"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

VISÃO DO PARAÍSO

 


Evanise Santos, a ex-mulher de Dirceu, deixa para trás o passado exótico
DANIELA PINHEIRO
 
Era final da tarde de sábado quando Evanise Maria da Costa Santos ocupou uma mesa na varanda do restaurante do Hotel Fasano, no Rio de Janeiro. Ela usava vestido branco de alças, sapato de salto e tinha as unhas compridas pintadas de azul metalizado. Ficou mais magra, mais loira e mais bronzeada desde que se estabeleceu de vez na cidade, semanas antes. “Estou mudando de ares, de vida e de assunto”, comentou. Mas “o” assunto a perseguia.

Fazia menos de 24 horas que o ex-ministro José Dirceu – com quem manteve uma relação estável durante os oito longos anos em que se arrastou o processo do mensalão – e outros integrantes da cúpula do Partido dos Trabalhadores haviam sido mandados para a cadeia. O celular de Evanise não parava de tocar. “As pessoas me ligam para saber se eu estou bem. Bem ninguém pode ficar diante de um absurdo desses, mas a minha vida segue”, comentou.

Durante o processo, Evanise desempenhou um relevante papel ao lado de Dirceu. Palpitava nas estratégias da defesa e da assessoria de imprensa. Lidava com autoridades e políticos que poderiam ajudar no caso. Foi uma das -pessoas procuradas por um solícito Luiz Fux, que pleiteava uma vaga no Supremo Tribunal Federal. A ele, ela aconselhou: “Pare de ficar atrás do Lula. Se você quer o cargo, dá uma sumida.”

Feroz defensora do marido, tomava satisfação com quem o xingava em público ou quando a mídia era implacável com ele. Por mais de uma vez, deu entrevistas dizendo que o visitaria diariamente na cadeia. Quando a recente biografia de Dirceu foi lançada, ela levava o livro na bolsa, com as páginas marcadas com dezenas de post-its, que ressaltavam, segundo disse, as imprecisões que ela mesma havia identificado. Em junho deste ano, Dirceu terminou a relação e assumiu um namoro, o que a levou à terapia e os afastou em definitivo.

“Em todo esse tempo, nunca conversamos sobre como seria o dia em que ele seria preso”, ela disse. “Sabíamos que esse dia ia chegar, mas o que foi surpresa é ter chegado e eu não estar lá”, concluiu, sorvendo vinho branco gelado. “O bom é que não fico pensando se ele está tomando banho frio ou se está comendo marmita. De certa maneira, isso é libertador para mim.”

Na véspera, quando o mandado de prisão de Dirceu foi expedido, ela mandou uma mensagem para o celular dele, depois de semanas de silêncio. “Só você sabe o quanto eu queria estar aí nessa hora. Me ligue”, escreveu. E ele respondeu: “Liguei. Estou indo me entregar. Cuide-se e beijos. Diga a Gabi que estarei sempre com vocês”, pediu, referindo-se à filha dela. Evanise caiu no choro.
 
ascida em Itajubá, interior de Minas Gerais, Evanise tem 46 anos, é vaidosa, animada, tem uma conversa agradável e dá a impressão de que foi feita para brilhar nos gabinetes da Esplanada dos Ministérios. Perdeu o pai muito cedo e a mãe criou o casal de filhos de maneira modesta.
O padrasto militar levou a família para Brasília no final dos anos 70. Aos 18 anos, foi aprovada num concurso para professora primária da rede pública do governo do Distrito Federal. Passou a lecionar em uma escola no Paranoá, um dos bairros mais pobres da cidade. Aos 24, engravidou de um namorado, jogador de vôlei, bonitão e desempregado. Separaram-se meses depois do nascimento de Gabriela, hoje com 21 anos, estudante de publicidade em São Paulo. A menina teve pouco contato com o pai e se refere a José Dirceu como “pai de coração”.

Os avós paternos de Gabriela eram próximos ao ex-deputado Sigmaringa Seixas, um dos melhores amigos do ex-presidente Lula e da turma petista brasiliense. Foi dele a indicação para que Evanise fosse chamada para trabalhar na campanha de Cristovam Buarque a governador do Distrito Federal em 1994. Ela assumiu em seguida um cargo no cerimonial do governo. Era filiada ao PT (não sabe se ainda o é, já que não paga o partido há anos) e uma sindicalista ativa.

