"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

domingo, 5 de junho de 2016

O BURGUÊS E A BURGUESIA




Engels e Marx, em foto de família burguesa, no século XIX


“Burguês” e “Burguesia” têm, na linguagem marxista, um sentido especial. “Burguês” é sinônimo de detentor do capital; de capitalista. Segundo Marx, esse burguês, esse membro da classe capitalista, surgiu, dialeticamente, da decomposição da sociedade feudal, trabalhada por contradições internas.

Em conseqüência das grandes descobertas, do surgimento de novos mercados, do acréscimo de mercadorias e dos meios de intercâmbio, cresceu a contradição entre a extensão das necessidades e o modo antiquado de produção: a oficina corporativa foi substituída pela manufatura. O processo manufatureiro tornando-se, por sua vez, insuficiente ante a ininterrupta ampliação dos mercados e das necessidades, deu lugar à grande indústria moderna, à máquina a vapor. E o burguês moderno surgiu no lugar da classe média industrial.

A burguesia moderna, classe atualmente dominante, é, pois, o produto de uma série de revoluções operadas no modo de produção, cada vez que as relações de produção existentes cessaram de corresponder ao desenvolvimento das forças produtivas, tornando-se, assim, entraves e cadeias que era forçoso quebrar.

Não será isso que ocorre, hoje, na URSS e países do Leste, de economias centralizadas, com as forças produtivas emperradas pelas relações de produção?

E, como a história política nada mais faz do que refletir as mudanças na diferenciação social, cada um desses estágios de desenvolvimento da economia é acompanhado do correspondente progresso político, modificando a superestrutura da sociedade. Nesse sentido, segundo o Manifesto Comunista, “o governo moderno é apenas uma delegação que rege os negócios comuns de toda a classe burguesa”.

O Manifesto não poderia condenar – como, aliás, não condenou – essa ávida ascensão da burguesia à supremacia econômica e política, pois tal condenação seria anti-dialética...

Um revolucionário dialético, científico, deve saber reconhecer a “necessidade histórica” da ascensão da burguesia, e mesmo aplaudir essa classe social pelo papel eminentemente revolucionário que desempenhou desde a Idade Média. Papel revolucionário em matéria econômica, bem entendido. Isso está claro no Manifesto Comunista:

“Por toda a parte aonde chegou ao Poder, a burguesia destruiu todas as condições feudais, patriarcais, idílicas. Dissolveu impiedosamente os vínculos feudais, complexos e variados que uniam o indivíduo ao seu superior natural, não deixando subsistir, de homem a homem, outro vínculo que não o interesse descoberto, o impossível pagamento em dinheiro (...) Despojou de sua auréola todas as atividades até então respeitadas e consideradas com piedosa veneração. Do médico, do jurista, do sacerdote, do poeta, do sábio, fez meros assalariados. Arrancou das relações familiares o véu do doce sentimentalismo, reduzindo-as a simples relações financeiras (...).”

E mais ainda: sua centralização econômica e demográfica conduziu-a, necessariamente, à centralização política. Províncias independentes, que mal se achavam federadas, tendo cada uma os seus interesses, as suas leis, os seus governos, as suas alfândegas, condensaram-se em uma Nação única, um só interesse nacional de classe, uma só fronteira alfandegária.

Tornou cosmopolitas, pela exploração do mercado mundial, a produção e o consumo de todos os países. As nações mais bárbaras, ou da mais obstinada xenofobia, foram arrastadas na corrente da civilização. Isto é, tiveram que adotar os sistemas burgueses de produção, de comércio e de pensar.

Assim, a burguesia criou um mundo à sua própria imagem. Tudo perfeitamente lógico do ponto de vista do materialismo histórico.

Finalmente, devemos recordar a frase com a qual Engels dá a definição de materialismo histórico, que é o fundamental postulado em que se baseia o marxismo:

“A produção econômica e a organização social que dela resulta necessariamente para cada época da história constituem a base política e intelectual dessa época”.



05 de junho de 2016
Carlos I. S. Azambuja é Historiador.

Nenhum comentário:

Postar um comentário