Banco Central e CMN sinalizam preferir ir mais devagar com o corte nos juros e usar o câmbio para levar a inflação mais rápido ao centro da meta
Pouco a pouco vai ficando claro o tamanho do desafio proposto pelo governo do presidente interino Michel Temer para reequilibrar as contas públicas e, em consequência, a própria economia. Começa a se consolidar a ideia de que, além da habilidade política para aprovar e manter o teto congelado das despesas públicas, a chave do programa de ajuste é a retomada do crescimento econômico.
Sem crescimento robusto e sustentável — e não apenas com uma reversão cíclica da profunda contração em curso, que parece a caminho —, tanto maiores serão os esforços e sacrifícios para conter a trajetória explosiva da dívida pública e evitar um novo período de inflação alta, ineficiência produtiva e aumento da pobreza, como os vividos nos anos 80. A compreensão do valor superior do crescimento deriva das experiências de ajuste fiscal anteriores, todas, sem exceção, baseadas em elevação de receitas públicas, via novos tributos ou revisão de alíquotas, cujos resultados acabaram sempre se mostrando efêmeros.
Muitos podem ser os caminhos da política econômica para centrar fogo nesse objetivo primordial. Mas, sem a abertura de espaços para a redução consistente das taxas de juros, dificilmente o crescimento dará as caras, no nível em que dele se necessita.
Consumo e investimento, as principais forças propulsoras da expansão da economia, não se moverão na direção da expansão dos negócios se os juros não caírem e o custo dos financiamentos continuar nas alturas em que se encontram. Com o custo do dinheiro acima da taxa de retorno, como atualmente, não há confiança que se transforme em investimento, da mesma forma que, sem crédito relativamente farto e barato, não há demanda de consumo digna do nome que ganhe músculos.
Está aí a explicação para tanta ansiedade com a definição da política monetária, da qual a taxa básica de juros é a expressão mais importante, desde o anúncio da nomeação do economista Ilan Goldfajn para a presidência do Banco Central. Antes da apresentação do relatório trimestral de inflação, referente ao segundo trimestre, nesta terça-feira, chegaram a circular com alguma intensidade hipóteses a respeito de mudanças nas metas de inflação.
Presente na apresentação do relatório, o primeiro elaborado já em sua gestão, Goldfajn já havia desfeito qualquer possibilidade de que fosse adotada uma meta ajustada e reafirmou convicção na condução da inflação para o centro da meta como objetivo único da política monetária. Ontem, o Conselho Monetário Nacional (CMN), que reúne os ministros da Fazenda e do Planejamento e o presidente do Banco Central, preferiu evitar ousadias e manteve tudo como está desde 2005. Nem a meta de 2017 foi ajustada para cima, permitindo acelerar o corte dos juros, nem a de 2018 ficou diferente dos 4,5% de sempre.
Foi assim reforçada a mensagem, que, depois das declarações de Goldfajn dois dias antes, já havia chegado ao mercado: entre manter juros mais altos, propiciando uma taxa de câmbio mais baixa, que colabore para levar a inflação a convergir mais rapidamente para o centro da meta, ou reduzir juros para evitar que um real mais valorizado limite a competitividade dos bens e serviços exportáveis, a primeira opção será a preferida. E a expectativa de que o início de um ciclo de cortes na taxa básica já se desse em julho foi adiada para outubro ou novembro.
Vê-se, mais uma vez, como tem sido costumeiro na história econômica brasileira, que o dilema dos juros voltou ao centro do palco da política econômica. Na maior parte dos episódios anteriores — aí incluído o do Plano Real —, a tentação de se valer da taxa de câmbio como âncora para o controle da inflação redundou em crises cambiais, como na segunda metade dos anos 90, e impulsos à desindustrialização, como ao longo dos anos 2000, nos governos Lula, com o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, no comando do Banco Central.
02 de julho de 2016
José Paulo Kupfer
O Globo
Pouco a pouco vai ficando claro o tamanho do desafio proposto pelo governo do presidente interino Michel Temer para reequilibrar as contas públicas e, em consequência, a própria economia. Começa a se consolidar a ideia de que, além da habilidade política para aprovar e manter o teto congelado das despesas públicas, a chave do programa de ajuste é a retomada do crescimento econômico.
Sem crescimento robusto e sustentável — e não apenas com uma reversão cíclica da profunda contração em curso, que parece a caminho —, tanto maiores serão os esforços e sacrifícios para conter a trajetória explosiva da dívida pública e evitar um novo período de inflação alta, ineficiência produtiva e aumento da pobreza, como os vividos nos anos 80. A compreensão do valor superior do crescimento deriva das experiências de ajuste fiscal anteriores, todas, sem exceção, baseadas em elevação de receitas públicas, via novos tributos ou revisão de alíquotas, cujos resultados acabaram sempre se mostrando efêmeros.
Muitos podem ser os caminhos da política econômica para centrar fogo nesse objetivo primordial. Mas, sem a abertura de espaços para a redução consistente das taxas de juros, dificilmente o crescimento dará as caras, no nível em que dele se necessita.
Consumo e investimento, as principais forças propulsoras da expansão da economia, não se moverão na direção da expansão dos negócios se os juros não caírem e o custo dos financiamentos continuar nas alturas em que se encontram. Com o custo do dinheiro acima da taxa de retorno, como atualmente, não há confiança que se transforme em investimento, da mesma forma que, sem crédito relativamente farto e barato, não há demanda de consumo digna do nome que ganhe músculos.
Está aí a explicação para tanta ansiedade com a definição da política monetária, da qual a taxa básica de juros é a expressão mais importante, desde o anúncio da nomeação do economista Ilan Goldfajn para a presidência do Banco Central. Antes da apresentação do relatório trimestral de inflação, referente ao segundo trimestre, nesta terça-feira, chegaram a circular com alguma intensidade hipóteses a respeito de mudanças nas metas de inflação.
Presente na apresentação do relatório, o primeiro elaborado já em sua gestão, Goldfajn já havia desfeito qualquer possibilidade de que fosse adotada uma meta ajustada e reafirmou convicção na condução da inflação para o centro da meta como objetivo único da política monetária. Ontem, o Conselho Monetário Nacional (CMN), que reúne os ministros da Fazenda e do Planejamento e o presidente do Banco Central, preferiu evitar ousadias e manteve tudo como está desde 2005. Nem a meta de 2017 foi ajustada para cima, permitindo acelerar o corte dos juros, nem a de 2018 ficou diferente dos 4,5% de sempre.
Foi assim reforçada a mensagem, que, depois das declarações de Goldfajn dois dias antes, já havia chegado ao mercado: entre manter juros mais altos, propiciando uma taxa de câmbio mais baixa, que colabore para levar a inflação a convergir mais rapidamente para o centro da meta, ou reduzir juros para evitar que um real mais valorizado limite a competitividade dos bens e serviços exportáveis, a primeira opção será a preferida. E a expectativa de que o início de um ciclo de cortes na taxa básica já se desse em julho foi adiada para outubro ou novembro.
Vê-se, mais uma vez, como tem sido costumeiro na história econômica brasileira, que o dilema dos juros voltou ao centro do palco da política econômica. Na maior parte dos episódios anteriores — aí incluído o do Plano Real —, a tentação de se valer da taxa de câmbio como âncora para o controle da inflação redundou em crises cambiais, como na segunda metade dos anos 90, e impulsos à desindustrialização, como ao longo dos anos 2000, nos governos Lula, com o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, no comando do Banco Central.
02 de julho de 2016
José Paulo Kupfer
O Globo
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