É da medicina que a atividade cerebral se acelera antes da morte e aquela aparência de frágil debilidade subitamente se transforma em movimentos que, pela vivacidade, impressionam aos que vão levar a extrema unção. Mas é hora da morte: não há como resistir. É escolher a melhor gravata porque, mesmo entre os mortos, há os que se mexem depois da guilhotina.
A situação chegou a um ponto de paroxismo da falta de vergonha que se quer dar agora a impressão de anormal normalidade, pondo-se em votação a agenda das reformas, pretendendo tocar o governo as usual e ganhando tempo em busca de uma saída menos desonrosa.
Parece que, desta vez, o susto foi tão grande que até malas de dinheiro extraviadas nos ingênuos porões da pouca vergonha foram reencontradas, faltando nelas pequena parte reservada para o vinho, afinal também confessadamente devolvida.
A hora é grave e, sem hipérbole, terrível, admitia o velho Negrão de Lima, Ministro da Justiça testemunha da aguda crise do governo Vargas no Palácio do Catete. Agora, os ameaçados ministros se penduram nos foros privilegiados, demitindo, nomeando, ameaçando no interesse do Brasil, enquanto os assessores salvam-se como podem, pulando como ratos no mar de lama.
Outra grave hora chega e, quando o Brasil se vê caindo no abismo da desesperança, deve bater um pouco de juízo na cabeça de quem tem algum papel de liderança. Como dizia o sábio da política: está de vaca não reconhecer bezerro no curral. E, nessas horas, é melhor ter juízo do que fingir de doido de rua, atacando para defender.
Nos bastidores fervilham as apostas: quem será o timoneiro da pinguela até 2018? Muitos ambicionam, ninguém se apresenta “candidato ao doce sacrifício”. Como será? Eleições diretas como a voz das ruas ou indiretas como reza a Constituição? Que saída se dará? A votação do TSE, antes terrível ameaça de cassação da chapa, agora aparece como bóia de honrosa salvação: uma saída pela frente provocada por erros de outros.
Indulto para o presidente? Asilo no Uruguai? Embaixada no Paraguai? Licença para curtir a dor no Equador? Subindo o Maia como controlar o festeiro Ramalho? Reformas às pressas podem acabar como frankensteins mal acabados. Pode-se decretar o recesso do Congresso por falta de compostura e a vacância do governo por falta de assessores. Há uma desconfiança geral de armação, de perdões aos pecados da carne e é melhor botar as barbas de molho.
O maior pecado em política é revelar a verdade antes da hora. O presidente cometeu o pecado do general Castelo Branco ao dizer, cedo demais, que não seria candidato à sucessão. Jogou fora as cartas de negociação e saiu da mesa do poder.
Les jeux sont faits, diria o crupiê vendo a ruína do cassino.
30 de maio de 2017
Eduardo Simbalista
A situação chegou a um ponto de paroxismo da falta de vergonha que se quer dar agora a impressão de anormal normalidade, pondo-se em votação a agenda das reformas, pretendendo tocar o governo as usual e ganhando tempo em busca de uma saída menos desonrosa.
Parece que, desta vez, o susto foi tão grande que até malas de dinheiro extraviadas nos ingênuos porões da pouca vergonha foram reencontradas, faltando nelas pequena parte reservada para o vinho, afinal também confessadamente devolvida.
A hora é grave e, sem hipérbole, terrível, admitia o velho Negrão de Lima, Ministro da Justiça testemunha da aguda crise do governo Vargas no Palácio do Catete. Agora, os ameaçados ministros se penduram nos foros privilegiados, demitindo, nomeando, ameaçando no interesse do Brasil, enquanto os assessores salvam-se como podem, pulando como ratos no mar de lama.
Outra grave hora chega e, quando o Brasil se vê caindo no abismo da desesperança, deve bater um pouco de juízo na cabeça de quem tem algum papel de liderança. Como dizia o sábio da política: está de vaca não reconhecer bezerro no curral. E, nessas horas, é melhor ter juízo do que fingir de doido de rua, atacando para defender.
Nos bastidores fervilham as apostas: quem será o timoneiro da pinguela até 2018? Muitos ambicionam, ninguém se apresenta “candidato ao doce sacrifício”. Como será? Eleições diretas como a voz das ruas ou indiretas como reza a Constituição? Que saída se dará? A votação do TSE, antes terrível ameaça de cassação da chapa, agora aparece como bóia de honrosa salvação: uma saída pela frente provocada por erros de outros.
Indulto para o presidente? Asilo no Uruguai? Embaixada no Paraguai? Licença para curtir a dor no Equador? Subindo o Maia como controlar o festeiro Ramalho? Reformas às pressas podem acabar como frankensteins mal acabados. Pode-se decretar o recesso do Congresso por falta de compostura e a vacância do governo por falta de assessores. Há uma desconfiança geral de armação, de perdões aos pecados da carne e é melhor botar as barbas de molho.
O maior pecado em política é revelar a verdade antes da hora. O presidente cometeu o pecado do general Castelo Branco ao dizer, cedo demais, que não seria candidato à sucessão. Jogou fora as cartas de negociação e saiu da mesa do poder.
Les jeux sont faits, diria o crupiê vendo a ruína do cassino.
30 de maio de 2017
Eduardo Simbalista
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