O primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva mal começava quando fez sua primeira tentativa de salvar o Mercosul, paralisado pela diferença brutal entre as economias dos sócios maiores; a brasileira, em processo de retomada e atração de investimentos, e a argentina, em crise, recuperando-se do calote da dívida externa que encerrou seu período de adesão religiosa ao credo liberal do chamado Consenso de Washington.
A tentativa de Lula encontrou uma inesperada resistência do Paraguai, que se recusou a mexer no sistema comum de impostos de importação.
Nas discussões entre os sócios do Mercosul, autoridades paraguaias expuseram um argumento singelo: com impostos de renda muito baixos ou quase inexistentes, o Paraguai dependia da arrecadação de tributos de importação para bancar parte considerável de suas contas, e temia que as mudanças sugeridas pelo Brasil afetassem o seu caixa. Na dúvida, preferia deixar tudo como estava. É pecado grave para um governo confundir imposto regulatório com fonte de arrecadação. A atitude do Paraguai, que brecou um importante avanço na integração regional, é só um exemplo do que pode acontecer quando um país abandona a racionalidade de seus tributos pela ânsia por aumentar a arrecadação.
No Brasil de hoje, até pela estratégia de usar a concorrência estrangeira para evitar aumentos de preços, não há risco que se usem as tarifas de importação como reforço de caixa. Mas o alarme tardio da equipe econômica com o déficit nas contas do governo vem provocando outra distorção, que joga contra o desejo de estimular os investimentos privados. O Reintegra, que deveria servir para compensar os impostos cobrados indevidamente no processo de produção, tornou-se uma benesse casuística, incapaz de dar aos agentes privados um horizonte de planejamento.
Criado em 2011, o Reintegra, seguindo o exemplo de outros países, devolve às empresas exportadoras, em desconto de impostos ou dinheiro vivo, o equivalente a 3% do que venderam ao exterior. Como os acordos internacionais na Organização Mundial do Comércio (OMC) proíbem subsídios para a exportação, o benefício foi apresentado como uma forma de compensar os exportadores pelos impostos indiretos cobrados a fornecedores e não descontados no preço final. Faz sentido; afinal o Brasil luta na OMC para acabar com os subsídios à exportação, mas a complexa estrutura tributária brasileira exige algum tipo de compensação ao exportador.
O fisco brasileiro encarrega-se, porém, de desmoralizar os argumentos dos diplomatas brasileiros lá fora, já que sempre tratou o Reintegra como uma receita das empresas. Incomodado com a conta do reembolso aos exportadores, calculada em R$ 2,2 bilhões neste ano, a Receita Federal chega a cobrar tributos sobre o dinheiro repassado pelo governo, tratando o benefício do Reintegra como uma renda qualquer garantida pelo governo a seus exportadores.
A decisão de dar ao Reintegra prazo limitado, de um ano, renovado conforme o humor das autoridades, também transforma em piada a justificativa oficial para o programa. Neste ano, o governo anunciou que não haverá Reintegra em 2014, como se não mais existissem as razões de sua existência, a tributação indireta e indesejável sobre exportações do país.
Os empresários não se atreveram a incluir a medida, de duração incerta, em seus cálculos de formação de preços, ou nos planos de investimento. Essa é apenas uma das razões por que a política de estímulos do governo não foi capaz de animar o espírito investidor do setor privado. Na ansiedade por fechar as contas, o governo, como o Paraguai nas discussões do Mercosul, contribui para a irracionalidade de um sistema tributário enlouquecedor.
Repetido em outras áreas da política econômica, o improviso traz estragos ao país, como notou o presidente da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), Eduardo Eugênio Gouveia Vieira, único brasileiro a participar, na semana passada, de um encontro entre 30 executivos de grandes multinacionais e o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, em Bruxelas. "A imagem do Brasil está muito ruim; grandes investidores em infraestrutura estão horrorizados com as constantes mudanças de regras", comprovou Gouveia Vieira.
No discurso otimista de Durão Barroso, que previu melhoria da situação econômica na Europa e mostrou sua fé na eficiência das novas regras de ajuste fiscal dos países do bloco, Gouveia Vieira viu um paralelo desfavorável ao Brasil. "Ele falou das dificuldades dos cantões em aceitar a necessidade de reformas; parecia falar dos Estados e municípios no Brasil", comentou o empresário. "Mas a Europa criou novos constrangimentos para quem confronta a responsabilidade fiscal, o que há algum tempo era palavrão."
