"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 19 de março de 2014

VELHICE E POBREZA

 

Um conhecido meu teve, já faz muito tempo, uma pequena papelaria. Naquela época em que ainda ninguém tinha computador, nem impressora, nem escâner em casa, ele deixava uma fotocopiadora à disposição dos clientes. Por módica soma, o distinto público podia tirar suas copiazinhas em sistema de autosserviço. Pagava-se no final.
 
Vez por outra, aparecia uma velhinha, moradora das redondezas. Depois dos bons-dias, ela pedia para tirar umas cópias. O dono da loja, comovido com a idade avançada da cliente, nunca cobrou pelo serviço. Sempre deixava por isso mesmo.
 
Um dia, a anciã chegou com algumas folhas. Parecia apressada. O comerciante propôs que ela lhe confiasse os documentos. Ele mesmo tiraria as cópias, e ela podia vir logo mais à tarde buscar o calhamaço. Contente e agradecida, ela aceitou.
 
Meu conhecido pôs-se à obra. Deu-se conta de que tinha em mãos a declaração de renda da velhinha, preenchida e pronta para ser enviada à Receita.
Não se conteve ― deu uma rápida espiada nos números. Quase caiu de costas: a cliente era dona de fortuna considerável, coisa de milhões! Um espanto.
 
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Decreto n° 54925
Decreto n° 54925
 
Ao ficar sabendo que o prefeito da cidade de São Paulo havia decretado, semana passada, que cidadãos que já tenham completado 60 anos têm o direito de viajar gratuitamente nos ônibus municipais, lembrei-me da velhinha da fotocópia.
 
Pelo que diz o decreto, a idade é o único critério de atribuição desse benefício. O legislador partiu de um curioso pressuposto que equipara a velhice à pobreza. A meu ver, a (relativa) juventude do prefeito distorce sua visão. Sua premissa não é necessariamente verdadeira. Todo velho não é obrigatoriamente desvalido.
 
Reconheço o preceito de que a sociedade deve amparar seus membros mais frágeis. É a base de todo agrupamento humano. Mas não há que confundir idade madura com precariedade financeira.
O cartão que assegura a gratuidade no transporte deveria ser atribuído unicamente a anciãos que comprovassem encontrar-se abaixo de determinado nível de rendimento e de patrimônio.
 
Do jeito que está, pobre tem de pagar tarifa plena enquanto a velhinha da fotocopiadora viaja de graça.
 
19 de março de 2014
José Horta Manzano

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