No mês de outubro, quando o relatório da OCDE sobre o Brasil foi divulgado, o nosso Ministro da Fazenda falou o seguinte:
“O Brasil é um dos países com o maior superávit primário, economia para pagamento de juros da dívida pública. Mesmo em momento de crise, mantivemos um desempenho fiscal satisfatório”.
Na mesma linha, o Secretário de Política Econômica, Márcio Holland, falou em outubro que:
“O FMI carrega muito nessa discussão fiscal desnecessariamente. O principal problema deve estar em outros países, que estão sofrendo com relação entre dívida e PIB de mais de 100% do PIB. O Brasil tem uma relação de dívida bruta em torno de 59% ….”
Há que se ter cuidado com essas declarações por dois motivos.
Primeiro,
se tivéssemos com um superávit primário (sem truques) por volta de 2,5% do PIB e com a economia crescendo por volta de 3,5% ao ano, poderíamos ficar relativamente tranquilos. Esse não é o nosso caso. O Brasil está com um superávit primário por volta de 1,5% do PIB , com uma economia crescendo próximo a 2% ao ano.
Dada a nossa elevada conta de juros do setor público de 5% do PIB e o baixo crescimento, o nosso superávit primário não é mais suficientemente elevado para sinalizar uma queda consistente da dívida pública. Vale lembrar que se hoje a diferença entre a divida liquida e bruta do setor público fosse a mesma de 2007, a nosso divida bruta deveria estar próxima a 47% do PIB e não perto de 60% do PIB. Aumentamos fortemente a divida bruta por decisão de política econômica.
Segundo,
o mercado não nos olha como Alemanha,
EUA,
Espanha,
França
ou Reino Unido (Tabela 1).
Esses países têm dívida bruta superior a 80% do PIB, mas uma conta de juros do setor público entre 2,2% e 2,5% do PIB (dados de 2012). Se eles crescerem 2% ao ano, uma taxa razoável dado que se trata de países desenvolvidos, o esforço fiscal que eles têm que fazer será muito inferior ao do Brasil que gasta mais do que o dobro com juros.
Tabela 1 – Dívida Bruta e Conta de Juros do Setor Público (% do PIB) – 2012
Fonte: FMI
O mercado não nos olha nem mesmo como Portugal,
Itália,
Irlanda
e Grécia;
que têm uma conta de juros mais próxima a nossa para um nível de endividamento que é quase o dobro (Tabela 2).
O mercado nos olha como a Índia, que tinha em 2012 uma divida bruta de 66,7% do PIB, ante 68% do PIB para o Brasil pelo critério do FMI, e uma conta de juros de 4,4% do PIB ante 4,9% do PIB para o Brasil, em 2012.
Tabela 2 – Dívida Bruta e Conta de Juros do Setor Público (% do PIB) – 2012
Fonte: FMI
Em resumo, para o nosso nível de renda, o Brasil tem uma dívida elevada (68% do PIB em 2012 pelo critério do FMI) e pagamos uma conta de juros alta (5% do PIB). Temos um histórico de calotes (se lembram do Plano Color), inflação elevada e não estamos ainda na categoria de países que se dão ao luxo de ter uma divida alta (acima de 80% do PIB) e uma conta de juros baixa inferior a 2,5% do PIB.
E por que não baixar os juros do Brasil na marra?
Bom, tentamos isso recentemente não foi?
vale lembrar que nossa dívida é preponderantemente financiada no mercado doméstico e, assim, não podemos nem mesmo culpar o resto do mundo.
Mas para um País que já precisa e vai precisar ainda mais da poupança do resto do mundo para crescer, não vamos conseguir pagar juros reais de 2% na marra.
Assim, teremos que continuar fazendo um esforço fiscal relativamente elevado (superávit primário entre 2% a 2,5% do PIB) para reduzir a nossa divida bruta para uma faixa inferior a 50% do PIB para começarmos a sonhar com uma conta de juros do setor público e um esforço de superávit primário menor.
Se fizermos o dever de casa, em algum momento poderemos cometer alguns dos excessos dos países desenvolvidos. Até lá é melhor nos compararmos aos demais países emergentes e, por essa comparação, a nossa dívida bruta, mesmo pelo nosso critério de 60% do PIB, é muito maior que a média dos países emergentes (35% do PIB).
Transcrito do original
04 de dezembro de 2013
Blog do Mansueto Almeida
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