"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 6 de abril de 2016

VALENTINA DE BOTAS: "SE MANCA, LETÍCIA"

Se Letícia Sabatella procurar acertos de Dilma Rousseff nas farmácias dos hospitais públicos abastecidas pelo SUS, ou nos dados de segurança pública pertinentes à administração federal, nos projetos de saneamento básico ou nas políticas públicas para erradicar a prostituição infantil e a leishmaniose tegumentar, não os encontrará. Os acertos, segundo a Lava Jato, deram-se com os operadores do Petrolão.

Mas a que erros Sabatella alude em “Não querem tirar Dilma pelos erros, mas pelos acertos”? O único erro de Dilma foi tornar-se ministra e candidatar-se à presidência; depois disso não errou mais, só delinquiu. Se manca, Letícia, é crime até mesmo usar o Planalto para tal estroinice de ataque contra uma nação indignada.

Um reiterado crime da presidente flagrada no gozoso jeito lulopetista de governar que faz do gangsterismo um instrumento de Estado. Isso não vigoraria sem um zeitgeist mal-assombrado que anima a desqualificação dos indignados numa linguagem odiosa, cercada pelo silêncio convergente, que agora os chama golpistas.

Os artistas, intelectuais e jornalistas criativos (nem falo do JEG), calados a respeito, passaram a acusar o ódio e o radicalismo de quem está farto de ser tratado de modo radicalmente odioso. A frase de efeito da Sabatella teve o efeito pilantra de sugerir que os pró-impeachment não queremos um Brasil são, mas foi o bando integrado por Dilma que sempre rejeitou, como oposição e governo, o saneamento do país.

A atriz adere à novilíngua que, aprendemos em Orwell, não é uma língua nova, mas um uso novo do significado que vai habitar outro significante por imposição do pensamento aprisionado na ideologia à prova de luz e ar; vigarice que, na voz melíflua de Sabatella, vigarice permanece. O verbo na terceira pessoal do plural sem a referência a nenhum termo anteriormente identificado indetermina o sujeito nas frases em português, mas o “querem” da Sabatella abriga 80% de brasileiros determinados a se livrarem da súcia e dessa metafísica que lhe dá suporte filosófico-estético, um lixo com jeito bacana de coisa progressista.

Somos o “eles” indeterminado na novilíngua da escória para quem a nação é coisa difusa e desimportante obrigada a custear o nós-escória incluindo os capangas de Boulos e Stédile que a ameaçam se a lei for cumprida. O que farão os exércitos imaginários de delinquentes reais? Não sei se avançarão além do que já fazem impunes as minorias fascistoides opressoras da maioria pacífica.

O que sei é que a truculência delas tem suporte na metafísica que ataca a lei e a verdade nas declarações e atitudes pró-governo ecoadas por certo jornalismo, como o editorial da Folha de domingo pretendendo apenas substituir a Constituição. Sem que haja nada consistente contra o vice-presidente, o jornal repele a solução constitucional na posse de Temer e quer eleições porque ele é impopular, os crimes de Dilma não estão cabalmente (!) comprovados, o impeachment deixaria ressentimentos (sic).

Ora, quando aderiu ao impeachment de Collor, o jornal não cobrou popularidade de Itamar Franco; não refutou os crimes apontados; e não temeu mágoas remanescentes. É que vale qualquer disparate contra a Constituição para resguardar um governo mafioso (os erros), mas de esquerda (o acerto) – eis do que se trata.

Juristas contra a lei, intelectuais contra o pensamento, artistas contra a dissidência e jornalistas defendendo essa porcaria, todos embotados no nauseabundo esquerdismo que determina o lado da verdade e da lei quando a verdade e a lei, com erros e acertos, só têm um lado: o da verdade e o da lei. Se manca, Letícia.



06 de abril de 2016
Revista Veja - Coluna do Augusto Nunes

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