Mistura de siglas nas conversas para a eleição de 2018. A ideia de que o vice Michel Temer não tem nada a ver com o presidente Michel Temer é engenhosa, nascida da reconhecida especialidade do constitucionalista Michel Temer, e vai ser ajudada pela mistura de siglas que está em gestação nas conversas políticas para a disputa presidencial de 2018.
Uma chapa Alckmin e Ciro Gomes, o primeiro pelo PSB e o outro pelo PDT, é uma impossibilidade que está sendo aventada nessas especulações. Haverá alguém mais diferente um do outro que esses dois? O que serão capazes de arquitetar juntos? Tão diferentes quanto a ex-presidente, a seca e distante Dilma Rousseff (quem se lembra dela?), e o afável e melífluo Temer.
A política brasileira é interessante. Antes, era possível eleger presidente e vice de chapas diferentes, e deu no que deu. A chapa Jânio-Jango (Jan-Jan) venceu as eleições e resultou numa crise política. Agora que só se pode votar numa chapa, também colhemos crises.
Ressaltar as diferenças faz parte da estratégia do presidente para separar suas responsabilidades das de Dilma nas campanhas de 2010 e 2014, agora manchadas por diversas evidências de corrupção.
A campanha dos petistas contra Temer paradoxalmente o ajuda. Ele se disse em uma carta pessoal um “vice decorativo”. Já estaria com a intenção de demarcar sua separação da titular do cargo? Como os petistas dizem que ele é um usurpador porque não foi eleito presidente, negam-lhe os votos que recebeu, mas, ao mesmo tempo, dão-lhe razão de considerar-se completamente à parte das decisões de campanha.
A chapa Alckmin-Ciro citada acima deve ser alucinação de algum marqueteiro, mas é falada como alternativa caso Alckmin não consiga ser o candidato do PSDB à Presidência em 2018. Iria para o PSB, de seu vice Marcio França, que ganharia de bandeja o governo de SP, podendo até mesmo se candidatar à reeleição.
Mas Ciro mais provavelmente será candidato do PDT em coligação com o PT, que, diz Carlos Lupi, presidente da sigla brizolista, tem de “cair na real” e ver que não tem condições de apresentar nome viável. Mas o peso do PT ainda representa vantagem numa coligação?
Para se ter ideia, nem Lula quer assumir a presidência da sigla, alegando, com razão, que ela precisa de renovação. Mas, nessa misturada de legendas sem programas, o mais provável a assumir a renovação do PT seria o prefeito Fernando Haddad, de SP.
Que, porém, não foi para o 2º turno e está agora trocando afagos com seu algoz, o tucano João Doria, que, mesmo contra parte de seu próprio partido, cena muito própria do PSDB, conseguiu vencer no 1º turno e se impor como um dos novos trunfos da sigla.
Doria disse que Haddad é melhor e maior que o PT, e não se surpreendam se os dois estiverem juntos adiante. Não foi Lula quem disse que escolheu Haddad para candidato a prefeito porque ele tinha pinta de tucano?
O ex-presidente Fernando Henrique, que anda mais preocupado com o clima de tensão política que vivemos do que com costuras partidárias imediatas, revelou outro dia que combinou com Haddad, com quem se dá bem, de irem juntos a um concerto em SP, e depois jantaram em público, apenas para mostrar que não é preciso ser inimigo para ser adversário político.
As declarações frequentes de FH sobre Lula, quando diz, sempre que perguntado, que eventual prisão de Lula não seria de seu agrado, revela a preocupação de distender o ambiente. Embora seja quase certo que Lula considere os comentários um modo indireto de seu inimigo preferido tripudiar de sua situação.
Mas, no próprio PSDB, a disputa entre os 3 potenciais candidatos — Alckmin, Serra e Aécio — vai ter de ser resolvida na base da prévia, que não deu muito certo na disputa da prefeitura de SP. O vereador Andrea Matarazzo, preferido da cúpula tucana, foi derrotado e deixou o partido para ser vice de Marta Suplicy no PMDB. Não deu certo também, e hoje está sendo chamado de volta ao ninho.
FH acha que, como sempre aconteceu, o partido encontrará maneira de manter os três caciques juntos. Mas esta é a 1ª vez que os possíveis derrotados já se posicionam para deixar a legenda. Como o senador Aécio Neves tem o domínio hoje da máquina partidária, Alckmin já estica o olho para o PSB, e o ministro José Serra se posiciona dentro do PMDB.
Talvez por isso Aécio já negocie com Moreira Franco aliança para 2018 entre as duas siglas. Há mais um detalhe para complicar a situação partidária atual, já complicada em excesso. Com a possível aprovação de reforma que reduzirá o número de partidos, e os possíveis efeitos da Lava-Jato sobre algumas das principais legendas, como PT, PMDB e PP, provavelmente nada será como antes quando 2018 chegar.
19 de outubro de 2016
Merval Pereira, O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário