"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

FRENTE PATRIÓTICA MANUEL RODRIGUES: UM POUCO DE HISTÓRIA


 
A Frente Patriótica Manuel Rodriguez (FPMR) foi constituída em 14 de dezembro de 1983 como braço armado do Partido Comunista Chileno.

Alguns membros do Comitê Central do partido qualificaram a criação da FPMR como um erro político. Outros, todavia, alegaram que a existência da FPMR foi resultado das contradições e da luta ideológica que existiam, na época, no interior do partido.

Em 1974, cerca de um ano após a deposição do Presidente Salvador Allende, o PC Chileno, na clandestinidade, aceitou o oferecimento de Cuba de preparar militantes em diversas especialidades militares.
Preparar quadros militares profissionais em anos de instrução e treinamento. Pode ser dito que foi esse o primeiro passo de um longo caminho cheio de contradições, mudanças e retrocessos da incorporação de um componente militar – como se denominava então – à linha política do partido.

Como resultado, o PC Chileno, através desse grupo, adquiriu um novo arsenal político-ideológico e teórico-técnico no processo de transformação que vinha sofrendo desde a queda do governo da Unidade Popular. Esse foi o início daquilo que, por muitos anos, foi denominado de tarefa militar do partido.

No início de 1975 teve início essa longa e profunda preparação de um numeroso contingente de comunistas, composto por jovens estudantes, trabalhadores e camponeses, oriundos de todas as partes do Chile. É provável que ninguém possa quantificar seu número exato.

Alguns sabiam claramente o que iam fazer, enquanto outros foram se inteirando aos poucos da tarefa militar prolongada, na medida mesmo em que recebiam um uniforme militar.

Foi ministrado um treinamento nas mais diversas especialidades das ciências militares, em cursos prolongados que exigiram dedicação e intensos estudos. Alguns Quadros cursaram os mais altos níveis da educação militar superior. Todos se consideravam “quadros estratégicos do partido”, mas não foi somente em Cuba. A partir de 1977, outro grupo de comunistas chilenos passara a viver uma experiência similar na Bulgária.

Na medida em que o tempo transcorria, a direção do partido, sem saber o que iria fazer com esse numeroso contingente, provocou o abandono da tarefa por um importante grupo desses jovens comunistas. Sabe-se que alguns passaram apenas alguns dias nos centros de treinamento militar em Cuba, outros alguns meses e anos, e muitos resistiram todo o tempo.
Estes ultrapassaram todas as difíceis provas, e o PC Chileno, em meados de 1979, pela primeira vez em sua História, passou a dispor de um contingente de militantes especializados em tarefas militares.

Nesse sentido, a direção do partido, em 1979, organizou a chamada Frente Zero, como o primeiro passo orgânico, no interior do país, a fim de compor uma estrutura para o componente militar. Essa estrutura foi denominada Frente Zero, pois o Um era o Secretário-Geral, o Dois era o Secretário de Organização e o Três o Secretário de Educação. Chamar de Frente Zero o encarregado do trabalho militar revelava uma intencionalidade de prioridade.
 
A Frente Zero passou a existir em todas as grandes cidades do país, e seu funcionamento estava intimamente relacionado com as estruturas regulares do partido, nunca se tornando uma estrutura paralela, até 1983, quando foi constituída a Frente Patriótica Manuel Rodriguez.

Na Nicarágua havia uma guerra insurrecional, desde os anos 60, contra o governo de Anastácio Somoza, e Cuba vinha dando todo o apoio ao Movimento Sandinista. No início de 1979, Cuba propôs à direção do PC Chileno enviar à Nicarágua um contingente dos comunistas que havia concluído o treinamento armado, a fim de colaborar com os sandinistas.

Essa experiência iria influir no futuro da política militar do PC Chileno, pois a participação junto aos sandinistas foi maciça. Foi aí que o contingente que havia recebido treinamento em Cuba assumiu seu próprio comando e, nos anos posteriores à guerrilha na Nicarágua, foi mantido esse mesmo estilo de direção, independente do Comitê Central.

Poucos meses durou essa guerra para os comunistas chilenos, uma vez que em julho de 1979 a Frente Sandinista assumiu o poder. Outros grupos numerosos de socialistas e de militantes do Movimiento de Izquierda Revolucionária (MIR), bem como um numeroso grupo de uruguaios, combateram na Nicarágua. Muitos morreram e outros foram feridos.

Em setembro de 1980, a direção do PC Chileno, ao aprovar um enunciado apoiando todas as formas de luta contra o governo do General Pinochet, deu o primeiro passo para a política de rebelião popular. Esse planejamento, no entanto, nunca foi levado à prática pelo partido, pois seus dirigentes careciam de conhecimentos político-militares específicos sobre tão delicados e decisivos temas.

Nesse sentido, a composição e o nascimento da Frente Patriótica Manuel Rodriguez, como uma força militar própria, foi um longo processo teórico e prático que ocorreu dentro das estruturas do PC Chileno, tanto no Chile como no exterior.

O primeiro grupo de militantes com treinamento militar regressou ao Chile no primeiro semestre de 1983, passando a formar parte da ainda inexistente FPMR, que só viria a ser criada em dezembro - 14 de dezembro de 1983 é a data oficial de constituição da Frente Patriótica Manuel Rodriguez.

Sobre tudo isso, nada melhor do que passar a palavra a Orlando Millas, já falecido, dirigente do Partido Comunista Chileno, que fora Ministro no governo Allende. Orlando Millas escreveu em suas Memórias, 1957-1991, Ediciones Chile-América, Santiago, 1995, páginas 186 e 187, o seguinte:“Reunimo-nos em Moscou em 1974, os membros da Comissão Política do partido que estávamos no exílio, ou seja, os titulares Volodia Teitelboim, Gladys Marin (atual Secretária-Geral do PC Chileno), e eu, e o suplente Manuel Cantero.
Nessa oportunidade soube do acordo a que haviam chegado, em Havana, dirigentes dos respectivos partidos  (chileno e cubano), para que contingentes de militantes comunistas chilenos fossem aceitos como alunos, na qualidade de cadetes, na Escola Militar de Cuba.
 
Foi recrutado para essa tarefa o melhor do melhor da nova geração no exílio. Senti que os conduzíamos a queimar-se no Chile em tarefas impossíveis. Quem menos direito tem de criticá-los somos nós, que assumimos a responsabilidade, estremecedora, de sugerir-lhes, sendo adolescentes, que o caminho para serem dignos de seu povo deveria ser percorrido empunhando armas”.

A Frente Patriótica Manuel Rodriguez acabou, como afirmam alguns noticiários e análises? Não. O tablóide “El Rodriguista” nº 16, em matéria comemorativa do 17º aniversário de fundação da FPMR, afirma: Para os Rodriguistas a tarefa ainda não foi cumprida. Viver só do passado carece de sentido para os revolucionários”. 
A propósito, segundo o noticiário da imprensa chilena, dois atentados terroristas ocorreram, neste mês de setembro no Chile - mês do 41 aniversário da queda de Allende.

11 de setembro de 2014
Sonia Ilich e Carlos Ilich Santos Azambuja são Historiadores.

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