"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 6 de março de 2018

COMO ENFRENTAR DESPESAS DE SAÚDE DOS MAIS VELHOS

Em 2030, o Brasil terá mais idosos do que crianças, o que coloca o País ao lado de nações desenvolvidas no desafio de equilibrar as finanças dos sistemas de saúde

Para os problemas do presente é necessário pensar em soluções para o futuro. Em 2030, o Brasil terá mais idosos do que crianças (de zero a 14 anos), projetam as estatísticas do IBGE. É um cenário que coloca o País ao lado de países desenvolvidos, como Reino Unido, França e Alemanha, diante de enorme desafio: o de garantir equilíbrio financeiro aos sistemas de saúde.

Em 2030, no Brasil, as despesas do Sistema Único de Saúde (SUS) com assistências ambulatorial e hospitalar podem atingir a magnitude de R$ 115 bilhões ao ano. Hoje, oscilam em torno de R$ 45 bilhões. E são justamente as doenças crônicas, tipicamente diagnosticadas nos idosos, que exercem maior pressão sobre os custos.

Na falta de política pública bem estruturada destinada a lidar com o rápido processo de envelhecimento no Brasil, Alexandre Kalache, gerontólogo e presidente do Centro Internacional da Longevidade no Brasil, não é otimista quando avalia a capacidade do País de pagar essa conta e garantir o atendimento que vier a ser necessário. Mas sugere iniciativas que, uma vez adotadas, podem quebrar esta sina.

A primeira é atualizar currículos dos cursos da área de saúde. “Quem se forma hoje não adquire conhecimento sobre como cuidar desse paciente.” O quadro é especialmente crítico: o SUS conta com apenas um geriatra para 12 mil pacientes, bem aquém do patamar de um para cada mil recomendado pela Organização Mundial da Saúde.

Outro caminho, diz Kalache, é a adoção de políticas públicas de saúde voltadas à atenção primária, com acompanhamento médico contínuo e não só em casos emergenciais. “É preciso recuperar a cultura do cuidado, com unidades de saúde que façam o acompanhamento médico do paciente ao longo da vida”, explica.

Não menos importantes são as ações destinadas a acabar com o isolamento imposto aos idosos, a fim de promover a saúde mental.

Essa não é só tarefa do setor público. Conforme demonstrou pesquisa do Instituto de Estudos do Sistema Suplementar (IESS), em 2030, as despesas dos planos privados de saúde devem ultrapassar os R$ 396,4 bilhões anuais, 250% acima dos níveis de hoje.

O segmento dos pacientes acima dos 60 anos enfrenta ainda os problemas apontados por esta Coluna no dia 2 de fevereiro (A saúde mais cara dos mais velhos): a oferta de planos individuais é baixa, as mensalidades são altas demais e algumas operadoras fazem exigências descabidas por ocasião da contratação do plano.

Para a FenaSaúde, a entidade que defende os interesses das operadoras de planos de saúde, uma forma de encarar o aumento das despesas dos beneficiários mais velhos é tentar reequilibrar o jogo por meio da admissão de associados mais jovens. Explicando melhor: como o sistema de saúde suplementar adota o conceito de mutualismo, os mais jovens ajudam a custear o tratamento dos mais velhos. Mas é solução precária, com prazo curto de validade. Hoje, o sistema já tem apenas dois jovens para cada idoso e essa relação tende a se estreitar.

Solução de longo prazo seria, na opinião da presidente da FenaSaúde, Solange Beatriz Palheiro Mendes, a regulamentação de uma espécie de plano de previdência exclusivamente voltado a custear as mensalidades do plano, quando o associado se aposentar.

A ser chamado de VGBL Saúde, esse modelo já foi aprovado na Câmara dos Deputados e está, desde 2015, sob análise do Senado. As empresas fariam contribuições ao VGBL Saúde em nome do funcionário sem que fossem consideradas parte do salário – portanto, sobre elas não incidiria FGTS e INSS. Caberia ao trabalhador escolher o tipo de cobertura. Também seria criado produto similar a ser oferecido a quem não estiver no regime formal de trabalho.

Independentemente dos benefícios esperados desse projeto, o sistema suplementar vai colhendo resultados positivos a partir de certas mudanças de estratégia. Operadoras de planos de saúde especializadas no público da terceira idade têm visto as margens de lucro crescerem no investimento em redes próprias de hospitais e laboratórios, de maneira a reduzir custos. Além disso, a Agência Nacional de Saúde (ANS) criou modelo de atenção especial aos pacientes acima de 60 anos a ser seguido pelos planos de saúde.

Falta saber como sair do campo vago das ideias e partir à prática, mesmo à custa de erros iniciais. Caso contrário, seguiremos idemistas – como classificou Balzac –, seguiremos a repetir o que já foi dito: idem, idem, idem.


06 de março de 2018
Celso Ming, Estadão

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