“Desde essa época, eu conheço todo mundo em Brasília. Aquela cidade é um ovo, todo mundo sabe quem é todo mundo”, contou. “Eu circulo há muito tempo pelo poder, nunca foi por causa de Zé Dirceu. Eu conheço Brasília, eu entendo Brasília”, disse. Fora autoridades, ela também mantém uma estreita proximidade com os principais jornalistas do país, que a têm como boa fonte. Tem linha direta com vários repórteres e chefes de redações, incluindo o de veículos de imprensa mais críticos a Dirceu, caso da revista Veja.

Contou que no segundo mandato do governo Fernando Henrique Cardoso, graças à indicação de José Natal – ex-homem forte da TV Globo em Brasília –, ela foi cedida ao Ministério dos Transportes, para trabalhar na área de Comunicação Social. Nessa época, foi apresentada ao então presidente do PT, José Dirceu.

Evanise foi uma das organizadoras da festa de lançamento do livro Abaixo a Ditadura, escrito por Dirceu e Vladimir Palmeira e publicado em 1998. A cena do encontro ainda está viva em sua memória. “Ele me cumprimentou, nem me olhou direito. Falei para ele que minha família também era de Passa Quatro. Ele só registrou isso”, lembrou Evanise. Com o tom de voz fraternal, ela comentou que o pai de Dirceu, que era juiz de paz, havia celebrado o casamento de uma prima dela. “Eu conhecia toda a família do Zé. Ele foi a última pessoa da família dele que eu conheci.”

Quando Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito, Swedenberger do Nascimento Barbosa – ex-chefe de gabinete da Presidência Nacional do PT e um dos coordenadores da campanha – levou Evanise para o governo de transição. Foi lotada no cerimonial do Palácio do Planalto. “Fui a primeira pessoa que teve cargo de assessora no palácio sem ser diplomata de carreira”, jactou-se. Trabalhava no 3º andar. José Dirceu, ministro da Casa Civil, um piso acima. De ar desinibido, independente e de visual chamativo, ela logo atraiu a atenção dele. Ao que consta, passaram a trocar olhares nos corredores de mármore. Ela não comentou o assunto.

Tempos depois, Evanise foi requisitada para integrar o staff do ministro e nomeada “assessora especial” da Casa Civil. “Mas o Zé não teve nada a ver com isso. Fui chamada pela chefe de gabinete dele. Eles precisavam de alguém com a minha experiência”, disse. Seu trabalho consistia em organizar a agenda, agilizar audiências, planejar viagens e tomar providências burocráticas, como solicitar aviões da Força Aérea Brasileira para a locomoção das autoridades.

Dirceu se referia a ela como “a filha de Passa Quatro”, “a passa-quatrense”. Foi durante uma viagem oficial a Cuba – na qual os dois integravam a comitiva governamental – que ele “caiu matando”, ela lembrou.

Enquanto buscava uma mensagem no celular com os cotovelos apoiados sobre a mesa do restaurante, ela esclareceu nunca ter ferido as regras da hierarquia palaciana. “Mesmo a gente já junto era ‘ministro’, ‘o senhor’, essas coisas”, contou. Uma única vez, houve um problema. Ele estava atrasado para uma cerimônia, ela pediu que se apressasse e ele a destratou na frente do então ministro da Fazenda, Antonio Palocci. “Ele fez comigo o que fazia com muita gente. Foi péssimo”, comentou.
Quando estourou o mensalão, Dirceu deixou o cargo e ela foi transferida para a coordenação de Relações Públicas do governo. Assumiram o romance quase um ano depois. Nessa época, Evanise obteve seu diploma de curso superior, graduando-se em publicidade por uma instituição privada em Brasília.

Quando Dilma Rousseff – que a chama de “Lindinha” – foi eleita, pediu que Evanise continuasse, mas ela preferiu deixar o Planalto. Desde então, é diretora de Relações Institucionais da Ejesa, que edita os jornais Brasil Econômico, O Dia e Meia Hora, o que a obriga a se dividir entre Rio, São Paulo e Brasília. A empresa é um braço do grupo português Ongoing, também dono do Portal iG. Em diversas ocasiões, diretores do grupo e a assessoria de Dirceu tiveram que desmentir publicamente que ele seria sócio oculto da empreitada.

