Presidente tem de ser um líder e fazer política com maestria.
Um presidente não é impedido porque cometeu estelionato eleitoral. Isso é das regras do jogo, é legal e legítimo. “Hate the game, not the players”, dizem os americanos.
Um presidente não é impedido porque, em decorrência do item 1 acima, sua popularidade vai para a lona, e o eleitorado se sente traído. É do jogo, basta manter sustentação parlamentar.
Um presidente não é impedido porque, além dos itens 1 e 2 acima, todo o sistema de representação política está em crise, no Brasil e no mundo. Está no jogo, basta ter casca grossa.
Um presidente não é impedido porque, além dos itens 1, 2 e 3 acima, operações do sistema judiciário expõem com toda a clareza a corrupção institucionalizada do Executivo e a podridão generalizada no sistema político-eleitoral. Mas começa a balançar. Se a população for às ruas, o mandato presidencial passa a carecer de legitimidade.
Um presidente não é impedido mesmo que aos itens 1, 2, 3 e 4 acima se acrescente a maior crise econômica do país desde as últimas oito décadas e meia. Mas tem de ser um líder e fazer política com maestria, porque o mandato está como um violinista no telhado em matéria de suporte e legitimidade.
Se, contudo, fica evidenciado e claro para a população que parte relevante dos sofrimentos causados pela crise é decorrente de erros gravíssimos e perfeitamente evitáveis de política econômica e que esses erros se devem a posições ideológicas, manipulação para ganhar eleições e, ainda por cima, estão imbricados com episódios chocantes de corrupção, esse presidente será impedido em qualquer país do mundo com sociedades abertas.
Mestre Elio Gaspari escreveu um artigo nessas páginas do GLOBO sob o título “Há golpe”. Reconhece, contudo, que não há golpe institucional, não há ruptura na ordem democrática. Mas haveria golpe no sentido do dicionário Houaiss: “Ato pelo qual a pessoa, utilizando-se de práticas ardilosas, obtém proveitos indevidos, estratagema, ardil, trama”.
A tentativa de salvar o título do artigo é só muito parcialmente bem-sucedida. Práticas ardilosas, estratagemas, tramas e até proveitos indevidos são parte da política. Nesse sentido, toda a política contém elementos golpistas.
A perícia feita pelos técnicos do Senado, contudo, é como a estaca de madeira no coração do vampiro. Já era quase consenso que as pedaladas transformaram-se, de equalizações de débitos e créditos racionais entre agentes e praticadas em vários governos, em forma de mascarar e retirar transparência da política fiscal em montantes absurdamente exorbitantes.
A perícia confirmou-as como empréstimos de bancos públicos à União, o que é ilegal. Pouco importa se a presidente Dilma colocou as digitais no processo. Deve ser impedida por crime de responsabilidade porque, se não o comandou, o coonestou conscientemente. Caso alegue que nada sabia, a situação é mais grave, deve ser impedida por crime de profunda irresponsabilidade.
12 de julho de 2016
Sérgio Besserman Vianna é economista, O Globo
Um presidente não é impedido porque cometeu estelionato eleitoral. Isso é das regras do jogo, é legal e legítimo. “Hate the game, not the players”, dizem os americanos.
Um presidente não é impedido porque, em decorrência do item 1 acima, sua popularidade vai para a lona, e o eleitorado se sente traído. É do jogo, basta manter sustentação parlamentar.
Um presidente não é impedido porque, além dos itens 1 e 2 acima, todo o sistema de representação política está em crise, no Brasil e no mundo. Está no jogo, basta ter casca grossa.
Um presidente não é impedido porque, além dos itens 1, 2 e 3 acima, operações do sistema judiciário expõem com toda a clareza a corrupção institucionalizada do Executivo e a podridão generalizada no sistema político-eleitoral. Mas começa a balançar. Se a população for às ruas, o mandato presidencial passa a carecer de legitimidade.
Um presidente não é impedido mesmo que aos itens 1, 2, 3 e 4 acima se acrescente a maior crise econômica do país desde as últimas oito décadas e meia. Mas tem de ser um líder e fazer política com maestria, porque o mandato está como um violinista no telhado em matéria de suporte e legitimidade.
Se, contudo, fica evidenciado e claro para a população que parte relevante dos sofrimentos causados pela crise é decorrente de erros gravíssimos e perfeitamente evitáveis de política econômica e que esses erros se devem a posições ideológicas, manipulação para ganhar eleições e, ainda por cima, estão imbricados com episódios chocantes de corrupção, esse presidente será impedido em qualquer país do mundo com sociedades abertas.
Mestre Elio Gaspari escreveu um artigo nessas páginas do GLOBO sob o título “Há golpe”. Reconhece, contudo, que não há golpe institucional, não há ruptura na ordem democrática. Mas haveria golpe no sentido do dicionário Houaiss: “Ato pelo qual a pessoa, utilizando-se de práticas ardilosas, obtém proveitos indevidos, estratagema, ardil, trama”.
A tentativa de salvar o título do artigo é só muito parcialmente bem-sucedida. Práticas ardilosas, estratagemas, tramas e até proveitos indevidos são parte da política. Nesse sentido, toda a política contém elementos golpistas.
A perícia feita pelos técnicos do Senado, contudo, é como a estaca de madeira no coração do vampiro. Já era quase consenso que as pedaladas transformaram-se, de equalizações de débitos e créditos racionais entre agentes e praticadas em vários governos, em forma de mascarar e retirar transparência da política fiscal em montantes absurdamente exorbitantes.
A perícia confirmou-as como empréstimos de bancos públicos à União, o que é ilegal. Pouco importa se a presidente Dilma colocou as digitais no processo. Deve ser impedida por crime de responsabilidade porque, se não o comandou, o coonestou conscientemente. Caso alegue que nada sabia, a situação é mais grave, deve ser impedida por crime de profunda irresponsabilidade.
12 de julho de 2016
Sérgio Besserman Vianna é economista, O Globo
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