Este texto foi originalmente escrito em setembro 2007, mas continua atual... "O país tem que ouvir de tempos em tempos que há caos na Saúde e que a única coisa a fazer é a maravilha curativa de sempre: mais dinheiro. Não ocorre aos ministros que o melhor a fazer é trabalhar?” (Rogério Werneck, economista, professor da PUC-RJ, O Globo de 5 de setembro de 2007)
Criada com a finalidade de custear a saúde pública, a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) incide sobre a movimentação ou transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza financeira.
A Emenda Constitucional nº 12/96 autorizou a União a instituir a contribuição provisória sobre movimentação financeira, sob a alíquota de 0,20%. E o produto da arrecadação deveria ser destinado integralmente ao Fundo Nacional de Saúde, para financiamento das ações e serviços de saúde. Determinava ainda a Emenda que a cobrança duraria, no máximo, 2 anos. A Lei 9.311/96, que instituiu a CPMF, determinou a sua cobrança por 13 meses - de 23.01.97 a 23.02.98.
Posteriormente, uma outra Lei – a 9.539/97 -, prorrogou a cobrança até 23.01.99. Findo tal prazo, não mais seria cobrada essa contribuição financeira. E foi o que ocorreu. No entanto, em 19.03.99 foi publicada a Emenda Constitucional nº 21/99, que prorrogou a cobrança da contribuição por mais 36 meses, a partir de junho de 99. Nos primeiros 12 meses, com a alíquota de 0,38%, e de 0,30% nos meses subseqüentes.
Agora, uma pergunta: como é que pode uma emenda à Constituição prorrogar uma lei que não mais existia? Desde 23.01.99 as Leis 9.311/96 e 9.539/97 não mais produziam efeitos, vale dizer, não existiam no mundo jurídico e, por isso, não podiam ser prorrogadas. Assim, a Emenda Constitucional 21/99 prorrogou o NADA. E por isso é inconstitucional.
Além dessa, várias outras irregularidades tornaram a cobrança da CPMF ilegítima e inconstitucional. A Constituição proíbe expressamente a cobrança de tributos no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou. Quer dizer, se a lei que criou ou aumentou um imposto foi publicada em 1999, o início da cobrança só se dará, necessariamente, no ano seguinte, em 2000. Trata-se do princípio da anterioridade e a emenda 21/99 também não respeitou o dispositivo da Constituição que estabelece esse princípio. O próprio STF, em sua Súmula 67, entendeu que “é inconstitucional a cobrança de tributo que houver sido criado ou aumentado no mesmo exercício financeiro”.
A referida Emenda 21/99 alterou, ainda, a destinação dos recursos arrecadados com a CPMF, ou seja, alterou a finalidade da lei, o que a caracteriza. No mínimo, uma imoralidade pública. Segundo dispõe a Emenda, o resultado do aumento da arrecadação nos anos de 1999, 2000 e 2001 “será destinado ao custeio da previdência social”, contrariando o que estabelecia a Emenda 12/96, que destinou a totalidade dos recursos à área da Saúde.
A Constituição proíbe, por meio de cláusula pétrea, quer dizer, por disposição inderrogável, a deliberação ou discussão de proposta de Emenda tendente a abolir, entre outras matérias, os direitos e garantias individuais (art. 60, § 4º, IV). A Emenda 21/99 ignorou tal vedação e, ao prorrogar a cobrança da CPMF, violou direitos e garantias individuais dos cidadãos, como acima foi demonstrado. O cidadão não pode calar-se diante de tão absurda e ilegal cobrança. Só a voz do povo é capaz de impedir que desmandos como esse continuem a passar por cima de seus direitos e alimentar a ganância dos governantes incompetentes, eleitos por esse mesmo povo.
O texto acima contém excertos de matéria de autoria de Sérgio Veríssimo de Oliveira Filho, estudante do 4º ano de Direito na Universidade Estadual de Londrina (PR) (http://www.datavenia.net/opiniao/svof.html).