Certa vez, o governador do Rio, Sérgio Cabral, durante uma reunião com os portugueses, comentou ao ser apresentado a Evanise: “Ah, você que é mulher dele? Ainda bem que pararam com essa coisa de que o Zé Dirceu era o dono, né?” Em paralelo, ela também toca uma empresa de eventos que leva seu nome. Seu último trabalho foi organizar um seminário com a participação de chefs de cozinha no Espírito Santo. Voluntariamente, Evanise costuma mencionar ser “muito bem paga”. Diz sem arrogância, como alguém que apenas está grata por ter uma habilidade reconhecida. No ano passado, deu entrada num apartamento financiado em Brasília.
 
casal se dava bem. Parecia enfrentar as intempéries do processo e a crítica inclemente da opinião pública com companheirismo. Mantinham casas separadas e partilhavam o gosto por viagens, restaurantes, festas e reuniões com grupos de amigos fiéis na casa de Dirceu em Vinhedo, no interior paulista. No final de 2010, viajaram de férias para a Bahia. Antes de partir, Dirceu disse a Evanise que “na volta” teriam uma conversa que mudaria para sempre suas vidas. Ela não deu bola. Passaram dias na piscina, na praia, entre os seus. “Ele estava pensativo”, ela avaliou em retrospectiva.

E assim foi. Em janeiro, Dirceu a chamou para conversar. Didático e constrangido, ele deu a notícia sem alterar o tom de voz: havia engravidado uma moça, que morava em Brasília, a criança tinha nascido havia quatro meses, era uma menina, chamava-se Maria Antonia. Ele estava fascinado pelo bebê. Ela quis saber quem era a mulher, como haviam se conhecido e se ele estava apaixonado.

Dirceu informou tratar-se de Simone Patrícia Tristão Pereira, na casa dos 30 anos, que era recepcionista, havia sido um relacionamento fugaz. Tempos depois, Evanise – que naquela altura tinha 44 anos – considerou submeter-se a um tratamento de fertilização, mas não teve apoio à ideia.
Resolveram tocar o barco adiante. A diferença era que Dirceu queria conviver com a menina e, segundo Evanise, a mãe só permitia que ele a visse se ela não estivesse por perto. “Saí de Vinhedo várias vezes para deixar eles sozinhos”, contou. Dizem os amigos que a filha é a alegria da vida de Dirceu. Ele é visto nas festinhas da escola e tem brilho nos olhos ao comentar gracinhas da caçula. Estar perto da filha também foi uma das razões do pedido à Justiça para cumprir a pena em Brasília.
 
m 12 de junho, Dia dos Namorados, Evanise preparou um jantar romântico para Dirceu em seu apartamento em São Paulo. A convivência refletia o peso dos oito anos, mas nada parecia fora do normal. Duas semanas depois, ele a chamou para outra conversa. O baque da notícia de que ele queria terminar a relação só não foi pior do que quando – pouco depois – ele partiu para a Bahia com Simone Patrícia e a filha pequena, numa viagem típica de família. Sem chão, Evanise se refugiou na Europa em companhia da filha.

Quando a ruptura veio à tona, os amigos em comum se solidarizaram. O escritor Fernando Morais – que escreve há uma década a biografia de Dirceu, sem data para ser lançada – apostava na reconciliação. O mago Paulo Coelho deu um conselho nada transcendental: “Arrume outro imediatamente.”

No trato da separação, acertaram que ela passaria o Natal em Passa Quatro e ele, o Réveillon, já que acreditavam que a prisão só se daria no início de 2014. Também trataram informalmente de finanças, pois boa parte das contas dela era paga por Dirceu.

Três meses depois, soube-se que Simone Patrícia havia sido contratada com salário de 12 800 reais, horário flexível, para um cargo de confiança no Senado. A luz amarela acendeu. Na mesma época, a jornalista Monica Bergamo, da Folha de S. Paulo, revelou que Evanise cogitava entrar na Justiça para receber metade do patrimônio acumulado por Dirceu durante os anos que passaram juntos. Segundo a nota, ela alegaria “união estável” para o pedido de divisão de bens.

