Cheguei a crer que havíamos conseguido criar regras impessoais que reduziriam em muito a dependência de indivíduos excepcionais para conduzir os temas básicos da gestão econômica. A Lei de Responsabilidade Fiscal, por exemplo, deveria fazer com que qualquer ministro da Fazenda tivesse de se comportar de maneira rigorosa no trato com as finanças públicas, independentemente de suas crenças (até certo ponto, ao menos).
Os acontecimentos dos últimos seis ou sete anos me fizeram mudar de ideia. Na verdade, mais até do que o péssimo desempenho da economia, me preocupa, e muito, o grau de destruição institucional no período. Olho em volta e só vejo terra arrasada.
Numa nota pessoal, por causa do privilégio que tive por trabalhar na instituição, me entristece em particular a deterioração do papel do Banco Central.
Sob a "direção" de Alexandre Pombini, houve piora visível do BC, não só no desempenho mas principalmente na atitude. Mesmo antes do salto em 2015, quando o IPCA atingiu 10,7% (para uma meta de 4,5%), o desempenho no que diz respeito ao controle inflacionário foi lamentável. Entre 2011 e 2014, a inflação atingiu 6,2% ao ano, pouco abaixo do limite máximo de tolerância, apesar do controle dos preços administrados, cuja variação ficou apenas em 4,1% ao ano no período.
O BC também se beneficiou da alteração nos pesos do IPCA após 2011: caso a ponderação que valia até aquele momento tivesse sido mantida, a inflação média teria sido 6,5%, ultrapassando o teto tanto em 2012 quanto em 2014.
Comparado, portanto, em bases congruentes com as de seus predecessores, Pombini não apenas jamais entregou a inflação na meta como estourou seu limite superior ao menos quatro vezes, colocando em sua conta, por mérito, o fiasco de 2016, apesar de suas promessas de convergência ainda neste ano feitas até setembro do ano passado.
Assim, coube-lhe também a duvidosa honra de ser o primeiro presidente do BC sob o regime de metas que deixa a seu sucessor taxas de juros mais elevadas do que herdou. Seu afã em obedecer ao voluntarismo do governo para a queda da taxa de juros, enquanto fingia ignorar a piora fiscal, teve como consequência exatamente o oposto da intenção original.
Quando era mais novo, conseguia ainda acreditar no efeito pedagógico dessas experiências; hoje sei que é questão de tempo até que outro iluminado resolva tentar o mesmo, na vã ilusão que em sua vez o resultado seja diferente.
Isto dito, se há algo que podemos aprender da "gestão" de Pombini à frente do BC, é que a posição submissa da autoridade monetária diante dos governantes de plantão não traz crescimento maior; ao contrário, resulta em inflação mais alta e, eventualmente, em razão do descontrole inflacionário, em expansão menor do produto do que teria sido possível sob inflação baixa.
Nada, diga-se, que a literatura a respeito já não alertasse, mas parece que há ainda quem queira testar a lei da gravidade pulando de uma janela, no caso do 22º andar do Banco Central.
Cabe agora a Ilan Goldfajn a imensa tarefa conjunta de recuperar a credibilidade institucional do BC e trazer a inflação de volta à meta. Não há de ser fácil, diante do estrago cometido por seu antecessor, mas desejo, como brasileiro, bem como amigo, que tenha sucesso neste desafio.
17 de junho de 2016
Alexandre Schwartsman, Folha de SP
Os acontecimentos dos últimos seis ou sete anos me fizeram mudar de ideia. Na verdade, mais até do que o péssimo desempenho da economia, me preocupa, e muito, o grau de destruição institucional no período. Olho em volta e só vejo terra arrasada.
Numa nota pessoal, por causa do privilégio que tive por trabalhar na instituição, me entristece em particular a deterioração do papel do Banco Central.
Sob a "direção" de Alexandre Pombini, houve piora visível do BC, não só no desempenho mas principalmente na atitude. Mesmo antes do salto em 2015, quando o IPCA atingiu 10,7% (para uma meta de 4,5%), o desempenho no que diz respeito ao controle inflacionário foi lamentável. Entre 2011 e 2014, a inflação atingiu 6,2% ao ano, pouco abaixo do limite máximo de tolerância, apesar do controle dos preços administrados, cuja variação ficou apenas em 4,1% ao ano no período.
O BC também se beneficiou da alteração nos pesos do IPCA após 2011: caso a ponderação que valia até aquele momento tivesse sido mantida, a inflação média teria sido 6,5%, ultrapassando o teto tanto em 2012 quanto em 2014.
Comparado, portanto, em bases congruentes com as de seus predecessores, Pombini não apenas jamais entregou a inflação na meta como estourou seu limite superior ao menos quatro vezes, colocando em sua conta, por mérito, o fiasco de 2016, apesar de suas promessas de convergência ainda neste ano feitas até setembro do ano passado.
Assim, coube-lhe também a duvidosa honra de ser o primeiro presidente do BC sob o regime de metas que deixa a seu sucessor taxas de juros mais elevadas do que herdou. Seu afã em obedecer ao voluntarismo do governo para a queda da taxa de juros, enquanto fingia ignorar a piora fiscal, teve como consequência exatamente o oposto da intenção original.
Quando era mais novo, conseguia ainda acreditar no efeito pedagógico dessas experiências; hoje sei que é questão de tempo até que outro iluminado resolva tentar o mesmo, na vã ilusão que em sua vez o resultado seja diferente.
Isto dito, se há algo que podemos aprender da "gestão" de Pombini à frente do BC, é que a posição submissa da autoridade monetária diante dos governantes de plantão não traz crescimento maior; ao contrário, resulta em inflação mais alta e, eventualmente, em razão do descontrole inflacionário, em expansão menor do produto do que teria sido possível sob inflação baixa.
Nada, diga-se, que a literatura a respeito já não alertasse, mas parece que há ainda quem queira testar a lei da gravidade pulando de uma janela, no caso do 22º andar do Banco Central.
Cabe agora a Ilan Goldfajn a imensa tarefa conjunta de recuperar a credibilidade institucional do BC e trazer a inflação de volta à meta. Não há de ser fácil, diante do estrago cometido por seu antecessor, mas desejo, como brasileiro, bem como amigo, que tenha sucesso neste desafio.
17 de junho de 2016
Alexandre Schwartsman, Folha de SP
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