O ex-ministro Paulo Brossard também se referiu ao tema. Diz ele que a CPMF foi criada em 1996, pela Lei 9.311, com a duração de 13 meses. Em 1997 a alíquota era de 0,20% e ensejou a arrecadação de quase R$ 7 bilhões, o que correspondia a 0,74% do PIB. Ocorre que acontribuição provisória foi virando definitiva; em 1999 foi prorrogada até 2002, em 2002 prorrogada até 2004, em 2004 prorrogada até 2007 e agora se pretende prorrogá-la até 2011.
A alíquota também aumentou. Começou em 0,20% em 1999, passou para 0,24%, em 2000 para 0,34%, em 2001 para 0,36% e a partir de 2002 passou para 0,38%. Os números são impressionantes. Se a arrecadação no ano de sua cobrança inicial foi de quase R$ 7 bilhões, em 1998, foi de quase R$ 8 bilhões, em 1999 quase R$ 8 bilhões, em 2000 mais de R$ 14 bilhões, em 2001 mais de R$ 17 bilhões, em 2002 mais de R$ 20 bilhões, em 2003 mais de R$ 23 bilhões, em 2004 mais de R$ 26 bilhões, em 2005 mais de R$ 29 bilhões, em 2006 mais de R$ 32 bilhões, em 2007 a previsão é de R$ 35 bilhões.
O governo não quer reduzir um centavo do que arrecada, a começar pela CPMF, por ser para ele o mais cômodo dos tributos. A União não arrecada nem fiscaliza. Ela faz o sacrifício de receber em casa o tributo que ela mascarou com a falsa denominação de “contribuição temporária”. A CPMF era de nascença provisória e nos termos do artigo 20 da lei que a criou, para vigorar durante treze meses “contados após decorridos noventa dias da data da publicação desta lei, quando passará a ser exigida”. Os 13 meses já duram mais de 11 anos... e a União quer prorrogar a sua cobrança por mais quatro.
(http://ultimainstancia.uol.com.br/artigos/ler_noticia.php?idNoticia=40988)
O então ministro Guido Mantega afirmou que cortar a CPMF reduziria os programas sociais, assim como a economia para o pagamento de juros - o chamado superávit primário (receitas menos despesas, excluindo gastos com juros). Para o ministro, não havia despesas que possam ser cortadas para compensar o fim da CPMF, que neste ano deve render aos cofres públicos mais de R$ 35 bilhões.
Essa declaração é uma confissão explícita de que o governo "dexte país" utiliza o dinheiro da CPMF para manter-se em permanente campanha eleitoral com suas inúmeras bolsas a uma parte da população desassistida, com a finalidade de manter os votos de cabresto.
Juntamente com os ministros da Saúde, da Previdência Social e do Desenvolvimento Social, Guido Mantega, na Câmara dos Deputados, defendeu a tese esdrúxula de que o governo pode repensar a contribuição da CPMF, porém dentro de uns três anos. Isto é, para o governo que sucederá o atual. O fim do imposto, de acordo com a Emenda Constitucional, deve ocorrer em 2011, já no governo seguinte a este, dito o mais ético da História do Brasil.
Apesar de tudo isso, o governo ampliou o quadro do funcionalismo em cerca de 260 mil funcionários e ainda pretende contratar mais 60 mil, fora os que foram nomeados para cargos de assessoramento (DAS), todos, evidentemente destinados à cumpanheirada do PT, descontando dízimos para saldar as dívidas do partido com o Sr. Marcos Valério.
O próprio Lula se orgulhou recentemente dos gastos com o Bolsa-Família que está sendo ampliado sem saber de onde sairá o dinheiro e sem se incomodar com o tamanho da conta.
O próximo passo de todo esse imbróglio é a apreciação da PEC no plenário da Câmara, onde precisa ser votada em dois turnos e ter a aprovação de no mínimo 308 deputados. No Senado, também terá que ser votada em dois turnos.
Resta-nos clamar, sem esperança de sermos ouvidos: senhores governantes, membros do partido da ética, um pouco de lucidez!
22 de setembro de 2015
Carlos I. S. Azambuja é Historiador.
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