Evanise foi duramente criticada pelo núcleo que rodeia Dirceu – assessores, advogados, consultores de imprensa e de imagem. Aconselharam-na a “sair por cima”, sugeriram que pedir dinheiro era golpe baixo e até mencionaram o caso de Nicéia Pitta – a ex-mulher do prefeito de São Paulo Celso Pitta, com quem protagonizou uma querela pública no divórcio. A principal assessora de Dirceu chegou a lhe telefonar para dizer que ela não deveria pedir nada, já que sua carreira havia sido inflada graças à relação com o ex-ministro.

“Pera lá, eu trabalho, quem me conhece sabe que eu trabalho mesmo! Não sou lotada no Senado e nem vou para a Bahiacom o namorado matando serviço”, disse, referindo-se à viagem feita por Dirceu e Simone Patrícia às vésperas da prisão. Também teve que ouvir piadinhas como a de que, se queria metade do que ele amealhou no período, deveria também puxar cadeia na Papuda – já que entre os bens acumulados estava a pena de dez anos e dez meses de prisão.

No restaurante do Fasano, Evanise enxergava requintes de machismo e oportunismo nas críticas. “Se fosse um homem pedindo uma coisa dessas para uma mulher rica, ninguém acharia nada de mais”, comentou. Em sua avaliação, ela esteve ao lado dele “nos piores momentos” do processo e do julgamento, e havia dedicado um tempo razoável da sua vida para ajudá-lo. Ela negou que chegaria aos tribunais, mas afirmou que se sentia insegura “com a nova configuração das coisas” e quis oficializar a promessa feita na separação. Segundo ela, chegaram a um acordo formal referendado por um advogado: ele quitaria o apartamento que ela financiou em Brasília e lhe compraria um outro em São Paulo.
 
aía a tarde e o celular de Evanise tocou mais uma vez. Era Ângela Saragoça, a segunda ex-mulher de Dirceu, com quem teve a filha Joana. A menção do nome de Ângela no processo do mensalão foi um dos pontos mais delicados para a defesa. Ela havia ganho um emprego, um empréstimo e vendido um apartamento com a ajuda do empresário Marcos Valério. Do outro lado da linha, Ângela – que é psicóloga – se mostrava preocupada com a saúde emocional de Evanise e contou ter dormido graças a ansiolíticos.

Elas se tornaram grandes amigas. Assim como também eram próximas de Marcia Ramos, falecida recentemente, vítima de um câncer, e mãe de Camila, a segunda das três filhas de Dirceu. A primeira mulher, Clara Becker, com quem ele foi casado quando estava na clandestinidade e usava o nome de Carlos Henrique, é mãe do primogênito, Zeca, deputado federal pelo PT. Segundo Evanise, ela ainda o chamava de Carlos, agia como a titular e, quando quis assistir ao final do julgamento, exigiu que Evanise não estivesse na casa – no que foi atendida.

Havia uma dinâmica particular entre as quatro ex-mulheres. Uma é amiga de outra, tem outra que não pode ver uma, tem aquela que não vê nenhuma. Mas todas orbitavam em volta de Dirceu – cada qual à sua maneira –, e se comportavam ainda como protagonistas na vida do ex-ministro. “É uma coisa que ele cultiva. Ele gosta de estar rodeado do que ele chama de ‘as mulheres da minha vida’, e isso inclui as filhas e a neta”, contou Evanise.

Em setembro, o Supremo Tribunal Federal julgava a validade dos embargos infringentes, que podem reduzir a pena de Dirceu. Para assistir à sessão pela televisão, ele reuniu cinquenta pessoas no salão de festas do prédio onde mora em São Paulo – incluindo ex-mulheres, a atual, amigos, parentes, filhos. Evanise não foi convidada. Uma foto publicada nos jornais mostrou Dirceu rindo como se estivesse em um evento. “Eu não teria permitido nunca uma coisa daquelas”, disse Evanise. Do alto de sua experiência como cerimonialista governamental, ela analisou a mancada. “Imagina, assistir à votação dos embargos num salão de festas. Falou ‘festa’ já fudeu tudo. Quer chamar gente, vai para a casa de alguém ou se tranca no apartamento e as pessoas sentam no chão”, comentou.

