"Ninguém, com um mínimo de lucidez, poderia descer os corredores de Bruxelas sem ter a sinceridade de reconhecer que isso não funciona"
A perspectiva (mas, ainda assim, não a certeza) do Brexit concentrou as mentes dos líderes europeus. Suas mentes, infelizmente, são de mediocridades. Não sou eu quem diz isso, mas Laurent Wauquiez, o ex-ministro francês para os Assuntos Europeus no governo do presidente Nicolas Sarkozy e possível futuro candidato à presidência francesa. Ele está em posição de saber. "Eu achei que a Europa precisava de um eletrochoque", Wauquiez disse em uma entrevista pós-Brexit no Libération. "A Europa descontenta seus povos. Todo mundo sabe. Mas a atual classe política, com a sua profunda mediocridade, não fez nada para isso ser mudado".
Perguntado se teria votado pela saída (ele tinha pensado em dar uma mão à campanha pela saída da UE antes do referendo), ele respondeu: "Eu não sou britânico. Vamos ter a clareza de reconhecer que o resultado teria sido o mesmo em qualquer outro país da UE. Talvez uma rejeição ainda maior na França." Falando de sua própria experiência, em Bruxelas, ele disse: "Meu tempo no Ministério dos Assuntos Europeus foi um choque, um confronto com a realidade. Ninguém, com um mínimo de lucidez, poderia descer os corredores de Bruxelas sem ter a sinceridade de reconhecer que isso não funciona".
Qual é a solução de Wauquiez? Seria abandonar tudo, exceto como uma zona de livre comércio, como os britânicos foram enganados mais de 40 anos atrás para acreditar que seria desta forma? Não: ele acredita na expulsão de 15 a 20 dos Estados membros e a formação de um núcleo duro de 7 a 12 outros "prontos para aceitarem uma harmonização dos impostos e regulamentos sociais... O núcleo duro deve excluir impostos e dumping social (1)".
Parece ter escapado à atenção da Wauquiez que sua proposta exigiria que a França abandonasse a sua semana de trabalho de 35 horas (a tentativa de fazê-lo pelo governo de François Hollande já causou semanas de distúrbios) ou que ela seja imposta à Alemanha. Esta seria a melhor receita para provocar hostilidade franco-alemã, se não fosse o ministro francês da economia, Emmanuel Macron, ter proposto recentemente uma melhor: a saber, que os alemães adotassem "solidariedade" fiscal com o resto da Europa, pagando dívidas e déficits de todo mundo. De acordo com Wauquiez, as diferenças de política não são concorrência, são dumping.
Enquanto isso, do outro lado do espectro político – se é que realmente isso possa ser chamado de espectro – Arnaud Montebourg, ex-ministro da economia de Hollande e outro possível candidato presidencial, foi ainda menos elogioso sobre a UE que Wauquiez. "O [Brexit] é um choque para a Europa, mas previsível", disse ao Le Monde. "Por 20 anos, cada vez que as pessoas eram consultadas, expressavam sua rejeição à construção da Europa, uma vez que lhes foi imposta... A construção da Europa, como tem sido feita é anti-democrática". Montebourg culpa "um projeto extremista liberal", pelo que ele quis significar liberal no sentido econômico. "Os franceses votaram em 2012 no programa da esquerda francesa", disse ele. "E conseguiram a política da direita alemã." Alguém tem um palpite quanto ao porquê?
Para Montebourg, a União Europeia "é como uma empresa falida. Se não for reestruturada, vai morrer." Ele sugere um retorno às fronteiras nacionais reais, a redução do número de burocratas europeus em 97%, o fim da tendência para regular o teor de cacau de chocolate ou o mercado de queijo de cabra, o retorno dos poderes de emissão de dinheiro aos bancos centrais dos diversos países (mantendo o Euro), e uma aliança dos gafanhotos (França, Espanha e Itália) contra a grande formiga má, Alemanha. Que maneira maravilhosa de promover a paz e a harmonia entre a França e seu vizinho do outro lado do Reno!
Com a totalidade das soluções de Montebourg, pode-se perguntar que necessidade havia de uma união, em vez de uma mera zona de livre comércio tal como os britânicos sempre disseram que queriam. Mas isso é esquecer o slogan no emblema nacional haitiano, lunion fait la force – a união faz a força. Claro, isso ainda não funcionou muito bem para o Haiti.
(1) O "dumping social" caracteriza-se pela adoção de práticas desumanas de trabalho, pelo empregador, com o objetivo de reduzir os custos de produção e, assim, aumentar os seus lucros.Trata-se de descumprimento reincidente aos direitos trabalhistas, capaz de gerar um dano à sociedade e constituir um ato ilícito.
05 de julho de 2016
THEODORE DALRYMPLE
Publicado no City Journal.
Tradução: William Uchoa
Publicado no City Journal.
Tradução: William Uchoa
Divulgação: Papéis Avulsos - http://heitordepaola.com
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