"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 11 de junho de 2014

A RETIRADA DO REI







A abdicação de Juan Carlos do trono,  em favor de Felipe  de Astúrias, faz lembrar, de pronto, a tentativa frustrada de golpe de 17 de fevereiro de l977, pelo coronel Enrique Tejero, da Guarda Civil.






Durante muito tempo, pairaram dúvidas sobre o papel do Rei naquela noite, até hoje não de todo esclarecido.




O certo é que os golpistas, durante o episódio,  falaram como se obedecessem a suas ordens, e que seu nome foi proposto, por eles, para assumir o poder, depois de passar pela eventual aprovação de um plenário cercado por tropas, e sob a mira de um louco, com uma pistola automática na mão.






Com o tempo, passando por histórias de amantes e de caçadas de elefantes, Juan Carlos I estabeleceu uma personalidade cheia de contrastes, e de situações nebulosas.






Sempre teve estreitas relações com os grandes “magnatas” espanhóis e seus  negócios na América Latina, em uma época em que a Espanha achava que podia promover arrogante reconquista de seus antigos territórios, esquecendo-se, os espanhóis e seus oligarcas, de que só estavam em situação aparentemente positiva graças a bilhões de euros a fundo perdido da União Européia e a gigantescas dívidas que terão de pagar agora.






ESCÂNDALOS E NEGOCIATAS






A intimidade com o mundo dos negócios, e com gente que enriqueceu rapidamente, na esteira da entrada da Espanha no euro, levaria a família real – que já contava com generosa “renda” e todas as despesas pagas pelo erário – a envolver-se em uma série de escândalos e negociatas.




O genro do Rei, Iñaki Urdangarin, um ex-jogador de handebol – que ocupava cargos em conselhos de várias empresas espanholas, inclusive a Telefónica América Latina, dona da “Vivo” no Brasil – foi acusado de desvio de dinheiro público, por meio de uma organização fundada por ele, aparentemente “sem fins lucrativos”, o Instituto Noos, que prestava – sem os executar – serviços superfaturados para províncias e municípios espanhóis.






Mesmo posando de democrata, em momentos emblemáticos, Juan Carlos não conseguiu esconder sua verdadeira face, profundamente conservadora e neocolonial, quando disse o que queria – e ouviu o que não queria – ao proferir, em  reunião de uma das fracassadas cúpulas “íbero-americanas”, para o Presidente Chavez, “porque no te callas?”






MONARQUIA CONTESTADA




Ao abdicar em favor de seu filho, Juan Carlos I abre mão do reinado para salvar uma monarquia contestada. Um sistema que é o retrato mais forte de uma Espanha anacrônica e cada vez mais irrelevante, que se encontra dividida por polêmicas intestinas dentro de suas próprias fronteiras.




O seu gesto, interesseiramente apresentado, pela mídia conservadora espanhola, como o da renúncia de um nobre cavalheiro, cansado depois de longa caminhada em defesa de seu  povo, pode ter o efeito de um tiro saindo pela culatra, e precipitar, como se viu nas manifestações  realizadas em toda a Espanha, o fim da monarquia em seu país.




11 de junho de 2014
Mauro Santayna


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