A Justiça Federal de Brasília determinou que o BNDES divulgue, em seu site, informações detalhadas sobre todos os empréstimos a empresas públicas ou privadas feitos nos últimos dez anos, e, de forma atualizada, a partir de agora. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social recorreu, alegando sigilo bancário.
Para obrigar o banco a divulgar as informações, a justiça afirma que a instituição está sujeita à Lei de Acesso a Informações Públicas.
A primeira questão que se coloca, nesse caso, é a da isonomia. Ao exigir do BNDES que libere essas informações, em um mercado no qual compete com instituições nacionais e estrangeiras, a justiça prejudica a competição, e o país, dando injustificável vantagem à iniciativa privada, que teria acesso a informações, hoje, sigilosas, sobre a política de crédito do banco, sem necessitar – apenas pelo fato de pertencer a acionistas e controladores particulares – fazer o mesmo.
O segundo problema é de caráter estratégico. O BNDES tem, entre outras atribuições, a de financiar a exportação de serviços e equipamentos nacionais para o exterior, e, nisso, compete com instituições similares de outras nações, que, como ele, também se dedicam a apoiar empresas de seus respectivos países nos mercados internacionais.
SIGILO
Esses bancos estrangeiros, como o Eximbank norte-americano, o JBIC japonês, ou o BCE, que repassa recursos para diversas instituições europeias de fomento, tem suas respectivas estratégias de apoio a setores exportadores de ponta e também não tornam públicas suas informações, principalmente quando em fase de negociação de contratos.
Em alguns casos, como a exportação de armamentos e outros equipamentos estratégicos, as informações só podem ser divulgadas depois de dezenas de anos.
Se alguém acha que os EUA, a Europa, o Japão, a China, sobreviveriam nos mercados internacionais sem esse tipo de instrumento ou instituição, é ingênuo ou está mal informado.
Seria ótimo que, no cumprimento de sua missão de apoiar o desenvolvimento e o empresariado brasileiro, o BNDES só emprestasse dinheiro para empresas autenticamente nacionais, e não para multinacionais estrangeiras, que tem sido beneficiadas, nos últimos anos, com volumosos recursos públicos a baixo custo, até mesmo na hora de adquirir empresas brasileiras, como ocorreu, muitas vezes, nas privatizações dos anos 1990.
TELEFONIA
Esse é o caso, agora, da intenção do Ministro Paulo Bernardo, de pedir ao BNDES que financie o pagamento, por operadoras de capital estrangeiro, da outorga do serviço de telefonia celular 4G, em um valor aproximado de 8 bilhões de reais.
Normalmente, o BNDES não oferece financiamento para o pagamento de outorgas por empresas ao governo federal, mas sim – teoricamente – apenas para investimentos.
É preciso definir o que é e o que não é capital estrangeiro no Brasil.
Se a empresa é estrangeira, se ela envia, todos os anos, como fazem as operadoras de telefonia espanholas, mexicanas, italianas, bilhões de dólares para o exterior, se elas já pegam – como ocorreu com a Vivo, centenas de milhões de reais para financiar, a custo subsidiado, a expansão de sua rede e de suas atividades no mercado nacional – o mínimo que se espera é que tragam de fora, de suas matrizes, os recursos a serem pagos por outorgas que aumentarão extraordinariamente seus lucros, e o envio de mais dinheiro auferido dos consumidores brasileiros, para o exterior, nos próximos anos.
USAR O BNDES
O que não podemos é continuar a usar recursos do tesouro, ou do BNDES, para financiar empresários estrangeiros, em áreas como a de serviços de telefonia, onde a maioria dos equipamentos são importados e a maior parte dos empregos gerados pertencem ao âmbito do que se convencionou chamar de “telemarketing”.
Entendemos, de telefonia celular, a mesma coisa que entendiam os mexicanos, portugueses e italianos – longínquos descendentes de Marconi – que aqui aportaram no final do século passado, para se assenhorear da maior parte de nosso mercado de telecomunicações – rigorosamente nada.
Mas se for para não colocar um centavo e nos financiar com dinheiro do BNDES, também estaríamos dispostos a entrar nessa disputa do leilão de 4G.
Querendo dar a entender que é rigoroso com as operadoras, o Ministro das Comunicações (na foto, ao lado do risonho ex-vice presidente da ANATEL e atual presidente do grupo espanhol Telefónica do Brasil (Vivo) Antônio Carlos Valente) , afirmou que não irá postergar a realização do leilão, marcado para o próximo mês – como queriam a própria Telefónica e a Telecom Itália, que no momento estão se engalfinhando para tentar ficar com o controle da GVT.
“O governo não tem nada com isso”, afirmou. A mesma lógica deveria valer para o financiamento do pagamento das outorgas por empresas, que, em sua maioria, sequer são daqui. As multinacionais que se financiem com os recursos de suas matrizes. O BNDES não tem nada com isso, e muito menos o Brasil.
30 de agosto de 2014
Mauro Santayana
(Jornal do Brasil)
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