Se você tem apreço pela Grã-Bretanha ou pelos valores da Europa unida, o voto da semana passada a favor da saída da União Europeia foi um evento deprimente. A sociedade britânica e o projeto europeu ficaram menores, com repercussões para todos.
Mas uma análise fria da nova situação revela um quadro potencialmente positivo para o Brasil. No caso brasileiro, o "Brexit" mais abre oportunidades do que cria constrangimentos. Eis os porquês.
O declínio econômico britânico, que será inevitável a curto prazo, não vai contagiar a economia brasileira: exportamos para eles 1,52% do que vendemos mundo afora e compramos deles apenas 1,63% das nossas importações totais. Uma base tão pequena blinda o Brasil, ao passo que abre uma enorme oportunidade, agora que as autoridades britânicas terão de buscar novos acordos comerciais para mitigar sua perda de riqueza e o possível fim do acesso privilegiado ao mercado comum europeu e aos 53 mercados não europeus com os quais a UE tem acordos de livre-comércio.
As perspectivas de comércio novo entre o Brasil e o Reino Unido existem em boa medida pela atitude relativamente aberta de Londres para tratar de questões agrícolas. Bastaria o governo argentino de Maurício Macri implementar seu projeto para reduzir o peso das ilhas Malvinas sobre sua relação com os britânicos para viabilizar uma eventual negociação comercial entre o Reino Unido e o Mercosul. Além de factível, algo assim enfrentaria menos interesses obstrucionistas que a famigerada negociação ora em curso entre o Mercosul e toda a União Europeia.
Sem dúvida, uma crise na praça financeira de Londres seria péssima para o Brasil, pois capitais britânicos respondem por 7,3% do estoque total dos investimentos estrangeiros que chegam por aqui. Mas o "Brexit" tende a forçar um aumento da liquidez no sistema financeiro internacional, e nada sugere que venhamos a enfrentar uma fuga desses recursos.
Para o Brasil, as implicações geopolíticas do "Brexit" estão longe de ser uniformemente negativas. Os Estados Unidos ficam sem seu principal ponto de apoio na Europa e seu aliado mais fiel em negociações multilaterais e organismos internacionais. Isso dificulta, nem que seja na margem, a capacidade de Washington de impor suas decisões mundo afora. Além disso, ganham força a Rússia e, a longo prazo e se jogar bem, a Alemanha (embora o governo em Berlim sinta estar perdendo a curto prazo).
Para quem acredita que a geometria mais benéfica ao Brasil é a multipolaridade — e assim pensa a maioria dos analisas e diplomatas brasileiros —, o "Brexit" acabou de abrir um futuro potencialmente promissor.
02 de julho de 2016
Matias Spektor, Folha de SP
Mas uma análise fria da nova situação revela um quadro potencialmente positivo para o Brasil. No caso brasileiro, o "Brexit" mais abre oportunidades do que cria constrangimentos. Eis os porquês.
O declínio econômico britânico, que será inevitável a curto prazo, não vai contagiar a economia brasileira: exportamos para eles 1,52% do que vendemos mundo afora e compramos deles apenas 1,63% das nossas importações totais. Uma base tão pequena blinda o Brasil, ao passo que abre uma enorme oportunidade, agora que as autoridades britânicas terão de buscar novos acordos comerciais para mitigar sua perda de riqueza e o possível fim do acesso privilegiado ao mercado comum europeu e aos 53 mercados não europeus com os quais a UE tem acordos de livre-comércio.
As perspectivas de comércio novo entre o Brasil e o Reino Unido existem em boa medida pela atitude relativamente aberta de Londres para tratar de questões agrícolas. Bastaria o governo argentino de Maurício Macri implementar seu projeto para reduzir o peso das ilhas Malvinas sobre sua relação com os britânicos para viabilizar uma eventual negociação comercial entre o Reino Unido e o Mercosul. Além de factível, algo assim enfrentaria menos interesses obstrucionistas que a famigerada negociação ora em curso entre o Mercosul e toda a União Europeia.
Sem dúvida, uma crise na praça financeira de Londres seria péssima para o Brasil, pois capitais britânicos respondem por 7,3% do estoque total dos investimentos estrangeiros que chegam por aqui. Mas o "Brexit" tende a forçar um aumento da liquidez no sistema financeiro internacional, e nada sugere que venhamos a enfrentar uma fuga desses recursos.
Para o Brasil, as implicações geopolíticas do "Brexit" estão longe de ser uniformemente negativas. Os Estados Unidos ficam sem seu principal ponto de apoio na Europa e seu aliado mais fiel em negociações multilaterais e organismos internacionais. Isso dificulta, nem que seja na margem, a capacidade de Washington de impor suas decisões mundo afora. Além disso, ganham força a Rússia e, a longo prazo e se jogar bem, a Alemanha (embora o governo em Berlim sinta estar perdendo a curto prazo).
Para quem acredita que a geometria mais benéfica ao Brasil é a multipolaridade — e assim pensa a maioria dos analisas e diplomatas brasileiros —, o "Brexit" acabou de abrir um futuro potencialmente promissor.
02 de julho de 2016
Matias Spektor, Folha de SP
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