As recentes eleições municipais, em seu primeiro turno, assinalaram um momento importante na vida política brasileira. Não se costuma atribuir maior importância a esse tipo de disputa, na visão equivocada de que os cargos municipais não têm maior importância no jogo político nacional, cujos lances decisivos se passam em Brasília, no palácio presidencial e nas duas casas do Congresso.
Até certo ponto isso é verdade, mas as eleições municipais, por encarnarem o interesse imediato e vital tanto das pequenas cidades quanto das capitais dos Estados, revelam, no mínimo, a correlação de forças que, no final das contas, definem o rumo que os interesses políticos vão tomar. Talvez nem sempre percebamos, mas, nestas eleições, isso ocorreu.
A verdade é que o país vem atravessando um período crítico, que envolve tanto a realidade política quando a econômica, crise esta que culminou no impeachment da presidente Dilma Rousseff.
Se é certo que, no primeiro plano da cena política, as coisas pareciam claras, ainda que polêmicas, bem mais difícil era saber o que se passava no interior do país, dada a vastidão e complexidade dessa realidade.
Certamente, os comentaristas políticos já haviam detectado as consequências desta crise –agravada pelos escândalos revelados pela Operação Lava Jato– mas, de fato, nenhum deles avaliava o grau de deterioração do prestígio do PT, como ficou revelado nos resultados do primeiro turno das eleições recentes.
Eu mesmo, em diversas crônicas escritas durante esse período, constatei a perda de prestígio do Partido dos Trabalhadores, mas admito que essa perda, como demonstrou o pleito municipal, deixou-me surpreso.
Basta dizer que, enquanto em 2012 o PT alcançou 17,3 milhões de eleitores no primeiro turno, neste ano teve 6,8 milhões de votos.
A queda no número de eleitores resulta das derrotas que o partido sofreu, deixando-o em décimo lugar em número de prefeituras conquistadas. Em 2012, o PT foi eleito em 644 municípios; no final deste primeiro turno das eleições, caiu para 256 cidades (no melhor cenário possível, subirá para 263 concluído o segundo turno).
Como se isso não bastasse para comprovar a perda de prestígio do lulopetismo, basta constatar que o próprio Lula não conseguiu reeleger seu filho vereador na cidade de São Bernardo do Campo, no ABC, onde ele vive e até então era seu reduto eleitoral.
Tudo bem, mas se levarmos em conta que Lula é o PT e PT é Lula, a conclusão inevitável é a de que uma etapa da vida política brasileira chegou ao fim.
Não quero dizer que o PT e Lula vão sumir do mapa. Não é isso.
Os dados comprovam que o partido perdeu a hegemonia e não voltará mais a dirigir o país. Esta não é apenas minha opinião, já que os próprios dirigentes do PT estão cogitando de fazer uma mudança radical no que ele se tornou; há até quem queira suprimir a estrela símbolo e o nome Partido dos Trabalhadores.
Esse é um dos fatores; o outro foi a vitória de João Doria, do PSDB, mas, sobretudo, o que essa vitória no primeiro turno significou para o prestígio do governador Geraldo Alckmin, que inventou a candidatura do empresário e brigou por ela.
A vitória foi, na verdade, de Alckmin, responsável também pelas vitórias do PSDB em várias importantes cidades do Estado. Quando se leva em conta que a candidatura de Doria foi contestada por importantes líderes do partido, só acresce à força política do governador.
Mas o que desejo ressaltar é o seguinte: quando é incontestável a ausência de um líder capaz de mobilizar a opinião pública do país para as eleições presidenciais de 2018, pode ser que Geraldo Alckmin se torne esse líder. Trata-se de uma constatação de agora. Resta saber como se desenrolarão as coisas nos próximos dois anos.
19 de outubro de 2016
Ferreira Gullar, Folha de SP
Até certo ponto isso é verdade, mas as eleições municipais, por encarnarem o interesse imediato e vital tanto das pequenas cidades quanto das capitais dos Estados, revelam, no mínimo, a correlação de forças que, no final das contas, definem o rumo que os interesses políticos vão tomar. Talvez nem sempre percebamos, mas, nestas eleições, isso ocorreu.
A verdade é que o país vem atravessando um período crítico, que envolve tanto a realidade política quando a econômica, crise esta que culminou no impeachment da presidente Dilma Rousseff.
Se é certo que, no primeiro plano da cena política, as coisas pareciam claras, ainda que polêmicas, bem mais difícil era saber o que se passava no interior do país, dada a vastidão e complexidade dessa realidade.
Certamente, os comentaristas políticos já haviam detectado as consequências desta crise –agravada pelos escândalos revelados pela Operação Lava Jato– mas, de fato, nenhum deles avaliava o grau de deterioração do prestígio do PT, como ficou revelado nos resultados do primeiro turno das eleições recentes.
Eu mesmo, em diversas crônicas escritas durante esse período, constatei a perda de prestígio do Partido dos Trabalhadores, mas admito que essa perda, como demonstrou o pleito municipal, deixou-me surpreso.
Basta dizer que, enquanto em 2012 o PT alcançou 17,3 milhões de eleitores no primeiro turno, neste ano teve 6,8 milhões de votos.
A queda no número de eleitores resulta das derrotas que o partido sofreu, deixando-o em décimo lugar em número de prefeituras conquistadas. Em 2012, o PT foi eleito em 644 municípios; no final deste primeiro turno das eleições, caiu para 256 cidades (no melhor cenário possível, subirá para 263 concluído o segundo turno).
Como se isso não bastasse para comprovar a perda de prestígio do lulopetismo, basta constatar que o próprio Lula não conseguiu reeleger seu filho vereador na cidade de São Bernardo do Campo, no ABC, onde ele vive e até então era seu reduto eleitoral.
Tudo bem, mas se levarmos em conta que Lula é o PT e PT é Lula, a conclusão inevitável é a de que uma etapa da vida política brasileira chegou ao fim.
Não quero dizer que o PT e Lula vão sumir do mapa. Não é isso.
Os dados comprovam que o partido perdeu a hegemonia e não voltará mais a dirigir o país. Esta não é apenas minha opinião, já que os próprios dirigentes do PT estão cogitando de fazer uma mudança radical no que ele se tornou; há até quem queira suprimir a estrela símbolo e o nome Partido dos Trabalhadores.
Esse é um dos fatores; o outro foi a vitória de João Doria, do PSDB, mas, sobretudo, o que essa vitória no primeiro turno significou para o prestígio do governador Geraldo Alckmin, que inventou a candidatura do empresário e brigou por ela.
A vitória foi, na verdade, de Alckmin, responsável também pelas vitórias do PSDB em várias importantes cidades do Estado. Quando se leva em conta que a candidatura de Doria foi contestada por importantes líderes do partido, só acresce à força política do governador.
Mas o que desejo ressaltar é o seguinte: quando é incontestável a ausência de um líder capaz de mobilizar a opinião pública do país para as eleições presidenciais de 2018, pode ser que Geraldo Alckmin se torne esse líder. Trata-se de uma constatação de agora. Resta saber como se desenrolarão as coisas nos próximos dois anos.
19 de outubro de 2016
Ferreira Gullar, Folha de SP
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