É dando que se recebe
O Governo Federal comemora o derretimento do blocão, o grupo de partidos que se uniu na Câmara para derrotá-lo (e que já o derrotou convocando ministros para responder a perguntas que preferiam não ter de ouvir, determinando investigações sobre propinas que funcionários de uma empresa holandesa dizem ter pago à Petrobras, coisas assim).À medida que o Governo usou a caneta para nomear ministros e distribuir cargos, os partidos atendidos deixaram de rosnar e voltaram a ronronar.
Nada como afagos, acompanhados de leite e biscoitinhos.
Só que esta vitória significa uma tremenda derrota: mostrou aos descontentes o caminho das pedras. Agora eles sabem que a gerentona brava e ríspida passa a entender (e atender) pedidos, desde que seja devidamente pressionada. Mais: Eduardo Cunha, o deputado peemedebista que a presidente adora detestar, a quem nem permitia a entrada no Palácio do Planalto, provou que é o líder de verdade dos parlamentares reivindicantes.
Ele não entrou no Planalto; mas foi chamado para uma reunião no anexo do Planalto, com ministros importantes, e de lá saiu como o grande vitorioso.
De agora em diante, temos um Governo obediente às ordens de seus aliados que antes do blocão só tinham o direito de obedecer.
Dilma nomeou quem não queria (e, dizem as más línguas, precisará decorar o nome de alguns que nem conhecia). Teve de engolir a desfeita dos deputados do PMDB (e do próprio Cunha), que nem foram à posse dos novos ministros.
Entre as derrotas e a rendição, Dilma optou pela rendição. E terá mais derrotas.
1 – O PMDB rachou entre senadores (mais próximos de Dilma) e deputados (que se acham preteridos). No meio, Michel Temer, supremo comandante do partido que hoje não comanda. Ele quer continuar vice de Dilma. Talvez consiga.
2 – O pessoal do PMDB que não quer Dilma se divide entre Aécio e Eduardo Campos. Nada pessoal, nada ideológico, nada a ver com programas de Governo: vão ficar com quem tiver mais chances (e mostrar-se mais amigo dos amigos).
3 – O líder do PR na Câmara, Bernardo Santana, rachou com o presidente do partido, Alfredo Nascimento (que foi ministro dos Transportes, acabou caindo na época da tal “faxina ética” e voltou a ter poder no Governo).
Nascimento é Dilma e acusou Santana, um dos comandantes do blocão, de irresponsabilidade. Santana chamou Nascimento de frouxo, por ter sido acusado de ladrão, afastado do Ministério e continuar dilmista. Os deputados do PR estão com o rebelde.
No PDT, o presidente Carlos Luppi é Dilma, ponto. Mas dois símbolos do partido, Christopher e Maria Tereza Goulart, neto e viúva do ex-presidente João Goulart, se sentem explorados politicamente e abrem fogo contra o Governo.
Christopher Goulart, falando da exumação do corpo de seu avô, com espetáculo de TV comandado pela ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, disse na Rádio Guaíba de Porto Alegre: “Passados quatro meses, a ministra Maria do Rosário ainda não mandou para a França o material para os exames. Começo a achar que tudo isto tem efeito político e midiático, já com vistas às eleições de outubro.
A demora no envio pode ter sido proposital, visando elevar o tom quando se aproximar a hora da eleição.”
E Maria Teresa, comentando as promessas de que receberia indenização e pensão: “Fizeram um carnaval na imprensa que iam me pagar. Só recebi parabéns de todo mundo. Dinheiro que é bom, nada”.
Por enquanto, os boatos de que Fernando Henrique poderia ser vice de Aécio são apenas boatos. O ex-presidente, 82 anos, disse que não tem mais idade para candidatar-se. E, presidente eleito duas vezes no primeiro turno, talvez não se entusiasme por um cargo menos importante. Só entraria – talvez – se as pesquisas mostrassem que seu nome seria decisivo na eleição. Hoje não seria. Se saísse para deputado, ajudaria a ampliar a bancada do PSDB. Mas vontade não tem.
O PT, que já tem uma tremenda máquina na Internet, mobilizadíssima para elogiar o Governo e seus aliados e atacar pesadamente os adversários, ainda quer mais: de 18 a 20 de abril, em São José dos Campos, gastará cerca de R$ 400 mil num campus party, para aperfeiçoar sua equipe. “Queremos combater as mentiras”, diz o vice-presidente nacional do PT, Alberto Cantalice. Os criadores do MAV, Militância em Ambientes Virtuais, Franklin Martins, Marcelo Branco e o deputado André Vargas, deverão aparecer. E haverá show dos Racionais MC.
O Setor Técnico do Ministério Público de São Paulo diz que um dos cinco casos de formação de cartel denunciados pela Siemens é falso. É o único do Governo José Serra. OK; mas é preciso examinar os outros quatro, um na gestão Mário Covas, três nas gestões de Geraldo Alckmin. Vale a pena, principalmente, fazer um pente fino na gestão Covas: há o caso do cartel, há o caso do depósito na conta suíça atribuída a seu chefe da Casa Civil, Robson Marinho, e há uma pergunta que tem de ser respondida.
Quem tinha, no Governo, a incumbência de supervisionar e avaliar contratos, para evitar cartéis e superfaturamentos?
19 de março de 2014
Carlos Brickmann é jornalista e consultor de comunicação. Diretor da Brickmann & Associados, foi colunista, editor-chefe e editor responsável da Folha da Tarde; diretor de telejornalismo da Rede Bandeirantes; repórter especial, editor de Economia, editor de Internacional da Folha de S. Paulo; secretário de Redação e editor da Revista Visão; repórter especial, editor de Internacional, de Política e de Nacional do Jornal da Tarde.
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