Com a carta-testamento, Getúlio Vargas saiu da vida para entrar na história. Com a carta-renúncia, José Genoino saiu da vida política para entrar no histórico da Papuda
Em 2002, obediente a determinações do PT, o deputado federal José Genoino trocou uma reeleição garantida para o sexto mandato parlamentar consecutivo pela candidatura sem chances ao governo de São Paulo.
O tucano Geraldo Alckmin reelegeu-se sem sobressaltos. Mas a performance do adversário superou amplamente o desempenho dos companheiros que o precederam na tentativa de conquistar o mais sólido reduto do PSDB.
Genoino foi o primeiro petista a forçar a realização de um segundo turno na disputa do Palácio dos Bandeirantes. E os 8,5 milhões de votos (41% do total) abrandaram a frustração reservada aos perdedores.
“Faço questão de te cumprimentar, companheiro Genoino, pela votação extraordinária”, abraçou-o o presidente eleito no comício da vitória promovido na Avenida Paulista. “Daqui a quatro anos, você vai ganhar a eleição. Pode ter certeza, você vai ser governador de São Paulo”.
Lula e o premiado com a profecia nem desconfiaram do que aconteceria depois de aparecer um mensalão no meio do caminho. Nenhum dos dois pressentiu que o ieleitorado de Genoino, em permanente expansão desde a estreia nas urnas de 1982, seria progressivamente desidratado pelo escândalo descoberto em meados de 2005 — até sucumbir de vez à inanição.
Já na eleição de 2006, os 306.988 votos obtidos oito antes despencaram para 98.729. Voltou à Câmara entre os últimos da fila. Em 2010, com minguados 92.362 votos, foi rebaixado a suplente.
Negociou uma vaga no balcão de compra e vendas do Congresso, e voltou pela porta dos fundos. Condenado por corrupção ativa e formação de quadrilha pelo Supremo Tribunal Federal, o presidente do PT do Mensalão incorporou-se à bancada dos parlamentares presidiários. Ameaçado pela cassação, demorou a descobrir que não escaparia da degola. Nesta terça-feira, enfim renunciou ao mandato.
A morte política não ocorre antes da morte física, consola-se gente aparentemente aposentada pelas urnas, repetindo a frase que vem sempre acompanhada da evocação de ressurreições consideradas impossíveis. O exemplo mais lembrado é o de Getúlio Vargas. Derrubado em 1945, o ditador condenado ao ostracismo não se limitou a regressar ao Catete nos braços do povo, como presidente constitucional: também sobreviveu ao suicídio e seguiu decidindo eleições.
O palavrório usado para formalizar a renúncia sugere que Genoino encomendou o texto pensando no mais importante personagem do Brasil republicano.
Ele se recusa a acreditar que, neste crepúsculo de 2013, foi consumada a morte política sem remédio.
A dramática carta de Getúlio foi escrita por alguém que saía da vida para entrar na História. A patética carta de Genoino foi o último suspiro do mensaleiro obrigado a sair da vida pública política para entrar no histórico do presídio da Papuda.
04 de dezembro de 2013
Augusto Nunes
O tucano Geraldo Alckmin reelegeu-se sem sobressaltos. Mas a performance do adversário superou amplamente o desempenho dos companheiros que o precederam na tentativa de conquistar o mais sólido reduto do PSDB.
Genoino foi o primeiro petista a forçar a realização de um segundo turno na disputa do Palácio dos Bandeirantes. E os 8,5 milhões de votos (41% do total) abrandaram a frustração reservada aos perdedores.
“Faço questão de te cumprimentar, companheiro Genoino, pela votação extraordinária”, abraçou-o o presidente eleito no comício da vitória promovido na Avenida Paulista. “Daqui a quatro anos, você vai ganhar a eleição. Pode ter certeza, você vai ser governador de São Paulo”.
Lula e o premiado com a profecia nem desconfiaram do que aconteceria depois de aparecer um mensalão no meio do caminho. Nenhum dos dois pressentiu que o ieleitorado de Genoino, em permanente expansão desde a estreia nas urnas de 1982, seria progressivamente desidratado pelo escândalo descoberto em meados de 2005 — até sucumbir de vez à inanição.
Já na eleição de 2006, os 306.988 votos obtidos oito antes despencaram para 98.729. Voltou à Câmara entre os últimos da fila. Em 2010, com minguados 92.362 votos, foi rebaixado a suplente.
Negociou uma vaga no balcão de compra e vendas do Congresso, e voltou pela porta dos fundos. Condenado por corrupção ativa e formação de quadrilha pelo Supremo Tribunal Federal, o presidente do PT do Mensalão incorporou-se à bancada dos parlamentares presidiários. Ameaçado pela cassação, demorou a descobrir que não escaparia da degola. Nesta terça-feira, enfim renunciou ao mandato.
A morte política não ocorre antes da morte física, consola-se gente aparentemente aposentada pelas urnas, repetindo a frase que vem sempre acompanhada da evocação de ressurreições consideradas impossíveis. O exemplo mais lembrado é o de Getúlio Vargas. Derrubado em 1945, o ditador condenado ao ostracismo não se limitou a regressar ao Catete nos braços do povo, como presidente constitucional: também sobreviveu ao suicídio e seguiu decidindo eleições.
O palavrório usado para formalizar a renúncia sugere que Genoino encomendou o texto pensando no mais importante personagem do Brasil republicano.
Ele se recusa a acreditar que, neste crepúsculo de 2013, foi consumada a morte política sem remédio.
A dramática carta de Getúlio foi escrita por alguém que saía da vida para entrar na História. A patética carta de Genoino foi o último suspiro do mensaleiro obrigado a sair da vida pública política para entrar no histórico do presídio da Papuda.
04 de dezembro de 2013
Augusto Nunes
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