"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 14 de junho de 2016

QUEM É QUEM NO DRAMA BRASILEIRO?

“Eles”, os “nós” dos comícios do Lula, estes continuam sem crise como sempre. São regidos por leis e julgados por tribunais que só valem para eles

Como uma trovoada distante o aumento de R$ 59 bilhões do funcionalismo relampejou no céu do “jornalismo de acesso” e logo se apagou quase sem ruído. 
Não se sobrepôs sequer à “propina” do dia esse prêmio aos culpados que aumentou em 1/3 a pena de quase 200 milhões de inocentes. Lindbergh Farias, Fernando Collor, Vanessa Grazziotin, Eduardo Cunha e sua gangue, Jandira Feghali, Sérgio Machado, todos suspenderam por um minuto as hostilidades para apertar juntos o “sim”. 
E o “dream team” engoliu com casca e tudo essa terça parte do maior déficit de todos os tempos na largada da missão impossível para deter a mais desenfreada corrida de volta à miséria da história deste país. 
Tudo tão discreto que a manobra mal foi percebida na fila de seis meses de espera pelo exame de câncer do SUS, que é onde se “zera” esse tipo de fatura.

Quantos serão, dentre os 11,1 milhões de funcionários que comem 45% do PIB, aqueles que Ricardo Paes de Barros afirma que pesam o bastante para distorcer a média nacional de desigualdade de renda? 
Quanto custam os “auxílios” todos que o Imposto de Renda lhes perdoa? 
E os “comissionados” que mais que dobraram o gasto público sem que mudasse um milímetro a quase miséria dos médicos e professores concursados? 
Como vivem os aposentados e pensionistas sem cabelos brancos que, 900 mil apenas, pesam mais que os outros 32 milhões que pagaram Previdência a vida inteira somados?
Quanto, afinal de contas, o Brasil com “lobby” suga do Brasil sem “lobby”? 

A esta altura do desastre, todo debate que se desvia dessa pergunta é enganação; toda pauta que não se oriente por essa baliza da desigualdade perante a lei é uma traição aos miseráveis do Brasil.

O mais é circo. Eduardo Cunha e o PT nos provam, acinte por acinte, o quão livre e indefinidamente se pode escarnecer da lei neste país, desde que se esteja posicionado na altura certa da hierarquia corporativista. 
Variam as razões alegadas para se locupletar, mas ninguém nega que é disso mesmo que se trata. 
São meses, são anos – são séculos, considerado o Sistema desde o nascimento – desse joguinho de sinuca silogística invocando pedaços de fatos para negar os fatos, meias-verdades para servir à mentira, cacos de leis para legalizar o crime e o país inteiro esperando para ver o que vai sobrar.

O jogo é esse porque nós o aceitamos. Não faz muito o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação fez a compilação: até 2014, já tinham sido editadas 4.960.610 leis e variações de leis para enquadrar nossa vida do berço ao túmulo desde que a Constituição foi promulgada, em 1988. 522 a cada 24 horas destes 27 anos. 320.343 eram normas tributárias, 46 novas a cada dia útil!

É este o truque: quem pode estar em dia com tudo isso no país onde a única função discernível do aparato legal é tornar impossível de cumpri-lo?

Não fazer sentido é o elemento essencial do Sistema. Daí a palavrosidade oca valer mais que os fatos nos nossos plenários e nos nossos tribunais. 
Se houvesse um meio racional de escapar, uma forma segura de se prevenir, uma regra que pudesse ser cumprida, perdia-se o caráter de onipotência da autoridade constituída. 
Tem de ser irracional. Tem de ser impossível de escapar deste “vale de lágrimas” a não ser pela unção dos “excelentes” com ou sem batina, ou toda essa indústria se esboroa. É ao que sempre estivemos acostumados…

Esboça-se uma resistência, mas ela é isolada. Só vai até onde pode ir o pedacinho são da 1.º instância do Judiciário. E quem mais a saúda é quem mais a apunhala. Até agora, nem de leve foi arranhada a isenção a essa condição de permanente exposição à chantagem em que vivemos para os que a desfrutam por pertencer a corporações privilegiadas. 

A “lista de Teori” continua trancada e secreta. Foram afastados, sujeitos a confirmação, os que destruíram a obra de toda uma geração, mas não por isso; porque ficou claro que sua permanência implicaria a morte da galinha-dos-ovos-de-ouro. Mesmo assim, vultos sinistros nadam por baixo da decisão final do Senado. Só quem desafia a hierarquia do Sistema está sob ameaça real de remoção. Até Teori é objeto de chantagem. Mas o Sistema mesmo nunca esteve em causa.

Os “grandes empresários”? Estes jamais estiveram realmente isentos. “Culpados”por definição como somos todos e eles, mais que os que jogaram menos, são os“hereges” da vez. Festeje-se com realismo, portanto. Neste nosso modelo lusitano o Tesouro Real sempre saiu dos seus apertos com grandes Autos-de-Fé em que redevora as “nobrezas” que fabrica.

“Eles”, os “nós” dos comícios do Lula, estes, sim, continuam sem crise como sempre. São regidos por leis e julgados por tribunais que só valem para eles. Têm regimes de trabalho, remuneração e aposentadorias só seus. Entram no seu bolso a qualquer hora e sem pedir licença.

Dessa casta fazem parte réus e juízes da presente refrega. Desde que a corte de d. João VI desembarcou no Rio de Janeiro chutando os brasileiros para fora de suas casas, seguem, todos, deitados no berço esplêndido da indemissibilidade para todo o sempre que se auto-outorgaram, tão “blindados” que já nem uns conseguem expulsar os outros quando a disputa pelos nossos ossos os leva a considerar exceções à sua regra de ouro. 
Reagem com fúria se alguém tenta devassar-lhes os segredos, vide Gazeta do Povo x Judiciário; Estadão x Sarney.

O “ajuste” começa pelo ajuste do foco. Por mais heroico que seja o esforço, não se porá o país na reta correndo atrás de tudo o que essa máquina de entortar fabrica em série. Deixada como está, fará do herói de hoje o bandido de amanhã, sejam quantas forem as voltas no mesmo círculo. 

É preciso rever a conta que está aí pela ótica da igualdade perante a lei e, a partir daí, inverter, de negativo para positivo, o vetor primário das forças que atuam sobre o Sistema. 
O voto distrital com “recall” acaba com essa indemissibilidade e, com isso, põe o poder nas mãos do povo. Daí por diante tudo passa a ser feito pelo povo e para o povo.

Aí, sim, funciona.


14 de junho de 2016
Fernão Lara Mesquita

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