Vê-se nos boatos que circulam nas redes sociais duas ordens de insatisfação. Há os que pleiteiam o impeachment da atual mandatária em decorrência das promessas de campanha que teriam sido descumpridas e os que imputam a ela conhecimento, complacência ou mesmo participação em desvios que estão sendo apurados no âmbito da Petrobras.
No caso do primeiro grupo, com todo o respeito, trata-se de mera insatisfação eleitoral. Nada mais natural que aqueles que votaram contra um determinado candidato julguem-no incapaz de conduzir o cargo para o qual eleito. Penso ser antidemocrático, contudo, deixar de respeitar a vontade daquela maioria que se formou no momento da votação. Pouco importa que se trate de maioria relativa, já que há abstenções, votos brancos e nulos. Democracia é, acima de tudo, respeito às regras do jogo, goste-se ou não dos resultados a que nela se chegou.
Mais do que isso, o pleito de responsabilizar políticos pelas promessas de campanha descumpridas é antigo e, penso eu, completamente descabido. A responsabilidade por julgar os candidatos, em uma Democracia que pretende um dia ser digna desta condição, deve recair exclusivamente sobre os ombros dos eleitores. Este anseio por alguém que venha resolver este tipo de questão - Justiça Eleitoral ou Congresso Nacional - é paternalista, considera que o eleitor não só é incapaz, como jamais conseguirá amadurecer.
Excluindo casos extremos de compra de votos ou abuso de poder político, econômico ou de uso indevido dos meios de comunicação, estas sim hipóteses de intervenção do Poder Judiciário, o que resta é a tarefa do eleitor de discernir o possível do impossível, o certo do errado. Alijar o eleitor desta tarefa é mantê-lo para sempre tutelado, em uma Democracia adolescente que clama por alguém que venha resolver os problemas. Se o político promete e não cumpre, que seja punido pelas urnas, nas próximas eleições. Que seja pressionado pela cidadania a cumpri-las.
O segundo grupo, por outro lado, comete um equívoco jurídico no meu modo de ver. Não é possível instaurar um processo de impeachment e cassar o mandato do Presidente da República por fatos que tenham sido por ele praticados - ainda que supostamente - no exercício de outros cargos públicos ou mesmo no curso de outro mandato presidencial já terminado.
Pelo que se vê das manifestações que circulam, pesaria contra a Presidente Dilma a acusação de ter sido conivente ou ter contribuído para atos de corrupção que teriam ocorrido quando então Ministra-Chefe da Casa Civil (e Presidente do Conselho de Administração da Petrobras) ou durante o seu primeiro mandato presidencial. Nenhum desses fatos, contudo, pode embasar um pedido de impeachment relativo ao mandato iniciado em 1º de janeiro de 2015. Daí o absurdo jurídico da pretensão.
Pelo que se vê das manifestações que circulam, pesaria contra a Presidente Dilma a acusação de ter sido conivente ou ter contribuído para atos de corrupção que teriam ocorrido quando então Ministra-Chefe da Casa Civil (e Presidente do Conselho de Administração da Petrobras) ou durante o seu primeiro mandato presidencial. Nenhum desses fatos, contudo, pode embasar um pedido de impeachment relativo ao mandato iniciado em 1º de janeiro de 2015. Daí o absurdo jurídico da pretensão.
Isso significa que eventuais atos de corrupção, dolosos ou culposos, que supostamente tenham sido praticados pela Presidente Dilma permaneceriam impunes?
Por óbvio que não. Conforme prevê o artigo 86 da Constituição Federal em seu artigo 4º, ela apenas não responderia por eles no curso de seu mandato. Neste período, permanecem suspensos eventuais prazos de prescrição. Concluído seu mandato, no dia 1º de janeiro de 2019, a cidadã Dilma pode ser processada como qualquer outra pessoa, sem direito a foro privilegiado, respondendo pelo que quer que seja que se impute a ela relativo ao período anterior ao atual mandato presidencial que exerce.
Como funciona um processo de impeachment?
O impeachment é um processo complexo que envolve a Câmara dos Deputados, o Senado Federal e o Presidente do Supremo Tribunal Federal. Os prazos e regras estão nos artigos 85 e 86 da Constituição Federal e na Lei nº 1.079/1950.
Resumidamente o processo tem início por denúncia formulada por qualquer cidadão à Câmara dos Deputados que, recebendo-a, deve nomear comissão própria para análise de seu cabimento. Após ouvir os argumentos de defesa, esta comissão encaminha à Mesa da Câmara dos Deputados sua conclusão pelo cabimento da acusação ou por seu arquivamento.
Resumidamente o processo tem início por denúncia formulada por qualquer cidadão à Câmara dos Deputados que, recebendo-a, deve nomear comissão própria para análise de seu cabimento. Após ouvir os argumentos de defesa, esta comissão encaminha à Mesa da Câmara dos Deputados sua conclusão pelo cabimento da acusação ou por seu arquivamento.
O Plenário, então, decide se há pertinência para instaurar o processo, decisão que exige o voto de ao menos dois terços dos Deputados Federais. Instaurado o processo, no caso de crime de responsabilidade, encaminha-se a acusação ao Senado Federal e o Presidente da República fica automaticamente afastado do cargo enquanto aguarda o desfecho.
Já o julgamento se dá pelo Plenário do Senado Federal, também sendo garantido pleno direito de defesa ao acusado, em sessão que é conduzida pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal. Para que se conclua pela cassação, também é exigido o voto positivo de ao menos dois terços dos Senadores da República.
No caso de impeachment de um presidente, quem assume o lugar?
De acordo com o artigo 79 da Constituição Federal, em caso de cassação do Presidente da República assume o Vice-Presidente.
Em qual situação o vice-presidente também pode sofrer impeachment?
O Vice-Presidente pode sofrer impeachment se, após assumir o cargo de Presidente da República, cometer crime de responsabilidade. Vale salientar que não se pode punir o Vice-Presidente ou mesmo o Presidente da República por acusações alheias àquele mandato que está sendo exercido. Assim, não existe propriamente impeachment de Vice-Presidente. O que há é o impeachment do Presidente da República, que pode, no caso, ser um Vice-Presidente que assumiu o mandato.
No caso da saída do vice-presidente, qual executivo assume o posto de presidente?
A linha sucessória prevista no artigo 80 da Constituição Federal prevê a assunção da Presidência, por ordem, pelo Presidente da Câmara dos Deputados, o Presidente do Senado Federal e o Presidente do Supremo Tribunal Federal.
Em qual circunstância seria necessária a realização de novas eleições presidenciais?
Há novas eleições na hipótese de ficarem vagos os cargos do Presidente e do Vice-Presidente, por cassação, morte ou renúncia. Aqui há um tratamento diferenciado, previsto no artigo 81 da Constituição Federal e em seu parágrafo primeiro. Se esta dupla vacância ocorrer nos dois primeiros anos de mandato, convocam-se novas eleições diretas. Caso a vacância aconteça durante os dois últimos anos do mandato, há eleição, mas indireta, pelo Congresso Nacional.
12 de fevereiro de 2015
Fernando Gaspar Neisser é advogado nas áreas de Direito Eleitoral, Político e Administrativo. Mestre em Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e doutorando em Direito Penal pela mesma universidade. É membro das comissões de Direito Penal e Eleitoral da OAB/SP e do Conselho Deliberativo do Instituto Paulista de Direito Eleitoral (IPADE).
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