Ela deu mais um gole no vinho. Quando se mencionou “o harém” de Dirceu, ela deu uma risada e disse que não participaria mais daquele arranjo. Em seguida, elogiou sua antecessora, Maria Rita – a ex de número quatro, com quem ele não teve filhos –, que jamais se imiscuiu com as outras mulheres. “O pior é que tem tipo uma maldição”, Evanise disse em tom divertido. E contou que nenhuma das ex havia voltado a se casar depois da separação. “Isso não vai pegar em mim, não”, falou rindo. Ela atribui a fixação das ex em Dirceu à personalidade fascinante dele. “Ele é muito generoso, muito bom, ajuda todo mundo, quer o bem das pessoas, não importa quem seja. Ele é bem-humorado, é leve. E ele cuida. Cuida de todo mundo. Ele é diferente, sabe?”

Pelo celular, Evanise viu a notícia de que o avião que levava os presos do mensalão para Brasília havia pousado na Base Aérea. Ela comentou que era a primeira vez que Marcos Valério e José Dirceu estariam frente a frente. “Imagina esse avião, o que eles estão falando lá dentro?”, elucubrou. Mais tarde, soube-se que os presos viajaram algemados, cada um sentado ao lado de um policial federal para evitar conversas.

“Ele se preparou para a prisão. Daquele jeito dele, impermeável. Não faz diferença para ele ficar seis meses sem tomar vinho ou ter que comer em marmita ou dormir em cela. Ele aguenta tudo”, comentou. Entre os amigos de Dirceu, diz-se em tom de blague que o maior sacrifício para ele era ter que dividir a cela com o ex-tesoureiro Delúbio Soares. Em todos esses anos, Evanise disse tê-lo visto chorar apenas uma vez: “Quando soube que o Lula estava com câncer”, falou. Ela franziu a testa, ensaiou criticar o ex-presidente, mas se conteve. “Deixa para lá.”
 
noitecia e os clientes do restaurante mudavam de vestimenta. As bermudas e chinelos davam lugar a mulheres de salto e homens de camisa social. No Rio, ela disse, tinha um círculo diferente de amigos: mais novos, com interesses distintos, poucos eram ligados à política. “Vida nova”, ela me propôs um brinde. Sua voz ficou animada. Contou ter conhecido um rapaz na balada carioca e lhe intrigou a hipótese de ele se afastar ao tomar conhecimento da identidade de seu ex. Quando o moço lhe pediu o Facebook, ela disse ter gelado. “Ele ainda não tem ideia de quem eu sou”, disse. “Não sei o que a pessoa pode pensar se souber que eu sou a ex-mulher do Zé. Às vezes, acho que pode achar ruim, não sei. Mas, como me disse um jornalista, é, no mínimo, exótico”, comentou.

Durante um tempo, tanto o Instagram de Simone Patrícia quanto o de Evanise estampavam – para quem quisesse ver – fotos de ambas abraçadas a Dirceu em situações caseiras. Recentemente, Evanise sumiu com os traços do ex de suas redes sociais. Ela apagou as mais de 400 imagens que tinha no Facebook de seu passado com Dirceu, substituindo por fotos dela com a filha e em viagens. Também criou um outro perfil – Eva RP –, que remetia à sua atividade de relações públicas. “É para eu manter contatos de trabalho, com jornalistas, gente do mercado”, explicou.

Dez dias depois de ter sido preso, José Dirceu recebeu a proposta de ser gerente de um hotel em Brasília, onde daria expediente durante o dia e voltaria para a prisão apenas à noite – benefícios de quem está no regime semiaberto. No final de novembro, Evanise recebeu uma mensagem pelo celular replicando um comentário ouvido de que ela era, de fato, uma sortuda: havia se livrado das visitas à cadeia e também de ser mulher de gerente de hotel. Ela respondeu com um “kkkkk” e depois emendou: “Como as pessoas são cruéis.”

12 de dezembro de 2013
Revista Piaui, 87

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