"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

NOVILÍNGUA ÀS AVESSAS


O britânico George Orwell cunhou, no romance 1984, a expressão Big Brother (popularizada pelo reality show televisivo) para definir o sistema de fiscalização que observa tudo 24 horas por dia. O livro traz ainda outro neologismo menos conhecido, mas que entrou no vocabulário contemporâneo: novilíngua – idioma criado pelo Estado autoritário descrito no livro, que consistia na condensação ou extinção de palavras para alterar ou eliminar significados de determinados termos. A ideia da novilíngua era, ao modificar ou suprimir vocábulos, controlar o pensamento das pessoas. Se alguém não consegue conceituar uma ideia, ela deixa de ser debatida e, consequentemente, de existir.

Movido pelo marketing político, o Estado brasileiro parece desenvolver uma variação às avessas da novilíngua. Em vez de extinguir palavras para que os significados delas se percam, cria novos termos para definir aquilo que já existe, numa tentativa de mostrar ao cidadão-eleitor que o governo tem novidades a exibir. Se na ficção de Orwell o objetivo era suprimir o pensamento, na realidade nacional a meta é criar uma ideia que seja lembrada no dia da eleição.

E, assim, novos termos para definir o que já existe se proliferam, formando uma sopa de letrinhas. O posto de saúde, carinhosamente apelidado pela população de “postinho”, virou UPA (Unidade de Pronto-Atendimento) na novilíngua federal. Veio a substituir o CMUM (Centro Municipal de Urgências Médicas). A creche agora é CMEI (Centro Municipal de Educação Infantil).

Uma autoescola, ao menos para os legisladores de Brasília, não existe; ela tem de ser chamada de Centro de Formação de Condutores. A emissora de televisão do governo paranaense já foi TV Educativa. Depois, virou Canal Paraná. Voltou às origens ao ser rebatizada de Paraná Educativa. E, no atual momento, chama-se E-Paraná. O PAC do governo federal (Programa de Aceleração do Crescimento) nada mais é que uma variação do Plano Plurianual (PPA) – nomenclatura prevista em lei que define o planejamento estratégico que todas as gestões têm de obrigatoriamente fazer a cada quatro anos.

Alguns dos novos termos também estão sendo importados. Tem sido cada vez mais comum, por exemplo, que agentes públicos chamem de BRT (bus rapid transit) os já consagrados termos “canaleta” ou “ônibus expresso”.

Não há nada de novo sob o sol, a não ser a sanha cada vez mais voraz dos políticos e dos tecnocratas em renomear. Quem batiza, afinal, costuma se considerar o pai da criança – e das obras.

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