios apurados em operações anticorrupção executadas pela Polícia Federal.
Conhecido o resultado das urnas, a montagem dos governos, com a livre nomeação de cargos comissionados, é outro problema histórico. E por aí vai, numa escalada sem fim, enquanto o Brasil galga vergonhosos degraus no ranking da ONG Transparência Internacional, que mede a percepção da corrupção em 177 países. Ali figuramos no 72º lugar entre as nações menos corruptas.
Essa triste história tem outros capítulos igualmente vexaminosos. Um exemplo é o fato de a Câmara dos Deputados dar as costas à questão. Segundo o coordenador da Frente Parlamentar de Combate à Corrupção, deputado Francisco Praciano (PT-AM), há seis anos o plenário da Casa não vota um só projeto ligado ao tema. E nada menos do que 141 proposições estão em tramitação, 20 delas há mais de uma década - uma desde 1990.
Ressalve-se que lei anticorrupção sancionada um ano atrás pela presidente Dilma Rousseff, prevendo pena para pessoas jurídicas envolvidas em ilícitos com a administração pública, foi iniciativa não do Legislativo, mas do próprio Executivo, proposta pela Controladoria-Geral da União. Mais: continua pendente de regulamentação. E também a Lei da Ficha Limpa nasceu fora do Congresso Nacional, como proposição da sociedade civil, elaborada por um grupo de juristas e apresentada com a assinatura de 1,6 milhão de eleitores.
Não se tem a ingenuidade de imaginar que eficiente arcabouço legal bastará para acabar com a corrupção no Brasil. Há que ter condições também para que as instituições funcionem na direção de assegurar o pleno atendimento ao anseio de limpeza ética reclamado nos quatro cantos do país, ou seja, é preciso fazer valer a lei, fechando as brechas a desmoralizantes recursos judiciais que costumam torná-la letra morta.
A praga da corrupção faz mais do que tirar dinheiro da saúde, da educação, da segurança e dos transportes, para citar quatro áreas essenciais da administração pública, que mais de perto afligem os direitos do cidadão. Ela também violenta a iniciativa privada. Ao encarecer o investimento, com a propina acrescentada ao orçamento das obras, rouba a competitividade do empresariado, desestimula os negócios, reduz a oferta de empregos. O eleitor precisa, pois, estar muito consciente do voto que depositará nas urnas - do presidente da República ao deputado estadual ou distrital.
11 de setembro de 2014
Editorial Correio Braziliense
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