"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 5 de julho de 2016

NA BATALHA DO PLEBISCITO DO REINO UNIDO, OS VELHOS DERROTARAM OS JOVENS



Reino Unido tem hoje muitos velhos e poucos jovens
















Antes de mais nada, uma correção: os idosos, ou terceira idade ou melhor idade. Mas o certo é que a saída da Inglaterra da Comunidade Europeia pode ser vista sob muitos ângulos. 
Escolhi o mais intrigante: o da guerra geracional. Me baseio num fato real, que foi a ligação desesperada de uma neta, em Londres, para sua avó, que mora numa pequena cidade ao norte do país, pedindo que ela votasse a favor da permanência do país na Comunidade Europeia, mas recebeu a resposta: “Não!” 
A avó alegou que quer a Inglaterra antiga de volta, sem os poloneses arando os campos, sem os indianos e asiáticos tomando seu lugar na fila do médico, sem paquistaneses tomando cerveja no seu “pub” nem torcendo para seu time.
Quer que falem o inglês que ela entenda no supermercado e que possa sair na rua e não ver véus muçulmanos ou hindus barbados. Enfim, quer o passado de volta. Saudosa, talvez, de tempos vitorianos de um Reino Unido em cujas colônias o sol não se punha, ainda que lordes e duques extraíssem todas as riquezas, explorassem seus povos, escravizassem seus súditos, enquanto impávidos e arrogantes, tomassem seu “chá das cinco”.
Como se sabe, a Inglaterra envelheceu e jovens são minoria. Cada vez com menos filhos, a pirâmide inverteu. “Mas vó, pense em nós, seus netos e bisnetos, que perderemos 27 nacionalidades, se sairmos da zona do euro, vó. É o nosso futuro!” Silêncio no smartphone… E a avó arremata: “Estou te livrando de se casar com um imigrante de cor ou ter um polaco ou albanês como vizinho.”
PASSADO E FUTURO – E assim, com o voto dos idosos, dos habitantes rurais e de pequenas cidades, o passado derrotou o futuro: o Reino Unido saiu da Comunidade Europeia! A tradição nocauteou a globalização, o radicalismo preponderou sobre o liberalismo. Um abismo se abre entre gerações, a intolerância bate às nossas portas. Literalmente, o império contra-ataca. Desprezaram os mais velhos, trocaram o passeio dominical da casa dos avós, pois lá não tinha Wi-Fi ou roteador ou o sinal era péssimo. Pois, agora, vovó disse: está de castigo, fique em casa, acabou essa de querer ter 27 moradas!
Não sei como o mundo será após o Reino Unido (aliás totalmente desunido, já que Escócia e Irlanda do Norte votaram pela permanência na Europa, e Gales, como a Inglaterra, pela saída) separar-se do continente. Historicamente, sempre se orgulharam de serem ilhas poderosas com frotas de navios conquistadores, embora sempre fossem em socorro aos aliados em grandes guerras. O mundo está se desintegrando tão rapidamente, os extremos se digladiando, os usos e costumes tão frouxos, noção de ética e moral tão relativizadas que usar o termo “semelhante” para descrever seres humanos soa tão irônico e falso quanto nota de três reais.
É TUDO TÃO BANAL… – Terrorismo, Estado Islâmico, guerra civil na Síria, imigrantes e refugiados morrendo aos milhares. Nada disso nos abala mais. Falar de fome, miséria, corrupção generalizada, desemprego, intolerância racial ou religiosa e tantas outras tragédias se tornou tão banal, que nos alienamos refugiados em animados grupos de WhatsApp, em fofocoterapias de redes ou futilidades disponíveis no YouTube.
Somos piadistas, zoadores, pobres de espírito fingindo que moramos num país tropical, abençoado por Deus e feliz por natureza. Mas que beleza, afinal de contas, em fevereiro tem Carnaval. Pelo sim, pelo não, cuidado com os velhinhos. Ainda mais quando viram velhacos, aí sim, são de morte! Com todo o respeito de um adolescente da terceira idade…

05 de julho de 2016
Eduardo Aquino
O Tempo

NOTA AO PÉ DO TEXTO

Creio que podemos entender que o conflito geracional a que se refere o autor do texto, ou melhor, "os velhos" venceram "os jovens", indica que os conservadores venceram os 'progressistas'... Uma vitória de Pirro, pelo andar da carruagem.
Será que até agora o tal globalismo ainda não foi entendido na sua verdadeira dimensão?
Será que a 'esquerdização' da Europa ainda não foi percebida?
Fica o dito pelo não dito...
m.americo

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