É uma pena que sejam notícias europeias a animar o dirigente industrial. Sem convicção no Planalto para trazer os Estados ao esforço de ajuste nas contas públicas, e sem um mapa claro de política para trazer ao Brasil uma nova estrutura tributária imune a improvisos, não será do Brasil que virão as boas novas em matéria fiscal no futuro próximo.
A tentativa de Lula encontrou uma inesperada resistência do Paraguai, que se recusou a mexer no sistema comum de impostos de importação.
Nas discussões entre os sócios do Mercosul, autoridades paraguaias expuseram um argumento singelo: com impostos de renda muito baixos ou quase inexistentes, o Paraguai dependia da arrecadação de tributos de importação para bancar parte considerável de suas contas, e temia que as mudanças sugeridas pelo Brasil afetassem o seu caixa. Na dúvida, preferia deixar tudo como estava. É pecado grave para um governo confundir imposto regulatório com fonte de arrecadação. A atitude do Paraguai, que brecou um importante avanço na integração regional, é só um exemplo do que pode acontecer quando um país abandona a racionalidade de seus tributos pela ânsia por aumentar a arrecadação.
No Brasil de hoje, até pela estratégia de usar a concorrência estrangeira para evitar aumentos de preços, não há risco que se usem as tarifas de importação como reforço de caixa. Mas o alarme tardio da equipe econômica com o déficit nas contas do governo vem provocando outra distorção, que joga contra o desejo de estimular os investimentos privados. O Reintegra, que deveria servir para compensar os impostos cobrados indevidamente no processo de produção, tornou-se uma benesse casuística, incapaz de dar aos agentes privados um horizonte de planejamento.
Criado em 2011, o Reintegra, seguindo o exemplo de outros países, devolve às empresas exportadoras, em desconto de impostos ou dinheiro vivo, o equivalente a 3% do que venderam ao exterior. Como os acordos internacionais na Organização Mundial do Comércio (OMC) proíbem subsídios para a exportação, o benefício foi apresentado como uma forma de compensar os exportadores pelos impostos indiretos cobrados a fornecedores e não descontados no preço final. Faz sentido; afinal o Brasil luta na OMC para acabar com os subsídios à exportação, mas a complexa estrutura tributária brasileira exige algum tipo de compensação ao exportador.
O fisco brasileiro encarrega-se, porém, de desmoralizar os argumentos dos diplomatas brasileiros lá fora, já que sempre tratou o Reintegra como uma receita das empresas. Incomodado com a conta do reembolso aos exportadores, calculada em R$ 2,2 bilhões neste ano, a Receita Federal chega a cobrar tributos sobre o dinheiro repassado pelo governo, tratando o benefício do Reintegra como uma renda qualquer garantida pelo governo a seus exportadores.
A decisão de dar ao Reintegra prazo limitado, de um ano, renovado conforme o humor das autoridades, também transforma em piada a justificativa oficial para o programa. Neste ano, o governo anunciou que não haverá Reintegra em 2014, como se não mais existissem as razões de sua existência, a tributação indireta e indesejável sobre exportações do país.
Os empresários não se atreveram a incluir a medida, de duração incerta, em seus cálculos de formação de preços, ou nos planos de investimento. Essa é apenas uma das razões por que a política de estímulos do governo não foi capaz de animar o espírito investidor do setor privado. Na ansiedade por fechar as contas, o governo, como o Paraguai nas discussões do Mercosul, contribui para a irracionalidade de um sistema tributário enlouquecedor.
Repetido em outras áreas da política econômica, o improviso traz estragos ao país, como notou o presidente da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), Eduardo Eugênio Gouveia Vieira, único brasileiro a participar, na semana passada, de um encontro entre 30 executivos de grandes multinacionais e o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Durão Barroso, em Bruxelas. "A imagem do Brasil está muito ruim; grandes investidores em infraestrutura estão horrorizados com as constantes mudanças de regras", comprovou Gouveia Vieira.
No discurso otimista de Durão Barroso, que previu melhoria da situação econômica na Europa e mostrou sua fé na eficiência das novas regras de ajuste fiscal dos países do bloco, Gouveia Vieira viu um paralelo desfavorável ao Brasil. "Ele falou das dificuldades dos cantões em aceitar a necessidade de reformas; parecia falar dos Estados e municípios no Brasil", comentou o empresário. "Mas a Europa criou novos constrangimentos para quem confronta a responsabilidade fiscal, o que há algum tempo era palavrão."
É uma pena que sejam notícias europeias a animar o dirigente industrial. Sem convicção no Planalto para trazer os Estados ao esforço de ajuste nas contas públicas, e sem um mapa claro de política para trazer ao Brasil uma nova estrutura tributária imune a improvisos, não será do Brasil que virão as boas novas em matéria fiscal no futuro próximo.
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