A ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal, não incluiu na pauta de abril o julgamento de um processo que poderia abrir precedente para desafogar o STF em casos de foro privilegiado. O relator do processo, ministro Luís Roberto Barroso, sugere que só devem ser julgados pelo Supremo acusados de crimes cometidos durante e em razão do exercício de um cargo que tenha prerrogativa de função no próprio tribunal. Ele liberou o caso para votação em plenário em 17 de fevereiro. Se esse entendimento vier a ser adotado, o número de ações penais que chegam ao STF cairia drasticamente.
Segundo o projeto Supremo em Números, da Fundação Getulio Vargas, o STF teria recebido só 5,71% das ações penais que acolheu nos últimos dez anos se a interpretação de Barroso estivesse em vigor.
AS INSTÂNCIAS – Hoje, ministros de Estado, deputados e senadores têm foro e são julgados no Supremo. Se são processados em outras instâncias, os casos são remetidos ao STF quando assumem cargos que lhes dão tal prerrogativa. Para Barroso, os casos não deveriam mudar de instância. A eleição de deputados e senadores faz com que dispare o número de processos que chegam ao Supremo decorrentes do foro privilegiado.
Em 2015, por exemplo, depois das eleições do Legislativo em 2014, 298 novos casos envolvendo políticos com foro chegaram ao tribunal. Em 2016, foram 148 novos casos.
CONSTATAÇÃO – Segundo o estudo da FGV, somente 5,94% das ações começaram como inquérito no Supremo e terminaram no mesmo tribunal. Quase a metade (48,51%) mudou de instância duas ou três vezes até ser concluída. O Supremo mandou para outra instância 83,89% dos crimes que chegaram até ele.
Além do trabalho e dos recursos empenhados na tramitação desses casos, o tempo também pesa. Dos crimes que o STF julgou, 6,99% prescreveram.
“A comparação não é se o julgamento no Supremo é melhor ou pior que na primeira instância. A comparação é entre o julgamento e um sistema falho de pula-pula, em que praticamente todos os processos mudam de instância várias vezes”, disse Ivar Hartmann, pesquisador do Supremo em Números.
SEM EXPLICAÇÃO – A ministra Cármen Lúcia não respondeu por que deixou de incluir o caso na pauta de abril. Sua assessoria de imprensa informou apenas que “o mês será dedicado a matérias de repercussão geral, aquelas que mais podem aliviar a pauta do Supremo”.
Enquanto o processo que poderia mudar esse entendimento fica na gaveta do STF, a PEC 10/2013 (proposta de emenda à Constituição) ganhou adesões no Senado, o que acelerou a sua tramitação.
Esse texto é menos restritivo. Ele não impediria um processo de subir para o Supremo se o acusado assumir um cargo que lhe dê prerrogativa de função no tribunal. Assim, o STF teria recebido 52,88% das ações penais que recebeu nos últimos dez anos se a PEC estivesse em vigor, de acordo com o Supremo em Números. “Já seria um ótimo passo, mas não é suficiente”, comparou Hartmann.
ENXURRADA – A Operação Lava Jato aumentou a pressão pelo fim do foro privilegiado, diante da enxurrada de casos que devem se avolumar no STF.
A comparação do ritmo do juiz Sérgio Moro, que toca a Lava Jato na primeira instância, em Curitiba, com os temos do Supremo é usada como argumento.
Nesse cenário, congressistas procuram elaborar propostas alternativas para evitar que sejam julgados pela Justiça comum como a criação de uma vara especial.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – É uma contradição. Diz que vai colocar em julgamento questões para desafogar pauta, mas esquece justamente o processo mais importante nesse sentido. Não dá para entender esse critério, e a esperada gestão de Cármen Lúcia não traz a menor inovação. (C.N.)
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – É uma contradição. Diz que vai colocar em julgamento questões para desafogar pauta, mas esquece justamente o processo mais importante nesse sentido. Não dá para entender esse critério, e a esperada gestão de Cármen Lúcia não traz a menor inovação. (C.N.)
30 de março de 2017
Thais Bilenky
Folha
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