"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 14 de fevereiro de 2015

POR QUE PEDIR IMPEACHMENT DE DILMA NÃO É GOLPISMO

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No julgamento que se concluiu em 16 de fevereiro de 2012, disse Ayres Brito: “A corrupção é o cupim da República, nossa tradição é péssima em matéria de respeito ao erário.” Questionavam na ocasião se a vontade das urnas deveria ser soberana ao ponto de haver o direito à eleição de políticos já condenados em primeira instância, ou se mais prudente seria não apostar que o voto se mostrasse capaz de driblar qualquer manipulação promovida em campanha. Venceu o segundo caso e a Lei da Ficha Limpa foi aprovada por 7 a 4, sendo aplicada já no pleito do mesmo ano.

Uma condenação de Dilma está ainda bem longe. Caso siga-se o ritmo do último gigantesco escândalo petista, isso ocorreria apenas na próxima década, quando um outro presidente já estará tomando conta do Brasil. Mas – mais uma vez – usam o recurso da “soberania das urnas” para carimbar de golpista qualquer um que acredite que a escolha popular de outubro passado deva se posicionar humildemente alguns degraus abaixo do cumprimento da lei.

Ora, porque se é válido barrar a vontade popular da eleição de um candidato já condenado em primeira instância pela Ficha Limpa, por que seria imoral questionar a mesma vontade em manter no poder alguém cujos crimes vão se tornando cada vez mais evidentes após reeleito? Crimes cujas cifras constantemente ultrapassam a casa dos bilhões? Alguém cuja aprovação despencou para 23% no primeiro mês do segundo mandato? Alguém cuja responsabilidade vem sendo apontada pelo próprio ex-presidente da Petrobras?

Não é de hoje

Bem lembra a dupla d’O Antagonista, imoral é olhar para isso tudo e lavar as mãos, como faz Dora Kramer ao cometer a sentença: “Portanto, quem deu vida a Mateus – a maioria do eleitorado – que o embale.” Lula, todo mundo sabe e até lembra, discordava da colunista já em 1992 contra Collor. O que pouca gente se recorda é que em maio de 1999, apenas 5 meses após a reeleição de FHC, o mesmo Luís Inácio e todo seu partido pouco pensavam na tal “soberania das urnas”, articulando no congresso um processo de impeachment – que, como sabemos, não caminhou muito.
O primeiro passo para o processo de impeachment foi dado ontem, quando PT, PC do B, PSB e PDT anunciaram que vão entrar, coletivamente, com uma representação na Câmara acusando FHC de crime de responsabilidade. (…)
Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fez ontem talvez seu mais duro ataque ao governo de Fernando Henrique Cardoso. “O governo parece até uma quadrilha. Todo dia tem uma pessoa ligada ao presidente envolvida em alguma falcatrua“, disse. Lula avaliou como insustentável a situação de FHC e considerou inadmissível o comportamento revelado pelo grampo.
(grifos nossos)
Mas o fato é que conversas sobre impeachment são uma constante na história política recente do Brasil. Em 2005, quando do estouro do Mensalão, o Google contabilizou um primeiro levante do tema.

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Em 2013, com os protestos de junho, o assunto novamente ganhou um fôlego momentâneo.

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E mesmo em 2014, até mesmo antes do resultado das eleições, aventava-se bastante a possibilidade graças às notícias que desde março surgiam da operação Lava Jato. A oposição chegou inclusive a protocolar um pedido de impeachment pelo crime de responsabilidade de Dilma na compra da refinaria de Pasadena. O gráfico abaixo mostra que o assunto sofreu oscilações significantes de janeiro a setembro do ano passado, antes mesmo do término do primeiro turno.

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E hoje?

Os juristas, como de costume, estão discutindo o assunto. Enquanto Ives Gandra defende que já há como sustentar uma abertura de processo, na revista Consultor Jurídico, essa tese é refutada. Os economistas fazem suas contas e calculam ainda em 30% o risco de um impeachment de Dilma, mas alertam que esse número dobrou nas últimas semanas. Os nomes diretos na sucessão do cargo evitam o tema. Segundo Josias de Souza, o vice-presidente Michel Temer vem refugando
Quanto ao terceiro homem da república, Eduardo Cunha acha a ideia descabida, mas já assinou a criação de uma nova CPI da Petrobras. Caiado, líder do Democratas, não descarta o processo. E Aécio Neves, principal nome da oposição, lembra que não é crime discutir o tema.

Quando Collor comandou o Brasil entre 1990 e 1992, o PIB recuou uma média anual de -1,3%, a inflação se consolidou como hiperinflação e mais de 2 milhões de postos de trabalho foram fechados gerando uma onda de desemprego que jamais voltamos a ver igual. Foi Itamar assumir o comando pelo mesmo PMDB de Michel Temer para que o país ganhasse credibilidade, a inflação fosse controlada, o PIB crescesse a uma média de 5% e a geração de empregos se estabilizasse.

Os números de Dilma são bem menos ruins que os de Collor, mas já demonstram um grave retrocesso em relação aos últimos 3 mandatos presidenciais. Contudo, em algo os dois cenários se assemelham: já não há qualquer fé de um futuro próspero para o país enquanto mudanças significativas não forem feitas. 
Aguardar as urnas de 2018 seria reprisar a estratégia adotada em 2005 (quando do estouro do Mensalão) e em 2013 (quando dos protestos de junho), ao acreditar que a eleição seguinte daria mais resultado que um processo político. 
E os resultados foram os recordes de sujeira em uma campanha por parte dos petistas naquilo que hoje vem sendo chamado de “estelionato eleitoral até pela “linha auxiliar do PT”, o PSOL.

Mais do que isso, deixar aos cuidados dos “parteiros de Mateus” o destino do país é arriscar os avanços democráticos conquistados até aqui. E sabe lá que tipo de força emanará das urnas de um Brasil em recessão. Calma, claro, sempre é bem-vinda. 
Mas ela não pode ser confundida com leniência. Como bem lembrou Ayres Brito, os cupins estão corroendo a república. Se não faz-se nada e apenas espera-se que o tempo dê jeito em tudo, há de chegar o momento em que já seja tarde demais. As lições sobre as consequências de um mero lavar de mãos diante de injustiças são antigas, vêm da Bíblia. A população espera atitudes da oposição. Que elas venham.

14 de fevereiro de 2015
Marlos Ápyus

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