"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

segunda-feira, 5 de março de 2018

FUGIR DO CAOS

Lendo um livro que me emociona, do pensador canadense professor Jordan Peterson: 12 Rules for Life, An Antidote for Chaos. Parece que está por ser publicado no Brasil. Corram e leiam! Não é autoajuda, apesar do título, que talvez nos induza ao erro. É um ensaio muito agradável de se ler, misturando filosofia, mitologia, psicologia, antropologia, política: revoluciona um pouco o conceito de democracia e liberdade, quando beiram a bagunça e o caos.

Naturalmente, não o resumirei aqui, mas comento algumas de suas ideias de que compartilho inteiramente. Uma delas, o conceito ilusório de liberdade como aquela cenoura na frente do jumento para que ele ande. Liberdade como penso que deve ser, que nos faz crescer, conviver, eventualmente progredir, construir e atingir certo grau disso que chamamos "felicidade", num meio-termo entre o caos e a rigidez.

Rigidez, jamais. Nem mesmo a rígida ideia de liberdade como ausência de regras, de disciplina, de concessões, de limitações. O ser humano, como os outros animais, necessita de regras e ordem. Não para se punir ou mutilar, mas para que veja alguma luz, enxergue algum caminho, e se sinta bem progredindo enquanto ser humano.

No começo de minha carreira, traduzi um livro de uma psicóloga americana (esqueci, nesse longo tempo, nome e título) sobre crianças criadas praticamente sem limites. Um menininho tanto atormentou a mãe, que certa vez ela lhe deu uma palmada no traseiro. Para horror de certos educadores ultramodernos, o menino suspirou aliviado, abraçou a mãe e disse algo como "até que enfim você prestou atenção em mim". Sem limites, sem regras, seremos piores do que os animais selvagens, que se guiam pelo instinto.

Nós, que tanto falamos em natureza, andamos bem longe dela, nossos instintos se embotaram, e nem todos servem para conviver no mundo moderno: matar, devorar o outro que nos incomoda, não são atividades que se prezem. No fundo de cada um de nós, sobrevive um predador atávico, que precisa de algumas regras para poder criar sua personalidade, sua vida, seu mundo. Este mundo, em que se possa viver em paz. O caos conduz ao caos, provoca profunda angústia, causa destruição e morte, e eventualmente loucura. E não me refiro a um mítico caos total, mas a um nível preocupante de desordem, violência, agressividade, zero empatia.

Então, como tantas vezes nesses anos todos escrevendo em revista ou jornal, ou falando nas palestras, que hoje raramente aceito, repito aqui, incansável e convicta: tudo começa em casa. A educação, a formação, as bases de uma vida feliz, conforme o sonho ou a possibilidade de cada um.

Viver decentemente, conquistar algumas coisas positivas, sentir-se bem na própria pele exige que se fuja do caos, que pode parecer interessante para alguns visionários ou ideólogos obstinados, mas é feio, burro, e pobre. E se não recebermos desde pequenos algum senso de ordem, regras, conceitos de vida, passaremos o resto da nossa lutando talvez de maneira inglória para não sermos selvagens detestados ou temidos.

Assim que o livro do doutor Peterson sair no Brasil (ou pela Amazon para quem lê no idioma original), procurem por ele: faz bem à alma, abre a cabeça, e de certa forma conforta saber que nós, que apreciamos alguma ordem, não estamos sozinhos.

05 de março de 2018
Lya Luft, Zero Hora RS

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