O Brasil está em momento que exige decisão. Precisa agir rápido para reverter o desastre estrutural implantado, desde há quase 62 anos, que se completam em 24 de agosto próximo, data do golpe de Estado de 1954, a partir do qual a desnacionalização da economia não cessou de aumentar.
Essa desnacionalização está na raiz da desindustrialização, da apartheid tecnológica de que o País padece crescentemente, da galopante dívida pública e do impressionante passivo externo bruto, de US$ 2,2 trilhões (equivalente a R$ 8 trilhões, o dobro da dívida interna e perto do dobro do PIB).
A perversidade do processo ilustrada por esses números pode ser visualizada de forma ainda mais contundente, ao se considerar que o brutal endividamento não decorreu de investimentos para melhorar alguma coisa no País. Ao contrário, o arruinamento financeiro aconteceu simultaneamente com a devastação do capital humano e a dos recursos não renováveis e dos renováveis.
No referente à destruição do meio-ambiente fala-se muito pouco do uso abusivo e poluidor das águas, praticado na agricultura do agronegócio, em numerosos setores da indústria e sobre tudo na exploração mineral. Tudo isso para realizar exportações muito mal pagas, como se verifica através dos 340 bilhões de dólares de déficits acumulados nos últimos cinco anos.
Igualmente ignorada, a destruição de seres humanos - não só através da violência, mas da miséria e da falta de perspectiva - deveria reclamar que se entendam, e desse modo, se eliminem as causas que a geram em números alarmantes e crescentes.
A longa estagnação do produto nacional bruto, desde as décadas perdidas, iniciadas nos anos 80 – de resto, indissociável das gestões dos governos anteriores a ela – transformou-se recentemente em queda continuada.
E, quando se noticia a taxa de crescimento negativa do PIB (produto interno bruto) de 3,8 % aa. , em 2015, deveria estar claro que o poder aquisitivo da classe média e dos mais pobres que esta, caiu muitíssimo mais que do que esses 3,8 % aa., a taxa do conjunto da economia.
De fato, no conjunto, tem peso cada vez maior o setor financeiro, em que avultam os grandes bancos (aumentos em 2015 : Banco do Brasil 28%, Itaú 15,4%, Bradesco 13,9%), além dos carteis transnacionais e demais rentistas, cujos fabulosos lucros prosseguiram, em 2015, crescendo a taxa média próxima a 20% aa.
Bem, que a crise é muito grave está claro. O que precisa ser esclarecido é que suas causas principais são estruturais. Portanto, além de não haver como afastá-las mediante a desestabilização e destituição, em curso, da enfraquecida e insatisfatória presidente, é certo que elas seriam agravadas com a investidura de qualquer dos sucessores previstos pela Constituição.
Para remover as causas do desastre, é indispensável: 1) pelo menos, algumas pessoas capazes de exercer liderança, as entenderem; 2) essas pessoas ganharem poder para instituir regime dotado de autonomia nacional e independente de interesses especiais.
Vai em direção diametralmente oposta a essa o golpe de Estado, em curso, que visa a substituir a presidente da República e proceder à eliminação política de Lula, deixando o País sem alternativa alguma à radicalização do processo de desestruturação econômica, política e social.
Não que Lula e o PT sejam, ou sequer tivessem sido, alguma vez, alternativa real, pois pouco passaram de um recurso dos organizadores alienígenas da implantação do caos, quando estes frustraram - mediante fraudes, corrupção, injeção de dinheiro na política e na mídia - qualquer chance que ainda pudesse ter o trabalhismo liderado por Leonel Brizola.
De fato, a ditadura entreguista – mal disfarçada de democracia - vem sendo implantada passo a passo, cumprindo roteiro e planejamento baseados na lógica imperial, de acordo com a qual as concessões obtidas permitem ganhar terreno, proporcionando além de vantagens imediatas – a ocupação de espaço e poder para extorquir novas concessões.
As administrações petistas, apesar de adotarem muitas iniciativas e medidas dignas de apoio, basicamente deram continuidade à desestruturação entreguista e financeirista, vertiginosamente realizadas nos governos de Collor e FHC.
Mas a desestabilização do PT decorre de coisas como estas: 1) dos ganhos que os mentores do golpe pretendem auferir, atribuindo só à mais recente administração desgraças que decorrem principalmente de deformações estruturais gestadas ao longo dos últimos 62 anos; 2) ter feito investimentos em áreas estratégicas, como petróleo, defesa, apoiado empresas brasileiras em obras e no exterior e se aproximado dos BRICS.
23 de março de 2016
Adriano Benayon é doutor em Economia, pela Universidade de Hamburgo, Alemanha; autor de Globalização versus Desenvolvimento.
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