"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 6 de abril de 2016

MUDAMOS NÓS?

Outro dia, os contemporâneos de 1964 se surpreenderam com um acontecimento havido no Palácio do Planalto, sede do poder nacional. 

A TV transmitiu um encontro marcado entre a presidente da República e demais corifeus de Estado com os integrantes de movimentos sociais que atendem pelo chamado de sem terra, de sem teto e de num sei mais o quê, acompanhados do presidente da CUT. 

Os convidados do protocolo (mais de mil) ocuparam o recinto e, com faixas e bandeirolas manifestavam-se com um e outro aparte não autorizado, erguiam os braços e se declaravam a favor da presidente. 

Pois bem. Ou a nossa democracia não é mais aquela flor tenra a que se referia Otávio Mangabeira, que exige cultivo e cuidado permanentes, ou confiamos em que a CUT falou por falar, uma bravata (Deus queira), não seria capaz de concretizar suas ameaças. 

Em 1964, aliás, por muito menos que esta sessão de ontem, o alarido pelo comício da Central do Brasil (quando os meios de comunicação ainda engatinhavam), e mais os anarquistas que exacerbaram o ambiente político, consta como o marco de detonação do movimento armado que então se desencadeou.
 
Hoje, o representante deles fechou a solenidade falando por todos, quase colérico, com gestos e punhos ameaçadores (como de sempre) e afirmou que os movimentos sociais constituirão “o exército que vai enfrentar essa burguesia de hoje”. 

O falastrão ainda adicionou a seu “recado” que “o preconceito de classe contra eles implicaria em irem para as ruas, entrincheirados com arma não mão e lutar se tentarem tirar a presidente”. 

E foi delirantemente aplaudido pela assistência, com direito a beijinho protocolar da dona da festa e demais cumprimentos cerimoniais de personalidades e acólitos presentes. 

Mudamos nós ? É com a lembrança de 64 que assistimos a este ato que fere o Estado, a verdadeira democracia e a Constituição. O que vimos compôs um atentado à ordem constitucional e à República. Mas não repercutiu aquele ato audacioso e provocativo. 

Pelo Exército, falou prontamente o Presidente do Clube Militar. E ninguém mais disse algo que demonstrasse o desrespeito daquela turma aguerrida confrontando os nossos tradicionais valores civis.

A presidente, a seu turno, não se manifestou sequer para adverti-lo. 
A ameaça do orador, na sede do poder, no chão onde devia imperar a ordem e o respeito ao país, que foi igualmente ofendido, prestou-se a incitação às armas, como se revolucionário fosse. 
Nesta solenidade, transcorrida não com apelos mas com ameaças ostensivas, seria o bastante para recolher o infrator à prisão.

Contudo, para as autoridades que se encontram debruçadas sobre o exame do impeachment, esta ocorrência vai selar a sentença de que, não fossem procedentes os motivos que sustentam o pedido, o compromisso da nação é com a legalidade, a Constituição e a ordem, e o atual governo não mais possui a mínima condição de retomar a confiança que o abateu, e a cartilha a que obedece para chefiar a administração pública não é a dos nossos sonhos.

A lucidez aponta para o afastamento definitivo da presidente. Falta seu vice, hoje assistindo solertemente a cena. Ambos, PT e PMDB, são os responsáveis pela voragem que atirou o Brasil no abismo.


06 de abril de 2016
José Maria Couto Moreira é advogado.

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